No dia 24 de abril de 2019 o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) autorizou o pedido de quebra de sigilo fiscal e bancário do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Outras 85 pessoas e nove empresas também tiveram o sigilo quebrado.
O MP investiga suspeitas de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Acredita-se que os crimes aconteceram durante o mandato de Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), onde foi deputado estadual de 2003 a 2018.
Suspeita-se de um esquema conhecido como “rachadinha”, onde servidores são coagidos a devolver parte dos salários para os deputados, no gabinete de Flávio durante a sua atuação como deputado estadual.
As investigações conduzidas pelo MP-RJ tiveram origem em relatório produzido pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que apontou movimentações atípicas em contas de Fabrício Queiroz ( Entenda o Caso Queiroz ).
O documento indicou que o ex-assessor parlamentar de Flávio recebia, sistematicamente, transferências bancárias e depósitos feitos por oito funcionários que trabalharam no gabinete do então deputado na Alerj. Os valores suspeitos giram em torno de R$ 1,2 milhão.
Entre as movimentações financeiras atípicas registradas pelo Coaf, há também a compensação de um cheque de R$ 24 mil pago à primeira-dama, Michelle Bolsonaro, além de saques fracionados em espécie no mesmo valor dos depósitos suspeitos feitos nas respectivas vésperas.
Dessa forma, o MP investiga com a quebra de sigilo , que vai de 1º de janeiro de 2007 a 17 de outubro de 2018, a possível “rachadinha” no gabinete de Flávio. Desde então, uma série de desdobramentos aconteceram.
Possíveis crimes
Organização criminosa
Na quarta-feira (15), o MP apontou indícios da existência de uma “organização criminosa” no gabinete de Flávio Bolsonaro durante o seu mantado como deputado estadual e descreveu e descreve detalhes de movimentações financeiras suspeitas envolvendo Flávio e assessores parlamentares desde o ano de 2007.
O material, com 87 páginas, foi apresentado à Justiça do Rio para pedir as quebras de sigilo bancário e fiscal de Flávio Bolsonaro e outras 94 pessoas, sob suspeita dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
“Na presente investigação, pelos elementos de provas colhidos já é possível vislumbrar indícios da existência de uma organização criminosa com alto grau de permanência e estabilidade, formada desde o ano de 2007 por dezenas de integrantes do gabinete do ex-deputado estadual Flávio Bolsonaro e outros assessores nomeados pelo parlamentar para outros cargos na Alerj, destinada à prática de crimes de peculato, cuja pena máxima supera quatro anos”, descreve o MP.
Esse esquema criminoso teria como um dos integrantes o ex-assessor Fabrício Queiroz , cuja movimentação financeira atípica havia sido detectada pelo Coaf. Para o MP, “não parece crível” que Queiroz seria o líder da organização criminosa sem conhecimento de seus “superiores hierárquicos durante tantos anos”.
Lavagem de dinheiro
Na quarta-feira (15), o MP relatou que Flávio teria lucrado até 292% em transações imobiliárias suspeitas de lavagem de dinheiro . No total, ele adquiriu 19 imóveis por R$ 9,4 milhões entre 2010 e 2017 e fez operações de venda que lhe renderam lucros de R$ 3 milhões no período.
Segundo levantamento feito pelo MP, a valorização do imóvel foi de 292% no período, em contraste com a valorização imobiliária média da região de Copacabana, que no mesmo período foi de 11%.
Outro caso citado como suspeito de lavagem pelo MP foi a venda de imóveis para uma empresa com sede no Panamá. Entre dezembro de 2008 e setembro de 2010, Flávio Bolsonaro comprou 12 salas comerciais em um condomínio na Barra da Tijuca pelo preço total de R$ 2,6 milhões.
Elas foram revendidas em outubro de 2010 por R$ 3,1 milhões para a empresa MCA Exportação e Participações. “Mais do que o preço da transação, chama atenção o fato de a pessoa jurídica adquirente ter como sócia outra empresa com sede no Panamá (Listel)”, aponta o MP.
Segundo os promotores que assinam a peça, “um dos mais tradicionais métodos de lavagem de dinheiro consiste na remessa de recursos ao exterior através de empresas off-shore, sediadas em paraísos fiscais, onde torna-se mais difícil apurar os reais beneficiários das transações envolvendo essas companhias”.
O que Flávio Bolsonaro diz?
No domingo (12), Flávio Bolsonaro se manifestou sobre as investigações contra ele. Segundo o senador, a ação do MP-RJ é ilegal e deve ser arquivada. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, ainda diz ainda que integrantes do MP estão tentando atacar sua imagem para atacar o governo de seu pai, o presidente Jair Bolsonaro, e que o órgão está "esculachando o Judiciário".
“Vejo que há grande intenção de alguns do Ministério Público de me sacanear”, diz. O senador também acusa o MP de vazar informações sobre a investigação que é alvo para a imprensa e diz que há uma "perseguição implacável" no Rio contra ele.
Em nota divulgada na segunda-feira (13) , Flávio reforça que os ataques contra ele não vão abalar o governo Bolsonaro. “A verdade prevalecerá, pois nada fiz de errado e não conseguirão me usar para atingir o governo de Jair Bolsonaro ”, afirma.
Como resposta, o MP-RJ assegurou em nota oficial que agiu dentro da lei e de forma "isenta e apartidária" na investigação e reclamou que o senador nunca compareceu ao órgão para prestar esclarecimento, apesar de ter recebido convites.
Em relação às acusações de que teria lucrado até 292% em transações imobiliárias suspeitas de lavagem de dinheiro, Flávio se manifestou na quinta-feira (16) no Twitter . De acordo com o parlamentar, ele está 'sendo vítima de seguidos e constantes vazamentos de informações'.
"Os valores informados são absolutamente falsos e não chegam nem perto dos valores reais. Sempre declarei todo meu patrimônio à Receita Federal e tudo é compatível com a minha renda", escreve o filho do presidente. Flávio ainda garantiu que seu passado é limpo e que jamais cometeu 'qualquer irregularidade'. "Tudo será provado em momento oportuno dentro do processo legal".
Jair Bolsonaro cria cortina de fumaça
Na sexta-feira (17), Jair Bolsonaro (PSL) compartilhou em uma rede social um texto de autor desconhecido que diz que o Brasil está "ingovernável" . Segundo analistas políticos, ao fazer isso, o presidente cria uma cortina de fumaça para tirar o foco das denúncias contra Flávio. Além de alimentar as críticas da sociedade ao Congresso e a diferentes instituições.
"Ele (Bolsonaro) está testando elevar uma polarização para ver como a população reage. Vai culpar o Congresso e as instituições por tudo que não consegue fazer", afirma o cientista político da Unicamp Oswaldo Amaral. "Parece um balão de ensaio para ver quantas pessoas vai arregimentar com esse tipo de discurso. Está colocando a figura dele contra as instituições democráticas e quer o apoio do povo para isso, o que é típico do populismo."
Outros fatos importantes
- Caso Queiroz: quebra de sigilo atinge mãe de miliciano ligado a Flávio Bolsonaro
- Ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, se manifesta sobre o caso e afirma confiar em Flávio
- Investigação contra Flávio também atinge nove ex-assessores de Jair Bolsonaro
- Assessor de Flávio Bolsonaro depositou quantia suspeita na conta de sua mãe
- Queiroz tenta suspender quebras de sigilo em caso que envolve Flávio Bolsonaro
- Justiça impõe acesso a notas fiscais de compras de Flávio Bolsonaro e Queiroz
- Além de Flávio Bolsonaro, oito deputados da Alerj tiveram sigilo quebrado
Pontos do caso da quebra de sigilo de Flávio Bolsonaro seguem sem resposta e a expectativa é que nos próximos dias apareçam mais desdobramentos da investigação conduzida pelo MP-RJ.