Operação Lava Jato foi responsável pela prisão do ex-presidente Lula, que antes de ser preso se reuniu com apoiadores
Francisco Proner Ramos
Operação Lava Jato foi responsável pela prisão do ex-presidente Lula, que antes de ser preso se reuniu com apoiadores

Quarta-feira, 24 de janeiro de 2018. Dentro do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP), apoiadores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhavam em um telão o julgamento em segunda instância de um dos processos contra o petista na Operação Lava Jato, o caso do tríplex do Guarujá. Lula também estava no prédio, em uma sala reservada, assistindo sua pena ser  aumentada para 12 anos e um mês  pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre.

De São Bernardo do Campo, o ex-presidente e seus militantes seguiram para a Praça da República, em São Paulo, onde fizeram manifestação. Na ocasião, Lula afirmou que sua condenação na Operação Lava Jato era “política” e expressou mais uma vez seu desejo de ser candidato à Presidência nas eleições de 2018.

Com a decisão unânime na segunda instância, restou à defesa do petista entrar com embargos de declaração contra a sentença. E, com o iminente risco do ex-presidente ser preso, os advogados decidiram também entrar com um  pedido de habeas corpus preventivo no Supremo Tribunal Federal (STF).

O julgamento dos embargos de declaração ocorreu no dia 26 de março e foi negado pela Oitava Turma do TRF-4 . No entanto, Lula ainda não podia ser preso, pois no STF seu pedido ainda estava em análise e uma liminar concedida pelos ministros da Corte garantiu que ele permanecesse em liberdade até que o Supremo decidisse sobre o habeas corpus.

A decisão veio no dia 4 de abril, quando, por 6 a 5, os ministros entenderam que Lula poderia ser preso após o fim dos recursos na segunda instância. Menos de 24 horas depois, o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela condenação de Lula em primeira instância, determinou a  prisão do ex-presidente que deveria se entregar até às 17h do dia 6 de abril – o que não ocorreu.

Ao saber que ia ser preso, o ex-presidente saiu da sede do Instituto Lula, em São Paulo, e seguiu para o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde passou a noite. No dia seguinte, uma multidão se reuniu em volta do sindicato e Lula não dava sinais de que iria se entregar.

Afrontando a decisão de Moro, Lula não se apresentou à Polícia Federal após às 17h e permaneceu no sindicato cercado por apoiadores. A  PF preferiu evitar um confronto com os militantes e negociou com a defesa do ex-presidente a melhor maneira do condenado se entregar.

"Lula preso amanhã"

Prisão de Lula é considerada pera especialista como a
Marcelo Casal Jr / ABr
Prisão de Lula é considerada pera especialista como a "joia da coroa" da Operação Lava Jato

O meme que fez sucesso nas redes sociais “Lula preso amanhã” se tornou realidade. No dia 7 de abril, após rezar uma  missa em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia e fazer um discurso acalorado ao seus apoiadores, o líder petista foi escoltado até a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba para cumprir sua pena.

“A prisão de Lula é a joia da coroa da Lava Jato. Onde sempre se quis chegar”, avalia o advogado criminalista Davi Tangerino, professor da FGV. Para ele, o ex-presidente sempre foi o “alvo principal da operação”. “Você dizer que tem um presidente da República preso coroa o simbolismo de que se alimenta tão fortemente a Lava Jato”, pontua.

Segundo o professor de direito penal da USP Gustavo Badaró a prisão de Lula, “independentemente de qualquer juízo se ele é inocente ou não”, era importante para a “manutenção da história dos fatos contados na Lava Jato”.

“Não seria crível que toda essa organização criminosa durante o governo do PT existisse sem a ciência do Lula. Para que a história fechasse, precisava da prisão dele porque, se não, seria uma organização acéfala”, explica Badaró sobre a simbologia da prisão do petista para a Lava Jato.

Ao fazer uma retrospectiva 2018 , Tangerino ressalta que este “foi um ano de decisões jurídicas estranhas”. O professor da FGV se referiu, entre outros casos, ao  imbróglio sobre a liberdade de Lula no dia 8 de julho. Naquele domingo, o desembargador plantonista do TRF-4 Rogério Favreto decidiu conceder um habeas corpus ao ex-presidente. 

No entanto, o juiz Moro, mesmo de férias, emitiu um despacho se negando a cumprir a decisão. Favreto insistiu que sua decisão deveria ser cumprida imediatamente, mas foi rebatido pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, responsável pela relatoria dos casos da Lava Jato no TRF-4.

O desembargador plantonista, por sua vez, afirmou que não era subordinado a Gebran e manteve sua decisão, até que o presidente do tribunal, Thompson Flores, manifestou-se e manteve Lula preso. As reações de Favreto, Moro e Gebran nesse caso foram alvo de um inquérito , ainda em andamento, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Mesmo preso, Lula seguiu com o plano de ser candidato à Presidência e, de dentro da cadeia, dava as coordenadas da campanha do PT. No entanto, a empreitada não foi bem-sucedida, e mesmo com uma liminar do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas em mãos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou o registro de candidatura do ex-presidente.

Gleisi Hoffmann absolvida no STF

Presidente do PT, a senadora Gleisi Hoffman, foi absolvida em julgamento da Operação Lava Jato no STF
Reprodução/Twitter
Presidente do PT, a senadora Gleisi Hoffman, foi absolvida em julgamento da Operação Lava Jato no STF

Em meio a diversos recursos de Lula e outras pautas polêmicas, o STF jugou neste ano duas das oito ações penais relacionadas à Lava Jato em andamento na Corte. Em uma delas, o deputado Nelson Meurer, do Progressistas, foi condenado a 13 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. O parlamentar ainda pode recorrer da decisão.

Já na outra, a presidente nacional do PT, a senadora Gleisi Hoffmann , foi absolvida . O professor da USP explica que, neste caso, a decisão do Supremo pode impactar outros processos contra políticos investigados na operação. Segundo Badaró, o julgamento de Gleisi mostrou a “incompetência de Curitiba” para julgar o caso que deveria ter sido remetido à Justiça Eleitoral.

Além disso, o especialista em direito penal ressaltou que o julgamento da senadora mostrou a necessidade de a acusação descrever um ato de ofício vinculado à função pública para caracterizar crime de corrupção.

Esse entendimento da Corte deve ser usado pela defesa de diversos parlamentares que afirmam não ter exercido "atuação viciada" antes ou depois do recebimento de recursos do esquema do petrolão.

Retirada de sigilo da delação de Palocci

Antonio Palocci firmou um acordo de delação com a Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato
Antonio Cruz/ABr
Antonio Palocci firmou um acordo de delação com a Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato

Faltavam seis dias para o primeiro turno das eleições quando o juiz Moro decidiu retirar o sigilo de parte do acordo de delação do ex-ministro Antonio Palocci no âmbito da Operação Lava Jato. Entre os trechos da delação de Palocci que se tornaram públicos, o ex-ministro afirma que as campanhas do PT foram abastecidas com dinheiro via caixa dois.

A homologação do acordo de delação firmado com a Polícia Federal ocorreu em junho, pelas mãos do desembargador João Pedro Gebran Neto, do TRF-4. Após a retirada do sigilo dos depoimentos, parlamentares do PT entraram com ação no CNJ contra Moro.

Em sua defesa, Moro garantiu que "não houve qualquer intenção de influenciar" o processo eleitoral e ressaltou que "não pode interromper os seus trabalhos apenas porque há uma eleição em curso". "Não foi, ademais, o Juízo quem inventou o depoimento de Antonio Palocci Filho ou os fatos nele descritos", acrescentou.

“Moro sempre jogou com a opinião pública de uma maneira muito inteligente, muito calculada. A liberação naquele momento da delação do Palocci, no mínimo, se somou a um esforço não escondido da força tarefa de educar o povo em quem votar”, avalia o professor da FGV Davi Tangerino.

Para a presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Federal do Estado de São Paulo (SINDPF-SP), Tania Prado, a retirada do sigilo da delação de Palocci “possibilitou conhecimento de detalhes da atuação da organização criminosa". "Justamente ele, por pertencer ao grupo que estava no poder naquele período, ele sabia de mais detalhes do modus operandi deles."

Já Badaró ressalta que todas as retiradas de sigilo, incluindo a de Palocci,  sem a aceitação da denúncia foram “equivocadas”. “Só deveria ter o conteúdo liberado depois de recebida a denúncia. Se a lei é ruim, que mude a lei, mas por enquanto todas as retiradas de sigilo foram equivocadas”, afirma o professor da USP.

Moro deixa a toga e aceita Ministério

Responsável pelos processos da Operação Lava Jato em Curitiba, juiz Sérgio Moro decidiu deixar a toga para ser ministro
José Cruz/ABr
Responsável pelos processos da Operação Lava Jato em Curitiba, juiz Sérgio Moro decidiu deixar a toga para ser ministro

Um dia após ser eleito presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PSL) afirmou em rede nacional que gostaria de convidar Sérgio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Alguns dias depois, o juiz federal se reuniu com Bolsonaro e decidiu aceitar a proposta .

Como manda a regra da magistratura, para poder assumir o cargo de ministro, Moro teve que pedir exoneramento de seu cargo público de juiz federal concursado. A ideia inicial do magistrado era ficar de férias e só pedir a exoneração no ano que vem, mas essa decisão acabou sendo alvo de críticas.

"Embora a permanência na magistratura fosse relevante ao ora subscritor por permitir que seus dependentes continuassem a usufruir de cobertura previdenciária integral no caso de algum infortúnio, especialmente em contexto no qual há ameaças, não pretendo dar azo a controvérsias artificiais, já que o foco é organizar a transição e as futuras ações do Ministério da Justiça”, escreveu o ex-juiz da Lava Jato na época da exoneração.

Mas se, por um lado, ele se livrou das controvérsias de ainda ser um juiz tendo aceitado o cargo de ministro, por outro a exoneração também foi contestada. Parlamentes do PT entraram com (mais uma) ação no CNJ alegando que o pedido de exoneração não poderia ter sido acatado porque Moro ainda responde a processos administrativos disciplinares no conselho. O argumento está baseado em resolução da CNJ que impede o afastamento voluntário de um juiz processado por razões disciplinares.

Da cadeia, Lula também  comentou a ida de Moro para a Esplanada dos Ministérios. O ex-presidente disse acreditar que, como futuro ministro, Moro irá "aprofundar a perseguição ao PT e aos movimentos sociais".

"Se alguém tinha dúvidas sobre o engajamento político de Sérgio Moro contra mim e contra nosso partido, ele as dissipou ao aceitar ser ministro da Justiça de um governo que ajudou a eleger com sua atuação parcial. Moro não se transformou no político que dizia não ser. Simplesmente saiu do armário em que escondia sua verdadeira natureza", reclamou.

Para Davi Tangerino, a ida de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça deixa em xeque a imagem do juiz imparcial. “Moro foi decisivo para que Lula não fosse candidato nesta eleição. Que ele não fosse o único candidato capaz de derrotar Bolsonaro no pleito. E ele aceitar ser ministro do governo Bolsonaro, ainda que a intenção dele nunca tenha sido essa, passa uma imagem pública muito complicada”, analisa o professor da FGV.

Badaró também concorda que a ida de Moro para o ministério é “muito ruim” para imagem dele e fortalece o discurso do PT de que Moro seria parcial em seus julgamentos. Apesar disso, o professor da USP ressalta que “como ministro da Justiça, ele vai ter muito poder de conduzir e aparelhar os órgãos de controle e fiscalização”.

Já Tania Prado afirmou que a aceitação de Moro para o cargo de ministro “surpreendeu a todos”. “Ele conhece o funcionamento da Polícia Federal e as dificuldades. Então, a tendência é que ele seja alguém que venha a fortalecer as instituições que atuam na repressão ao crime e, sobretudo, ao crime organizado”, disse a presidente do SINDPF-SP.

Operação Lava Jato avança no Rio

Governador do Rio, Luiz Fernando Pezão foi preso no Palácio Laranjeiras em desdobramento da Operação Lava Jato
Agência Brasil/ Marcelo Sayão
Governador do Rio, Luiz Fernando Pezão foi preso no Palácio Laranjeiras em desdobramento da Operação Lava Jato

No Rio de Janeiro, os desdobramentos da Lava Jato têm atingido o alto escalão do Palácio da Guanabara. Das 30 operações realizadas desde 2015, 12 foram deflagradas neste ano e resultaram na prisão de 10 deputados estaduais e do atual governador Luiz Fernando Pezão (MDB) , entre outros investigados.

Já o ex-governador do estado Sérgio Cabral (MDB) continua colecionando condenações, cujas penas já somam 198 anos de prisão. Das nove sentenças contra Cabral na Lava Jato do Rio e de Curitiba, cinco foram proferidas neste ano. Na retrospectiva 2018, as condenações foram:

  • 2 de março: 13 anos e 4 meses de prisão por crimes de lavagem de dinheiro e integrar organização criminosa, no âmbito da ação que apura irregularidades acerca da compra de joias da joalheria H.Stern.
  • 3 de julho : 22 anos e 8 meses de prisão por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Nesta mesma ação, o empresário Eike Batista foi condenado a 30 anos de prisão.
  • 11 de setembro : 47 anos e 4 meses de prisão por crime de corrupção passiva, formação de quadrilha e organização criminosa. Em processo que trata de irregularidades em contratos para obras do Arco Metropolitano, PAC das Favelas e Linha 4 do Metrô, realizadas com recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
  • 12 de setembro : 12 anos e 10 meses de prisão por formação de cartel e fraudes em licitações para a reforma do Maracanã e para as obras do PAC das Favelas.
  • 3 de dezembro : 4 anos e 5 meses de prisão por lavagem de dinheiro em esquema que envolvia empresas, como a FW Engenharia, para dar aparência lícita ao pagamento de R$ 1,7 milhão em propina.

Além das condenações definidas pelo juiz Marcelo Bretas, processos contra Sérgio Cabral também foram julgados neste ano na segunda instância. No TRF-4, Cabral teve uma das suas penas mantidas em 14 anos e dois meses de prisão . Já na 1ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), o ex-governador teve a pena aumentada em 7 meses, chegando a 45 anos e 9 meses de prisão.

Em mais de dois anos da força-tarefa da Lava Jato no Rio, os procuradores já representaram contra 296 pessoas em 46 denúncias apresentadas à Justiça. Desde que a Lava Jato chegou ao estado, foram decretados 190 mandados de prisão preventiva e 39 prisões temporárias, além de 40 conduções coercitivas e 466 mandados de busca e apreensão.

A Justiça homologou 35 acordos de colaboração premiada, que fixaram a devolução de R$ 575 milhões em multas compensatórias. Em dois acordos de leniência firmados com empresas, foram devolvidos aos cofres públicos R$ 134 milhões.

No último dia 12 de dezembro, o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, Eduardo El Hage, disse que, em 2019, as investigações devem avançar ainda mais.

"Muita coisa ainda vai ser deflagrada em 2019. Temos várias linhas de investigação em curso. Acredito que o estado do Rio de Janeiro foi infestado por esse fenômeno da corrupção, mas, pouco a pouco, temos conseguido combater", disse Hage.

Para o procurador, organizações criminosas semelhantes atuam em outros estados. "Pessoalmente, acho que estamos até à frente de outros estados. Tudo o que foi feito e está sendo visto no Rio, não tenho dúvida, acontece em outros estados, mas aqui está sendo revelado e punido", acrescentou.

Leia também: Pezão é o quarto governador eleito do Rio a ser preso; relembre os demais casos

O entendimento de Hage é compartilhado pela presidente do SINDPF-SP. Para Tania Prado, a situação no Rio de Janeiro , de fato, “era uma das piores”, contudo “é possível que outras investigações relacionadas a práticas criminosas em outros estados possam vir a ser desenvolvidas”.

“Há muitos esquemas ainda a serem desvendados em todo o País e é necessário que as equipes que trabalham com isso, os delegados que têm esses inquéritos sobre sua presidência, tenham a tranquilidade necessária e estrutura, condições de trabalho, para executarem outra operações de similar natureza”, afirmou Tania.

Lava Jato em números no Paraná

Força-tarefa da Operação Lava Jato já realizou 57 operações em conjunto com a Polícia Federal e a Receita Federal
Fernando Frazão/Agência Brasil - 28.7.2015
Força-tarefa da Operação Lava Jato já realizou 57 operações em conjunto com a Polícia Federal e a Receita Federal

Em quatro anos da força–tarefa da Lava Jato, o Ministério Público Federal já denunciou 347 pessoas em 82 denúncias apresentadas à Justiça. Já foram decretados 149 mandados de prisão preventiva e 152 prisões temporárias, seis prisões em flagrante, além de 227 conduções coercitivas e 1.166 mandados de busca e apreensão.

Foram realizadas 57 operações em conjunto com a Polícia Federal e a Receita Federal (11 delas em 2018), e os acusados respondem por crimes como corrupção ativa e passiva, lavagem de ativos e organização criminosa. A Justiça homologou 176 acordos de colaboração premiada. Os processos da Operação Lava Jato , até agora, já resultaram em 226 condenações, contra 146 pessoas, contabilizando  2.120 anos, 5 meses e 20 dias de pena.

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