O impasse judiciário sobre soltar ou manter a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva gerou controversas no meio jurídico. No domingo (8), o desembargador de plantão no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) Rogério Favreto decidiu conceder habeas corpus ao petista , mas sua decisão, depois de idas e vindas, foi revogada pelo presidente do tribunal, Thompson Flores.
Especialistas em Direito afirmam que a resolução 71, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), não permite a revisão decisões apreciadas pelo órgão judicial de origem e, portanto, o desembargador plantonista não teria competência para julgar o pedido de soltura de Lula , pois o TRF, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já haviam decidido sobre a questão.
Segundo o ex-presidente do STF Carlos Velloso, o desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator dos processos da Lava Jato, era o juiz competente para julgar o pedido de habeas corpus. "Prevalece a decisão do juiz natural da questão, o desembargador relator, que reassumiu as suas funções", afirmou.
Já para o doutor em Direito e professor da Universidade de Brasília Antonio Escrivão Filho, o desembargador Fravreto , durante o plantão judiciário, é o único apto a proferir qualquer decisão no caso. “É assim que está publicado no Diário Oficial da Justiça Federal”.
“Toda atuação que foge a essa jurisdição do plantão é uma atuação extraordinária, é uma atuação de exceção, como vem sendo infelizmente observado pela sociedade brasileira em tempos de expansão desse protagonismo político da Justiça”, avaliou o professor.
Escrivão Filho explicou que, encerrado o plantão judicial, o plantonista envia o processo para a jurisdição competente. Neste caso, o processo do ex-presidente está sob jurisdição do desembargador Gebran Neto, que é o relator, e a liberdade provisória seguiria para apreciação pela 8ª turma do TRF-4, da qual ele faz parte.
O professor afirmou ainda que o desembargador Gebran , assim como o juiz Sérgio Moro, apareceram no processo sem serem provocados dentro do procedimento normal da Justiça.
“Ele [Gebran] teria esse poder [de suspender a liberdade provisória] quando ele voltasse a trabalhar, porque o processo tem que seguir um rito previsto na lei processual e, quando encerrado o plantão judicial, o processo seria remetido então ao relator ao longo da semana”.
PGR diz acompanhar caso de Lula
Após o impasse jurídico, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, divulgou nota em que disse “acompanhar” atentamente o caso. Ela voltou a defender a execução da pena de um sentenciado logo após a confirmação da condenação em segunda instância pela Justiça.
“A PGR reitera a posição da instituição, que defende a execução da pena após a confirmação da condenação em segunda instância, o que garante o duplo grau de jurisdição e afasta a presunção de inocência, dando segurança jurídica às decisões judiciais”, diz o texto.
Prende – solta - prende
Lula foi preso em 7 de abril após ter sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro confirmada na segunda instância no caso do tríplex no Guarujá (SP). Desde então ele é mantido na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), segunda instância da Justiça Federal, que impôs a pena de 12 anos e um mês de prisão ao ex-presidente, determinou a prisão seguindo entendimento atual do Supremo Tribunal Federal (STF), que permite a execução de pena mesmo que ainda haja possibilidade de recurso a instâncias superiores.
Na manhã do domingo (8), Rogério Favreto decidiu conceder liberdade ao ex-presidente . O despacho inicial assinado pelo desembargador durante o plantão no tribunal de Porto Alegre determinava que o ex-presidente deveria ser solto ainda no domingo, "em regime de urgência", e chegou a dispensar a realização do exame de corpo de delito.
A decisão de Favreto se deu em cima de recurso protocolado pelos deputados Wadih Damous, Paulo Pimenta e Paulo Teixeira, todos do PT . No recurso, os parlamentares contestaram decisões do juiz Sérgio Moro relacionadas ao local do cumprimento da pena e ao veto de comunicação de Lula com a imprensa. Os autores do recurso também alegam que "inexiste fundamentação para a manutenção da prisão" do ex-presidente.
Moro disse que desembagador era "incompetente"
Assim que soube da decisão de Favreto, o juiz federal Sergio Moro afirmou que o desembargador federal plantonista é "absolutamente incompetente" para soltar o ex-presidente.
"O Desembargador Federal plantonista, com todo respeito, é autoridade absolutamente incompetente para sobrepor-se à decisão do Colegiado da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e ainda do Plenário do Supremo Tribunal Federal", disse Moro sobre a decisão.
Moro solicitou que seu despacho fosse encaminhado ao desembargador federal João Pedro Gebran Neto para receber "orientação de como proceder". Mesmo de férias, o juiz federal Sergio Moro disse que por ser citado como autoridade coatora no habeas corpus, ele entendeu que era necessário despachar no processo.
Desembargador rebateu Moro com novo despacho
Diante do despacho de Moro, o desembargador soltou novo despacho, reiterando sua ordem, que deveria ser cumprida ainda hoje por "qualquer autoridade policial presente na sede da carceragem da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba".
"O cumprimento do alvará de soltura não requer maiores dificuldades e deve ser efetivado por qualquer agente federal que estiver na atividade plantonista, não havendo necessidade da presença de delegado local. Pelo exposto, determino o imediato cumprimento da medida judicial de soltura do paciente, sob pena de responsabilização por descumprimento de ordem judicial, nos termos da legislação incidente", escreveu Favreto.
Gebran Neto reverte decisão de Favreto
Antes que a decisão de Favreto fosse executado, o desembargador Gebran Neto determinou que o ex-presidente continuasse preso . No despacho, ele pediu para que não seja cumprida a decisão do plantonista.
"Para evitar maior tumulto para a tramitação deste habeas corpus, até porque a decisão proferida em caráter de plantão poderia ser revista por mim, juiz natural para este processo, em qualquer momento, DETERMINO que a autoridade coatora e a Polícia Federal do Paraná se abstenham de praticar qualquer ato que modifique a decisão colegiada da 8ª Turma", escreveu Gebran Neto.
Plantonista contraria Gebran Neto
Em mais um despacho, o desembargador Rogério Favreto reiterou sua decisão de soltar o ex-presidente . O desembargador alegou que é o responsável pelo tribunal durante o plantão do fim de semana. Ele disse, ainda, que não é subordinado ao relator do caso do ex-presidente no TRF-4, o desembargador Gebran Neto, que cancelou a soltura.
Favreto acrescentou, ainda, que não desrespeitou decisões do colegiado do TRF-4 ou do STF. Ele diz que um fato novo, a pré-candidatura de Lula e sua ausência em entrevistas e debates, justifica a decisão de soltá-lo, sob o risco de prejudicar as eleições democráticas.
Presidente do TRF-4 “bate martelo” e Lula continua preso
Em meio ao imbróglio sobre soltar o petista, o presidente do TRF-4, o juiz Thompson Flores, determinou que, como não há regra clara sobre as atribuições do juiz plantonista do TRF, cabe ao relator do caso, o desembargador Gebran Neto, conduzir o recurso apresentado pela defesa do líder petista.
Lula , assim, segue preso, como já havia determinado Gebran Neto anteriormente. A defesa do ex-presidente ainda pode recorrer da decisão nas instâncias superiores, o que pode ocorrer nos próximos dias.
* Com informações da Agência Brasil