Monark, do Flow Podcast
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Monark, do Flow Podcast


Enquanto são crescentes os discursos de ódio no Brasil, o tema de repercussão geral 837 segue parado no Supremo Tribunal Federal (STF). No âmbito da  matéria em questão, a Corte deve definir os limites da liberdade de expressão quando contraposta a outros direitos com igual hierarquia jurídica.


Só nesta semana, dois casos acenderam esse debate. O primeiro foi do podcaster Bruno Aiub, mais conhecido como Monark. À frente do podcast Flow, ele defendeu a criação de partidos nazistas , com reconhecimento legal, na última segunda-feira (7). 


Imediatamente foi rebatido pela deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), que participava do programa. No dia seguinte, o trecho tomou as redes sociais e teve grande repercussão negativa, com notas de repúdio de entidades judaicas, perda de patrocinadores,  aberturas de investigações e o  desligamento de Monark dos Estúdios Flow.


O segundo episódio já foi um desdobramento do primeiro. O ex-BBB e comentarista da Jovem Pan, Adrilles Jorge, supostamente fez o "Sieg Heil" , uma saudação nazista, no encerramento de um debate que tratava justamente das declarãções de Monark. Adrilles defendia o podcaster, que ele julga ter se expressado mal e, após o gesto, foi demitido.


O ex-bbb disse depois que tudo não se passou de "um tchau irônico, galhofeiro". Já Monark declarou que  estava "muito bêbado" e defendeu uma ideia de "um jeito muito burro" e insensível com a comunidade judaica. Em ambos os casos, o debate girava em torno da liberdade de expressão, o que, para o advogado criminalista Jonata Wiliam, reforça a urgência da discussão no STF, especialmente em ano eleitoral.

Homem negro, de terno e camisa social por baixo, sorri para a foto.
Thiago Vieira/ Acervo Pessoal

Jonata Wiliam, advogado criminalista, presidente da Comissão da Advocacia Negra (OAB-BA) e mestrando em Direito Público



"Em 2011, o STF deu o caráter de 'repercussão geral' à discussão sobre a liberdade de expressão (...), mas até hoje este caso não foi incluído na pauta para julgamento. É importante e necessário que o sistema de justiça também se ocupe desse problema", defende Wiliam, também presidente da Comissão da Advocacia Negra da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Bahia (OAB-BA).


O iG procurou a assessoria de comunicação do Supremo para saber se há uma previsão de quando o tema será posto em votação e a Corte respondeu que não há prazo. O caso é relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso.

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Criminalização de discursos de ódio

Diante do episódio no Flow Podcast, o iG ouviu quatro advogados criminalistas que  confirmaram a possibilidade do apresentador ser enquadrado criminalmente por infringir o artigo 20 da Lei do Crime Racial. O trecho em questão diz que é proibido "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional", sob pena de reclusão de um a três anos e multa.


No entanto, o procurador Regional da República e professor de Processo Penal da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Vladimir Aras, ponderou que isso seria um "debate jurídico interessante", já que a própria formação de um partido nazista sob o argumento da liberdade de expressão se trata de uma "fraude ideológica".


"Sustentar a possibilidade de um partido nazista pode até não ser crime no Brasil, mas a existência desse partido seria inconstitucional porque o artigo 17 da Constituição não permite que partidos políticos sustentem ideias que violem os direitos humanos. Você pode criar livremente um partido político desde que a ideologia desse partido político não comprometa os direitos da pessoa humana. Então, só por isso um partido nazista seria incabível. Segundo, a Constituição brasileira repudia o racismo. E o nazismo, entre outras manifestações anticlericais, antirreligião, anti-étnicas, é uma manifestação racista", explicou o professor na ocasião.


Também mestrando em Direito Público na Ufba, o advogado criminalista Jonata Wiliam acredita que o Brasil não possui hoje uma legislação que dê conta do crescimento do negacionismo histórico, além de classificar as políticas públicas de preservação da memória como insuficientes. Por isso, ele entende como prioridade o estabelecimento de uma regulamentação que previna os crimes de ódio e a apologia à violação dos direitos humanos.


"O Direito Penal não vai resolver os graves problemas que o Brasil enfrenta em relação ao negacionismo e ao discurso de ódio sozinho, mas estamos vivenciando o problema que é a ausência de regulamentação. A título de exemplo, um alemão condenado por negação ao Holocausto em seu país, se encontra desde novembro de 2021 abrigado no Brasil, e continua propagando o seu discurso criminoso, com a certeza da impunidade", cita Wiliam, em referência ao influenciador de extrema-direita, Nikolai Nerling .


Segundo o pesquisador, um registro do aumento dos crimes de ódio no Brasil foi feito pela ONG Word Heals the World, que atualiza um “Mapa do Ódio”. Esse levantamento indicou um crescimento de 1,95% nas ocorrências de 2018 a 2019, quando 12.334 crimes do tipo foram notificados. 


Outro dado que ilustra o cenário nacional foi apresentado pela antropóloga Adriana Dias, pesquisadora da movimentação de grupos neonazistas no Brasil há 20 anos. Ela elaborou um mapa em que mostra que esses núcleos cresceram 258% de dezembro de 2019 a 2021. Em entrevista ao Nexo, em janeiro, Adriana apontou a falta de punição como um dos elementos que propicia tal avanço.

É em meio a esse cenário que Jonata Wiliam propõe a criação de um projeto de criminalização do negacionismo histórico em seu mestrado. "A motivação da pesquisa se deu após o impeachment de 2016, quando um deputado votou a favor do impedimento com uma saudação a Carlos Alberto Brilhante Ustra", conta. 


O então deputado é o hoje presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). Ele saudou o torturador como o "pavor de Dilma" ao votar pelo afastamento da petista. Com isso, Jonata Wiliam credita às autoridades políticas, entre outros fatores, o crescimento de espaços onde a desinformação e os discursos de ódio são preponderantes.

** Ailma Teixeira é repórter nas editorias Último Segundo e Saúde, com foco na cobertura de política e cidades. Trabalha de Salvador, na Bahia, cidade onde nasceu e se formou em Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), em 2016. Em outras redações, já foi repórter de cultura e entretenimento. Atualmente, também participa do “Podmiga”, podcast sobre reality show, e pesquisa sobre podcasts jornalísticos no PósCom/Ufba.

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