A pouco mais de um ano das convenções que definirão o candidato democrata à Presidência dos EUA, 25 nomes (até o fechamento desta edição) querem desafiar o presidente Donald Trump em novembro de 2020. Pela frente, terão dezenas de primárias, debates e eventos para arrecadar fundos. Poucos devem resistir até os meses que antecedem a Convenção Democrata.
Leia também: Acidente bizarro: homem morre após ter pescoço quebrado por onda nos EUA
Do lado republicano, a conta é um pouco mais simples. Apesar dos comentários racistas e xenofóbicos dos últimos dias, direcionados a quatro deputadas democratas — incluindo a sugestão para mandá-las “de volta a seus países de origem” (as quatro são cidadãs americanas) — os números de Trump entre os republicanos seguem elevados. Desde que assumiu, a taxa de aprovação nunca baixou dos 80%.
Somado a isso, ele conta com uma gigantesca base de campanha e com a máquina do Comitê Nacional Republicano , arrecadando US$ 105 milhões apenas no segundo trimestre de 2019.
Os números não parecem intimidar o ex-governador do estado de Massachusetts William F. Weld, ou Bill, como ele gosta de ser chamado. Até agora, foi o único a desafiar o atual presidente.
Com menos recursos (arrecadou US$ 700 mil no segundo trimestre) e considerado um “Dom Quixote” pela revista Politico, Bill Weld põe suas fichas na retórica anti-Trump , trazida desde 2016, quando foi vice na chapa do Partido Libertário. Na época, comparou a política migratória do então candidato Trump à da Alemanha nazista.
"Ele representa uma parcela do Partido Republicano que acredita que Trump desviou o partido de sua missão e seus valores históricos, ele quis ser uma voz aos republicanos que pensam assim. Ele também quer ser uma plataforma aos republicanos que não gostam de Trump, dar a eles uma voz no processo. Ele provavelmente está pensando na forma da política americana depois de Trump", afirma Bruce J. Schulman, professor de História na Universidade de Boston
Na semana passada, em meio aos comentários xenofóbicos de Trump, Weld foi ao Twitter atacar o colega de partido, conclamando os demais republicanos a rejeitarem o atual presidente.
“Eu desafio todo republicano a assistir ao comício de Donald Trump na noite passada, com os gritos de ‘mande ela de volta’, e se perguntar se esse é o partido de Lincoln e Reagan ao qual nos filiamos”, publicou na quinta-feira.
Em artigo publicado no site The Bulwark, em abril, afirmou que “se Donald Trump for um patriota, ele deve renunciar imediatamente”.
Leia também: Incêndio doloso gera caos no transporte por trens na Itália nesta segunda-feira
Diferenças republicanas
Weld fala abertamente na palavra “impeachment”, alegando conhecimento de causa: no passado, acompanhou de perto um processo do tipo.
Nos anos 1970, trabalhou como assessor da comissão da Câmara dos Deputados responsável pela investigação do escândalo do Watergate , que culminaria com a renúncia de Richard Nixon. Uma de suas colegas foi a ex-senadora e ex-candidata à Presidência, Hillary Clinton.
Depois do processo, atuou no Departamento de Justiça de Massachusetts. Nos anos 1990, veio o auge de sua carreira, quando se elegeu governador de seu estado natal ao vencer uma eleição praticamente perdida contra o então reitor da Universidade de Boston, John Silber.
O discurso de responsabilidade fiscal e geração de empregos convenceu, e ele foi reeleito. Em 1997, com mais um ano de governo pela frente, embarcou em uma campanha pela Embaixada dos EUA no México. Ao final, acabou sem mandato e sem cargo.
Você viu?
Em busca de novos ares, Weld se mudou para Nova York, onde trabalhou no mercado financeiro, sem esconder a vontade de governar o estado. Ele até tentou concorrer, mas ficou nas primárias.
Em 2016, o salto foi maior: no Partido Libertário , concorreu como vice na chapa de Gary Johnson. Os 4,4 milhões de votos foram a melhor votação da história do partido.
Ao revelar suas ideias e visões, Bill Weld pode até surpreender quem espera posições conservadoras, mais alinhadas à atual linha do Partido Republicano .
O ex-governador defende a expansão do Medicaid, um programa governamental para fornecer assistência médica à população de menor poder aquisitivo, em um país onde não existe serviço público de saúde. Ao contrário de Trump, vê a imigração como algo positivo, e quer expandir a emissão de vistos.
O candidato ainda é a favor da liberação do aborto em todos os casos, defende a legalização da maconha e quer leis de inclusão para a população LGBT+. Além disso, promete recolocar os EUA no Acordo de Paris para o clima.
Quando questionado sobre a ampla base de apoio do atual presidente, desconversa, dizendo que o seu alvo não são os republicanos, mas sim os independentes. E ele poderá testar essa tese na primária de New Hampshire . Ao contrário de outras primárias, o estado adota um sistema que dá a eleitores sem filiação partidária a chance de votar, com os registros abertos até a véspera da votação, marcada para o dia 11 de fevereiro. Weld acredita que suas propostas soarão bem entre os independentes.
Uma votação considerável pode dar força para as disputas seguintes. Mas uma derrota por ampla margem deve significar o fim da campanha. Essas primeiras votações são os melhores termômetros para a corrida à Casa Branca, com sua importância resumida em uma frase do presidente John Kennedy , na década de 1960: “Se não te amam em março, abril e maio (primeiras votações), não te amarão em novembro (eleição geral)”.
Concorrendo para perder?
Mesmo que fique pelo caminho, Weld pode influenciar a campanha republicana — o que não seria uma novidade.
"Uma das coisas que Weld quer é fazer com que Trump perca a eleiçãopor causa dessa disputa nas primárias, eu imagino que seja uma parte de sua agenda", diz o professor Schulman. "Um dos exemplos mais importantes foi em 1968, quando o senador Eugene McCarthy desafiou o então presidente Lyndon Johnson. Seus números convenceram Johnson a abandonar a corrida. Em 1980, Ted Kennedy, irmão do presidente John Kennedy, concorreu contra Jimmy Carter. Ele não venceu, Carter acabou indicado, mas aquela disputa prejudicou a campanha".
Analistas, porém, acreditam que mesmo um desempenho acima do esperado em New Hampshire pode não ser suficiente para Weld aparecer no retrovisor de Trump ou causar algum estrago.
"Weld não é muito conhecido, e Trump tem apoio pleno dos republicanos. Um desafio não deve ganhar força a menos que as circunstâncias mudem: por exemplo, uma investigação mais intensa de impeachment ou uma piora na economia. Também duvido que ele conquiste o financiamento e reconhecimento necessários para uma campanha em um outro partido, se for o caso", afirma Allan Lichtman, professor da American University, que acertou os vencedores em sete das últimas oito eleições.
Até agora, Weld não conseguiu superar a barreira de US$ 1 milhão em doações, além de não ter recebido apoios formais. O professor Bruce Schulman também não vê Weld com muitas chances de sucesso. Mas lembra que as circunstâncias podem mudar.
"Se a economia, que agora está brilhando, sofrer um revés e o país se encontrar diante de uma crise econômica, então tudo estará na mesa, Weld e outros poderão ter uma chance. Mas se olharmos agora, ele é de Massachusetts, tem boas conexões em New Hampshire, ele pode superar expectativas por lá, ele nem precisa vencer por lá: se tiver 15%, 20% dos votos, seria um sinal de fraqueza para Trump", diz Schulman.
Leia também: EUA acusam Venezuela de ameaçar avião militar americano em águas internacionais
Nos últimos dias, surgiram rumores sobre um possível novo pré-candidato republicano: Mark Sanford , deputado pela Carolina do Sul. Assim como Weld, Sanford é um crítico de Donald Trump .