Prestes a apresentar o relatório final dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos golpistas de 8 de janeiro , Eliziane Gama (PSD-MA), senadora e relatora da CPMI, afirma ao iG que o Supremo Tribunal Federal (STF) atrapalhou os trabalhos do colegiado quando desobrigaram convocados a prestar depoimento. A parlamentar também comenta sobre o impacto da delação premiada do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid , no texto final.
Durante os trabalhos da comissão, o Supremo Tribunal Federal autorizou que alguns convocados se ausentassem da oitiva na CPMI. Foi o caso da ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça Marília Alencar e do segundo-tenente do Exército Osmar Crivelatti, assessor de Bolsonaro.
A Suprema Corte também autorizou que alguns depoentes se mantivessem em silêncio, mas que comparecessem à CPMI, como o caso do tenente-coronel Mauro Cid e o ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) Augusto Heleno .
Questionada sobre as decisões do STF em relação aos trabalhos da comissão, Eliziane Gama afirma que não se surpreende com o que é direito constitucional.
"Quando a Corte maior deste país reafirma aquilo que é direito constitucional é concede ao depoente a opção de se calar para não produzir prova contra si próprio, a meu ver, não há surpresa alguma. Garantias são garantias. O que atrapalha é a decisão de desobrigar alguém de prestar depoimento, que é uma fase da CPMI que serve muito mais ao paciente do que à comissão, já que ali é momento de esclarecer fatos nebulosos a todo o país", diz a relatora da comissão.
Ainda, sobre alguns inquéritos do STF não compartilhados com a comissão por estarem em fase de diligência, como os relacionados diretamente ao 8 de janeiro e um anterior, de 2019, que apura a divulgação de fake news no país, a relatora afirma ao iG que a decisão "não incomoda" a CPMI. "Faz parte do processo e respeitamos tal postura", completa a senadora.
Delação de Mauro Cid
No início de setembro, o ex-ajudante de ordens de Mauro Cid, que estava preso desde maio, foi solto após realizar um acordo de delação premiada com o Supremo Tribunal Federal .
O acordo prevê a colaboração com as investigações sobre a falsificação de cartões de vacinação e venda de joias recebidas por Bolsonaro. Em troca, o delator terá benefícios, como um abatimento ou redução de pena caso seja condenado.
Segundo a legislação, a delação pode ser rescindida em caso de omissão dolosa sobre os fatos objeto da colaboração e nos casos em que o colaborador retomar a conduta ilícita relacionada ao objeto da colaboração. Ou seja, se Cid não contar tudo o que sabe a respeito dos fatos pelos quais está sendo investigado, pode perder os benefícios.
Após o acordo da colaboração premiada, havia a expectativa de Mauro Cid prestar novo depoimento à CPMI . "Vai ser ouvido nos próximos dias. Cabe a mim marcar seu depoimento", afirmou o presidente da comissão, o deputado Arthur Maia (União Brasil - BA) no dia 12 de setembro. A reconvocação foi, posteriormente, descartada.
No mês de julho, durante a primeira convocação, Cid se recusou a responder às perguntas da CPMI, alegando seu direito ao silêncio. O tenente-coronel se absteve de responder até mesmo a perguntas simples, como a idade, levando a comissão a entrar com uma representação na Justiça Federal do Distrito Federal acusando o ex-ajudante de ordens de abusar do direito ao silêncio.
Segundo Eliziane Gama, seria preciso ter acesso à íntegra da delação premiada de Mauro Cid para colocá-la no relatório final, no entanto, a relatora afirma que a comissão possui informações sigilosas sobre o papel do tenente-coronel em relação às investigações do 8 de janeiro.
"Há informações bem detalhadas em poder da CPMI sobre o papel de Mauro Cid nos episódios investigados pela comissão, bem como dados da ajudância de ordens da qual ele fazia parte. São informações ricas para o nosso parecer", relata a senadora.
Relatório Final
A CPMI do 8 de janeiro apresenta o relatório final no dia 17 de outubro às 9h. Se houver pedido de vista, a leitura do documento será retomada na quarta-feira (18) e ocorrerá a votação para aprovação do texto. A comissão foi instalada no dia 25 de maio, aprovou mais de 180 requerimentos e realizou 20 oitivas.
Segundo Gama, o documento será “bem consolidado” e apresentado com a expectativa de que as investigações “não se encerrem na CPMI”.
“Chegamos na reta final com um balanço positivo. As informações em poder da CPMI, compostas de dados sigilosos ou não, compartilhamento de relatórios e as oitivas realizadas já nos trazem subsídios robustos e suficientes para a construção de um relatório final bem consolidado”, declara a relatora ao iG .