O ano de 2021, assim como todo o governo Jair Bolsonaro, é marcado por embates entre o mandatário e o Supremo Tribunal Federal (STF). Em setembro deste ano, essa crise institucional chegou ao ápice em meio aos protestos pró-governo no feriado da Independência do Brasil.
No último 7 de Setembro, Bolsonaro participou de duas manifestações, uma em Brasília e outra em São Paulo. Nos dois momentos, fez ataques diretos aos ministros Alexandre de Moraes, relator de inquéritos-chave contra o presidente, seus familiares e aliados, e Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, portanto, defensor do atual sistema eleitoral via urna eletrônica.
Mas nessa ocasião, sobrou também para o presidente da Corte, Luiz Fux. "Ou o chefe desse poder enquadra o seu [ministro] ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos", ameaçou Bolsonaro ao falar sobre as decisões de Moraes contra bolsonaristas. "Não podemos continuar aceitando que uma pessoa específica da região dos Três Poderes continue barbarizando a nossa população. Não podemos aceitar mais prisões políticas no nosso Brasil", acrescentou em outro momento do discurso feito na capital federal.
Mais tarde, na Av. Paulista, ele subiu ainda mais o tom ao dizer que não obedeceria às decisões de Moraes. "Dizer a vocês, que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou", declarou, ao falar para apoiadores. " Ou esse ministro se enquadra ou ele pede para sair
. Não se pode admitir que uma pessoa apenas, um homem apenas turve a nossa liberdade", afirmou, chamando o magistrado de "canalha".
Ao longo de seu discurso, Bolsonaro frisou que jamais seria preso e que existiam apenas duas opções para ele em 2018: ser reeleito ou morrer. Nesse ponto, ele mirou os ataques a Barroso ao repetir que o processo eleitoral não é seguro nem confiável. "Não posso participar de uma farsa como essa patrocinada ainda pelo presidente do TSE", frisou.
Após essa série de ataques, o presidente da Corte, Luiz Fux, abriu a sessão do dia seguinte com a leitura de um texto em que diz que "ninguém fechará" o STF, como suscitado por Bolsonaro e seus apoiadores. “Este Supremo Tribunal Federal jamais aceitará ameaças à sua independência nem intimidações ao exercício regular de suas funções. Ninguém fechará esta Corte. Nós a manteremos de pé, com suor e perseverança”, declarou o ministro.
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Fux ressaltou que ofender a honra dos ministros e "incitar a população a propagar discursos de ódio" contra o STF são práticas antidemocráticas e ilícitas. Ele as classificou como "crime de responsabilidade"
.
Com a crise instalada, Bolsonaro precisou recuar
e buscou o ex-presidente Michel Temer (MDB), responsável por indicar Alexandre de Moraes para o cargo de ministro, para intermediar a situação. Graças ao emedebista, o chefe do Executivo conversou por telefone com o ministro, o que serviu para atenuar o problema.
Na sequência, como demonstração de mudança, Bolsonaro publicou o texto intitulado "Declaração á Nação"
, redigido por Temer. Na nota, o presidente diz que nunca teve "nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes". "(...) quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum", contemporizou.
Fim da trégua
A carta deu início a um período de cerca de três meses de trégua, sem ataques diretos aos ministros até que, no último dia 8, o presidente voltou a mirar Alexandre de Moraes . Dessa vez, ele criticou a atuação do ministro depois que Moraes determinou a prisão do caminhoneiro bolsonarista Zé Trovão.
"Isso é uma violência praticada por um ministro do Supremo que agora abriu mais um inquérito
em função de uma live que eu fiz há poucos meses. É um abuso", classificou. A investigação a que ele se refere visa apurar sua conduta no episódio em que disseminou uma informação falsa associando a Aids à vacinação contra a Covid-19. O caso gerou até a suspensão do vídeo no Youtube e Bolsonaro ficou proibido de postar novos conteúdos na plataforma por uma semana.
Com esse e outros ataques recentes, não há perspectiva de trégua no relacionamento entre o Judiciário e o Executivo. Bolsonaro, inclusive, está entre os alvos diretos do inquérito que apura as fake news sobre as urnas eletrônicas, entre outras investigações.