Elendo do CQC em 2009
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Elendo do CQC em 2009





Danilo Gentili, Felipe Andreoli, Rafael Cortez, Marcelo Tas, Marco Luque, Oscar Filho e Rafinha Bastos

A internet passou o fim de semana em combustão espontânea depois que Flávio Bolsonaro afirmou na sexta-feira, 5 de dezembro, que  foi escolhido pelo pai para disputar a presidência.

A partir daí, tudo aconteceu no modo 2x de velocidade: apoio do Nikolas Ferreira, bênçãos familiares, Michelle Bolsonaro dizendo “é ele”mesmo  depois do climão sobre Ciro Gomes, pesquisa mostrando  Lula com o dobro das intenções de voto e até a possibilidade de  Flávio desistir da candidatura antes mesmo de começar. E eu  fiz umas piadas sobre isso.

A acusação que não morre

No Instagram vieram repetir a acusação que eu já ouvi de alguns analistas (e também alguns militantes com saudade de um culpado fixo) desde 2018: o programa teria sido responsável por dar a Bolsonaro a projeção que o levou à presidência.

Como ex-apresentador e repórter do programa, eu sempre achei essa tese tão criativamente rasa, no nível “meu filho Flávio nunca errou”.

A grande maioria das vezes em que ele apareceu no programa foi como alvo de críticas, chacotas e ironias, exatamente como acontecia com todos os políticos.

Se esse tipo de exposição fosse capaz de transformar alguém em presidente, a Palmirinha teria virado Ministra da Agricultura e a Maisa seria Ministra da Comunicação. Demos tanto ou mais tempo de tela pra elas.

O mito do CQC como fábrica do “Mito”

A verdade é mais simples e mais incômoda: Bolsonaro e o bolsonarismo foram uma construção dos próprios eleitores. O vácuo deixado pelo PT após anos de desgaste abriu espaço para alguém ocupar aquela raiva difusa. E Jair Bolsonaro surfou esse momento como ninguém. Não achem que havia um laboratório secreto nos porões do CQC fabricando candidatos.

Ex-CQCs respondem sem filtro

Recentemente, surgiram rumores de que o programa pode voltar à Band em 2026, justamente em ano eleitoral. Algumas semanas atrás, aproveitei a deixa para  conversar com ex-integrantes sobre o assunto.

E desta vez, fui além: fiz uma pergunta direta sobre a acusação mais repetida nos últimos anos e, pela primeira vez, ex-membros do CQC respondem juntos:

•⁠ ⁠O CQC é responsável pela ascensão do Bolsonaro e do bolsonarismo no país?

A seguir, as respostas de quem estava lá. Sem edição, sem cortes, sem filtro e sem “assessoria repliquei sem ler”:

Marco Aurélio - Roteirista

“O CQC dava espaço a políticos que rendiam piada. Eduardo Suplicy, Paulo Maluf e, sim, Jair Bolsonaro. Nunca, em nenhum momento, enaltecemos nenhum deles. O programa nunca foi campeão de audiência, e já estava morto por 3 anos quando Bolsonaro foi eleito. Quem elegeu o Bolsonaro foram os milhões de brasileiros que simpatizam com o populismo de extrema-direita, que sempre existiram e ainda vão eleger coisa muito pior. Eu acho que dão importância excessiva a um programa de humor, feito majoritariamente por gente de esquerda, que usava a política para fazer piada. Papo chato da porra.”

Alex Baldin - Roteirista

“O CQC é responsável pela ascensão do Bolsonaro tanto quanto o circo é responsável pela eleição do Tiririca. Se as pessoas que vão no circo escolhem votar no palhaço, é uma opção delas, mas foi sempre assim que o Bolsonaro foi retratado no programa: um bufão que nunca deveria ser levado a sério. E no fim da sequência dos fatos o CQC acabou levando o Bolsonaro à prisão. Isso ninguém vai reconhecer, né?”

Danilo Gentili

“O CQC puxava saco do Lula pra caramba, deu óculos do CQC pro Lula, coisa que só se dá pra “pessoas legais que queremos ser amigos”. Seria o CQC responsável pela corrupção do PT e na Petrobrás? Por uma enorme coincidência, e mando o print pra você ver que é real, O Alex Baldin, amigo meu aqui, roteirista chefe do CQC, acabou de me falar algo sobre isso que eu ri:

'Só queria dizer que no fim da sequência dos fatos o CQC acabou levando o Bolsonaro à prisão. ISSO OS CARA NÃO VAI RECONHECER.'”

Marcelo Tas

“Eu concordo com Alex Baldin, o primeiro roteirista do programa, que deu uma resposta científica a esta pergunta. Se somos os responsáveis pelo surgimento do pangaré fascista, pela lógica, ao final dos fatos, o CQC levou Bolsonaro à prisão.”

Felipe Andreoli

“Claro que não. Seria muita pretensão acreditar que um programa de TV, por mais relevante que fosse, tinha esse poder. Ele era ridicularizado. Era pra mostrar o quão precário é o nível dos nossos políticos. Mas muita gente acabou se identificando com aquela figura. Era um Brasil que tava no armário e saiu. Certamente é um problema do nosso país e não culpa de um programa de TV. Seria muito simplista colocar na conta do CQC.”

Rafinha Bastos

“A gente deu exposição… O que pode ter contribuído pra ascensão. Mas demos exposição pra ele como demos pra muito mais gente. Culpar o programa pela eleição do homem, não faz o menor sentido. O CQC nunca apoiou ou foi até a urna obrigar eleitor a votar no sujeito.”

Rafael Cortez

“É claro que não! Na ocasião em que o CQC surgiu, há quantos anos o Bolsonaro já era deputado federal em exercício com sucessivos mandatos? Há quanto tempo ele já tinha uma trajetória política? A sociedade precisa parar de eleger culpados para seus próprios feitos. Haviam muitas opções além de Lula/Haddad e Bolsonaro naquelas eleições. No estado democrático há sempre opções e caminhos, mas a partir do momento em que escolhas coletivas erradas forem depositadas nas costas de alguém que sirva para “pagar o pato”, alguém não está fazendo a lição do mea-culpa direito.”

Marco Luque

“Cara, eu acredito que o CQC não foi responsável pela ascensão do Bolsonaro, não. A gente expôs como muitos ou todos os outros políticos da época. A gente sempre teve um trabalho imparcial. Acho que não tem a ver isso, não. Tem a ver com metade da população acreditar nele, né? Não... Não no programa ter exposto ele, acredito que não.”

Maurício Meirelles

“O Bolsonaro é um fenômeno que iria acontecer com CQC ou sem CQC, baseado na ascensão das redes sociais e comunicação de algoritmo, onde qualquer pessoa consegue se tornar relevante pro debate público.”

Placar final

Depois das respostas de roteiristas, apresentadores e repórteres, o resultado ficou tão unânime quanto um Fla x Flu organizado pelo VAR do Alexandre de Moraes:

CQC 9 x 0 Teoria da Responsabilidade.

Todos dizem que o CQC não teve qualquer responsabilidade pela ascensão do Bolsonaro. Nem um voto contrário. Nem um empate técnico. Nem um “não, mas…”.

O que as respostas deixam claro é simples: o CQC expôs Bolsonaro, mas quem o elegeu foram milhões de brasileiros.

O programa não fez propaganda, fez piada. E só!


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