Um dos cartões-postais mais conhecidos do Rio Grande do Sul , o Guaíba é tema de discussão quando o assunto é a sua classificação: alguns defendem que ele é um rio , enquanto para outros é um lago .
O debate antigo pode ter uma definição oficial em uma audiência pública no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) . Na última sexta-feira (30), pesquisadores, ambientalistas e especialistas em Direito apresentaram perspectivas sobre a classificação da bacia hídrica . A reunião faz parte do julgamento de uma ação que pede que o Guaíba seja reconhecido como rio.
A audiência pública discutiu a diversidade de análises científicas sobre o principal corpo hídrico de Porto Alegre. O debate auxiliará na compreensão da natureza do Guaíba , e essa definição tem impacto direto em aspectos legais relacionados à área de seu entorno.
Rio ou lago?
Atualmente, o Guaíba é oficialmente definido como um lago. Porém, até os anos de 1990, ele foi considerado rio. A prefeitura da capital gaúcha o definiu (e deseja manter) com a nomenclatura atual— inclusive, criou o Comitê da Bacia do Lago Guaíba .
Em entrevista à Agência Brasil no ano passado, o professor Joel Avruch Goldenfum , diretor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), afirmou que não existe consenso científico em torno da definição da nomenclatura porque o corpo hídrico tem comportamento dual.
“As margens se comportam bem como lago, principalmente envolvendo questões de recirculação, baixa profundidade, sendo basicamente bidimensional, ou seja, não existe direção predominante. O rio tem uma direção como se fosse uma linha. No lago, a água fica girando” , explica.
Segundo Goldenfum, no meio do Guaíba há um grande canal por onde passam as águas do Rio Jacuí, que recebe água de uma área enorme, correspondente a cerca de um terço de todo o estado, com 80 mil quilômetros quadrados.
Há quem defenda que um lago pode, sim, ter um rio cruzando. Mas, na prática, o Guaíba se comporta como um rio na maior parte do tempo. Em outras situações, porém, ele se parece mais com um lago.
O que está em jogo?
O desejo da prefeitura de Porto Alegre e do governo do Estado de manter a definição do Guaíba como lago também mantém a proteção das margens a 30 metros para dentro das cidades.
Caso a ação movida por ambientalistas obtiver êxito, o Guaíba passa a ser reconhecido como rio e ganha até 500 metros de proteção nas margens. Não seriam removidos construções existentes, mas poderia proibir novas.
A juíza Patrícia Antunes Laydner , que conduz a ação civil pública e preside a audiência, afirmou que esse é o momento de ouvir argumentos da comunidade científica, sem bater o martelo. Para ela, o encontro serve para evitar que uma única perícia responda a uma pergunta complexa, como a que foi apresentada na ação.
“Porque há mais de uma corrente a respeito desse curso d'água. A partir dessa oitiva, depois, meu planejamento é talvez tentar marcar uma audiência de conciliação para ter elementos melhores para podermos conciliar” , projeta.
Justificativa do rio
O professor Elírio Toldo Júnior, da UFRGS, destacou na audiência que as águas ficam no Guaíba vindas do rio Jacuí e de outros rios, até saírem para a Lagoa dos Patos.
Ele explicou que independentemente da vazão ser expressiva ou pequena, o padrão de escoamento se mantém, de norte a sul, da superfície das águas até o fundo. o comportamento é claramente de um rio, já que a água leva só alguns dias para passar por ali. Em um lago, esse tempo seria de meses ou até anos.
Justificativa do lago
Rualdo Menegat , também professor da UFRGS, defendeu na audiência a tese de que o Guaíba é um lago aberto. Segundo ele, o corpo hídrico forma um delta, que só acontece quando um rio deságua em uma área maior e deposita os sedimentos.
Para ele, essa evidência é contraditória para definir a região como um rio, enquanto a evidência da presença de correntezas não pode ser usada para derrubar a tese do lago.
Interpretações
Historicamente, a população sempre chamou o bioma aquático de “ Rio Guaíba ”, sem se preocupar com os detalhes técnicos. Por, cientificamente, não haver um consenso, a definição vai precisar ser feita na Justiça.
Até as últimas atualizações, o Guaíba é definido como um lago aberto que recebe água da rede fluvial, formada por quatro rios ( Jacuí, dos Sinos, Caí e Gravataí ) que afluem para o Lago Guaíba, que, por sua vez, também escoa essa água para a Laguna dos Patos .