No Brasil, mais de 26 milhões de mulheres foram vítimas de assédio no último ano
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No Brasil, mais de 26 milhões de mulheres foram vítimas de assédio no último ano

Se 17 milhões de mulheres relataram ter sofrido algum tipo de violência de gênero nos últimos 12 meses, o número é ainda maior quando se trata de assédio e  importunação sexual: 26,5 milhões de brasileiras relatam que ouviram cantadas e comentários desrespeitosos nas ruas e no trabalho ou até mesmo foram agarradas ou beijadas à força no último ano.

Na pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública ao Instituto Datafolha e publicada em junho passado, as mulheres foram convidadas a responder de forma detalhada os tipos de assédio que sofreram – no estudo, o termo é usado de forma coloquial, e não como consta da lei, segundo a qual assédio sexual se dá apenas quando existe uma relação hierárquica entre agressor e vítima.

Ao responder o tipo de assédio mais frequente experimentado por elas no último ano, 31,9% das mulheres (de 16 anos ou mais) disseram ser os comentários desrespeitosos e cantadas nas ruas. De acordo com o Código Penal brasileiro, esse tipo de comportamento é, na verdade, chamado de importunação sexual e considerado crime desde 2018, com pena de um a cinco anos de prisão. É o caso, por exemplo, da ciclista que teve o corpo tocado por um homem que estava dentro de um carro em movimento, na cidade de Palmas, no Paraná.

Em segundo lugar na pesquisa do Datafolha, está o assédio sexual tal como previsto na lei, ou seja, no ambiente de trabalho onde há uma relação hierárquica com a vítima: 12,8% relatam ter ouvido comentários desrespeitosos no trabalho. Por fim, em terceiro lugar, aparece o transporte público, onde 7,9% dizem ter sofrido algum tipo de importunação sexual.

"É importante ter em mente que, quando falamos desse tipo de assédio, estamos tratando de uma cultura milenar, secular, patriarcal em que a mulher é um objeto de desejo do homem", afirma a socióloga Jacqueline Pitanguy.

A importunação sexual sob a forma de cantadas, praticada em espaços públicos como ruas e transportes, é, segundo ela, mais uma "afirmação de um tipo de masculinidade que está profundamente enraizada". 

"Muitas vezes, no comentário feito na rua, na cantada, o homem não pretende levar de fato a um ato físico, está fazendo uma demonstração para a mulher de qual é o lugar dela, de objeto de desejo. Ele está dizendo que, sendo um objeto de desejo, ele a trata como quiser", diz a socióloga.

Ainda segundo a pesquisa, 5,4% das mulheres contam que foram agarradas ou beijadas à força e 4,6% afirmaram que tentaram se aproveitar delas quando estavam alcoolizadas.

"Quando falamos de violência sexual no Brasil, a primeira coisa que sabemos é que existe uma subnotificação muito alta", afirma Marina Ganzarolli, advogada que atua no atendimento a mulheres vítimas de violência há 15 anos. "Estima-se que a subnotificação seja de 5% a 7%. Então, quando olhamos para dados de violência sexual, estamos olhando para um pequeno, pequeníssimo recorte do universo todo de incidentes de segurança contra a mulher".

Ganzarolli ressalta que a violência doméstica, isto é, dentro de casa, ainda é o maior problema no país, mas, "bem como o machismo se reflete em todas as esferas das nossas vidas", a violência de gênero está em todas as áreas. Isso porque a origem do assédio é, lembra a advogada, "uma desigualdade de poder entre homens e mulheres, o machismo estrutural e sistêmico, que coloca a sexualidade, o corpo das mulheres, num lugar muito diferente daquele dos homens".

"Os homens passaram por uma educação sexista, e nós, mulheres, também passamos por essa mesma educação. Estamos inseridos nessa cultura, na ideia de que a nossa sexualidade não possui autonomia, de que nossos corpos estão à disposição do prazer masculino", completa Ganzarolli.

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