Quem quer que visse a performance do então ministro do meio ambiente Ricardo Salles na reunião ministerial de 20 de abril do ano passado dificilmente imaginaria o destino dele 429 dias depois. Com a voz firme e frases enfáticas, ele ganhou notoriedade ao pedir que o governo passasse a boiada
na área ambiental enquanto a opinião pública se preocupava com a epidemia de Covid-19. Mais deu m ano depois do episódio, Salles sai pela porta de trás do governo depois de virar alvo de dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal(STF)
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A trajetória de Salles na área ambiental não ficará marcada apenas pele pedido para passar a boiada. No comando do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ricardo Salles foi um dos responsáveis por alguns dos piores índices de desmatamento e queimadas da história do país. Em 2019 e 2020, o Brasil registrou as piores taxas de destruição da floresta amazônica desde 2008. Ao todo, quase 21 mil quilômetros quadrado sde mata desapareceram enquanto Salles esteve no cargo.
Salles também ficará conhecido como o ministro do meio ambiente que entrou em rota de colisão, ao mesmo tempo, com parceiros internacionais como a Alemanha e a Noruega, a comunidade científica, movimentos indígenas e organizações não-governamentais.
Em meio ao avanço das queimadas na Amazônia, ele colocou em xeque a qualidade do trabalho desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(Inpe). Salles também paralisou os trabalhos do Fundo Amazônia, chegou a levantar suspeitas de que o Greenpeace pudesse estar por trás do derramamento de óleo que atingiu a costa do Brasil em 2019 e defendeu o direito à mineração em terras indígenas.
Sua atuação causava ruídos junto à comunidade internacional, mas mesmo assim ele vinha sentido mantido pelo presidente Jair Bolsonaro.
O ponto de inflexão em sua trajetória no governo, porém, não foram as taxas crescentes de desmatamento na Amazônia. Foram duas investigações que tramitam contra ele no STF nas quais ele é suspeito de ter atuado para favorecer madeireiras que atuariam de forma ilegal na Amazônia.
Em abril, Salles foi denunciado pelo então superintendente da Polícia Federal no Amazonas Alexandre Saraiva por ter atuado em favor de empresários que tiveram madeira ilegal apreendida na divisa do Pará com o Amazonas. Saraiva foi exonerado do cargo no dia seguinte, mas o caso seguiu em frente no STF.
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Um mês depois,Salles foi um dos alvos da Operação Akuanduba, em que ele é investigado por ter favorecido empresas que exportariam madeira ilegal. Nos dois casos, ele nega envolvimento em irregularidades. Nesta semana, o delegado responsável pelo caso perdeu um cargo de comando.
Pressionado por essas duas investigações, Salles vinha se mantendo longe dos holofotes. O perfil incisivo e assertivo pelo qual era conhecido deu lugar a conversas de bastidores e comportamento discreto.
Na terça-feira, chegou a receber um afago do presidente Jair Bolsonaro durante o lançamento do Plano Safra.
—Parabéns, Ricardo Salles. Não é fácil ocupar seu ministério. Por vezes, a herança fica apenas uma penca de processos —disse o presidente.