Eleita deputada federal em 2018, a c antora e pastora Flordelis dos Santos de Souza está com o mandato ameaçado. Alvo de um pedido de afastamento feito pelo Ministério Público estadual do Rio e de um processo disciplinar na Câmara dos Deputados, a parlamentar é acusada de ser a mandante da morte do marido, o pastor Anderson do Carmo. A vítima foi assassinada em junho de 2019, apenas quatro meses após Flordelis tomar posse como deputada.
O pedido feito pelo MP para que Flordelis seja afastada corre de forma independente ao processo disciplinar na Câmara . Ou seja, ambos não possuem ligação entre eles. Entenda, abaixo, detalhes sobre cada um deles.
Pedido de afastamento pelo Ministério Público estadual
Na terça-feira, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio decidiu, por unanimidade (com votos de três desembargadores), afastar Flordelis do cargo de deputada federal . A decisão foi dada após um recurso do MP estadual. A decisão dos desembargadores é para que Flordelis permaneça afastada do cargo até ir a julgamento por ser mandante da morte do marido. A determinação, no entanto, é para que o afastamento tenha duração máxima de um ano. Ou seja, se até esse período o julgamento não ocorrer, a pastora poderá reassumir o cargo.
Não há previsão para que o julgamento de Flordelis ocorra. No processo criminal respondido pela pastora, já foram ouvidas todas as testemunhas de acusação e de defesa, além dos réus. A juíza Nearis dos Santos Carvalho Arce, da 3ª Vara Criminal de Niterói, abriu prazo para que todos os réus no processo - Flordelis, sete filhos e uma neta, além de um policial militar e a esposa - apresentem as chamadas alegações finais. Na peça, os advogados devem apresentar suas razões para que seus clientes não sejam levados a júri popular.
Após a apresentação das alegações finais, a juíza do caso dará uma sentença na qual decidirá quais acusados irão a júri popular pelo crime . Dessa decisão, ainda caberá recurso. Só em seguida, os réus serão levados a júri.
Apesar da determinação da 2ª Câmara Criminal, Flordelis ainda não pode ser afastada. A decisão precisa ser aprovada pelo plenário da Câmara dos Deputados, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Para que a decisão do TJ seja mantida, será necessário ter 257 votos favoráveis.
Ainda não há prazo para que a votação do afastamento de Flordelis ocorra, segundo a assessoria de imprensa da Câmara dos Deputados. Nessa quarta-feira, a Justiça do Rio notificou a Câmara de Deputados sobre a decisão de afastar Flordelis. Foram enviados ofícios ao deputado federal Arthur Lira, presidente da câmara.
O afastamento de Flordelis à 2ª Câmara Criminal foi pedido pelo MP sob argumento de que a deputada poderia se utilizar do cargo para interferir em seu julgamento. Inicialmente, o pedido foi feito à juíza Nearis dos Santos, no processo criminal respondido por Flordelis. A magistrada negou a solicitação. O MP então recorreu à 2ª Câmara Criminal.
Na Justiça, a defesa de Flordelis ainda poderá recorrer da decisão judicial.
Processo na Câmara pode culminar com perda de mandato
Paralelo ao pedido judicial para um afastamento provisório, Flordelis enfrenta um processo administrativo na Câmara dos Deputados que pode terminar com a perda definitiva de seu mandato. Nesse caso, ainda há diversas etapas a serem cumpridas e o processo pode demorar até três meses para ser finalizado.
Na última terça-feira, após instauração do processo contra a parlamentar no Conselho de Ética da Casa, foi desginado o relator do procedimento, deputado Alexandre Leite (DEM-SP). O parlamentar terá 10 dias úteis para dar um parecer preliminar no qual recomendará o prosseguimento ou arquivamento do caso.
Caso o Conselho de Ética decida pelo prosseguimento do caso, Flordelis será notificada e terá um prazo de 10 dias úteis para apresentar defesa por escrito. Na etapa seguinte, serão ouvidas testemunhas de defesa e acusação em um prazo máximo de 40 dias úteis.
No fim desse prazo, o relator terá que apresentar um novo parecer sobre o caso, opinando sobre a perda do mandato , que será votado pelo Conselho de Ética. Após essa decisão, o processo será encaminhado para o plenário da Câmara, que fará nova votação.
O processo administrativo contra Flordelis teve como origem uma representação do deputado Leo Motta (PSL-MG), feita em agosto de 2020. Na ocasião, após Flordelis ter virado ré por ser mandante da morte do marido, o parlamentar apresentou uma denúncia contra Flordelis na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados "por atos incompatíveis com o decoro parlamentar".
A denúncia do parlamentar foi encaminada para a corregedoria da Câmara. Após análise, o corregedor, deputado Paulo Bengtson (PTB-PA) deu parecer no qual recomendou à Mesa Diretora da Câmara continuidade do processo disciplinar contra Flordelis. A mesa concordou com o parecer e decidiu enviar a representação ao Conselho de Ètica.
Por causa da pandemia, o conselho não estava funcionando, por isso a representação ficou parada na Mesa Diretora por quase quatro meses. Na última segunda-feira, o Conselho de Ética voltou a funcionar e o processo disciplinar contra Flordelis foi instaurado.
Relembre o crime
O pastor Anderson do Carmo foi morto a tiros na garagem da casa da família, em Pendotiba, Niterói, na madrugada de 16 de junho de 2019. Dias após o crime, dois filhos de Flordelis foram presos e foram acusados de participação no assassinato. Flávio dos Santos Rodrigues - filho biológico apenas da deputada - e Lucas Cézar dos Santos Rodrigues - filho adotivo de Flordelis e Anderson - respondem a processo judicial pelo crime. Flávio, acusado de ter atirado no padastro, e Lucas, acusado de ter ajudado o irmão a comprar a arma do crime.
Após a prisão e indiciamento de Lucas e Flávio , a Polícia Civil do Rio continuou investigando a participação e outras pessoas no crime, incluindo Flordelis. Em agosto do ano passado, a deputada, outros quatro filhos e uma neta foram acusados de envolvimento no assassinato. Flordelis foi apontada como mandante do crime. A polícia ainda descobriu uma tentativa de manipular as investigações com uma carta copiada por Lucas no presídio.
Flordelis é a única acusada de envolvimento no crime que não está presa, em razão de sua imunidade parlamentar. Ela é monitorada por tornozeleira eletrônica.