Se não fosse a ação determinada dos presidentes da Câmara e do Senado, com o apoio majoritário dos parlamentares, o País iniciaria 2020 em um quadro de crise política e sem rumo na economia. Felizmente, não foi assim.
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A Reforma da Previdência, que permitiu o reequilíbrio das contas públicas e impediu a quebra do País, foi garantida pelo Congresso. E isso aconteceu enquanto o presidente perdia o foco das necessidades urgentes do País, estimulava sua guerrilha virtual contra inimigos reais e imaginários e voltava suas baterias contra os generais qualificados de sua própria equipe. Nesse momento, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia , teve um papel moderador essencial para restabelecer a urgência das mudanças e o equilíbrio entre os Poderes.
Bolsonaro prepara uma minirreforma ministerial. O objetivo é aumentar a interlocução com o Congresso
Se depender do mandatário, há mais turbulência à vista. Ao contrário do imaginado, a polarização política não diminuiu no primeiro ano do governo Bolsonaro . O radicalismo imperou no novo governo, na oposição esquerdista e também naqueles que acompanharam o ataque crescente à Lava Jato, dos dois lados do espectro. Mas um novo cenário político se desenha a partir das articulações para o pleito presidencial de 2022 e das eleições municipais de outubro próximo.
No Congresso, o Executivo tem cada vez menos força para impor sua agenda. O presidente dinamitou sua base de sustentação na Câmara . Não disporá de uma legenda própria, já que está em pé de guerra com o seu antigo partido, o PSL, a segunda maior bancada na Câmara.
O novo partido bolsonarista, o Aliança pelo Brasil, não deve obter o número mínimo necessário de assinaturas a tempo de disputar o pleito de 2020. O PSL, desidratado pela saída do presidente e da ala bolsonarista, ainda terá uma bancada grande, mas perderá seu principal cabo eleitoral. Com isso, perderá sua relevância. Novas forças vão se consolidar. O governador de São Paulo, João Doria, mantém um controle cada vez maior no PSDB, o que o fortalece para 2022.
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E o polo de esquerda continuará gravitando em torno do PT, apesar do desgaste do ex-presidente. Lula apostou na radicalização quando saiu da prisão, mas esse discurso não tem tido aderência na população — o ex-presidente continuará contando principalmente com sua militância. O campo independente ainda depende, essencialmente, da candidatura do apresentador Luciano Huck, que evita se expor para não queimar a largada. Dessa forma, Maia permanecerá o fiel da balança entre os dois extremos. A saída para a política brasileira é pelo centro.
Como a mostrar que os extremos perdem força, Bolsonaro encerrou o primeiro ano de mandato tendo sofrido vários reveses. Depois de conseguir paralisar as investigações contra Flávio Bolsonaro, com o auxílio do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, o presidente viu o Ministério Público do Rio de Janeiro fazer buscas em endereços do filho e do seu ex-auxiliar, Fabrício Queiroz, e de parentes de sua ex-mulher, Ana Cristina Valle.
Foi revelado que ex-assessores de Flávio deram R$ 2 milhões a Queiroz, em 483 depósitos ou transferências para o ex-PM. Cresce a gravidade do caso, que vai fragilizar ainda mais a posição de Bolsonaro. As pesquisas mostram que a queda de sua popularidade estancou depois que a economia deu sinais de retomada, ainda que tímida. Mas sua grande base de sustentação ainda é circunscrita aos seus eleitores originais, ou cerca de um terço da população.
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O destino do presidente, e a possibilidade de que o País quebre o ciclo de estagnação, está na continuidade das reformas. Mas elas não acontecerão pela ação do governo. O ministro Paulo Guedes enviou três Propostas de Emenda Constitucional (PECs) no último ano que redesenham o Estado, com fusão de municípios, e permitem a contenção de gastos em caso de emergência fiscal. São de difícil aprovação, por exigirem maioria de três quintos dos parlamentares. O envio da reforma administrativa, que atingiria em cheio os servidores, foi adiada porque o governo sentiu que haveria grande resistência.
Mas a principal aposta do Congresso, a reforma Tributária, apontada pelos empresários como prioritária, está em compasso de espera porque o governo ainda espera ressuscitar o imposto do cheque — o próprio presidente Bolsonaro e o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), voltaram recentemente ao assunto. Rodrigo Maia já foi taxativo sobre sua oposição. Há duas propostas de mudanças tributárias em tramitação no Congresso, e a comissão mista que trata do tema vai se reunir no recesso para trabalhar em um proposta unificada. Se as mudanças avançarem, será novamente pelas mãos dos atuais presidentes das duas Casas — e contra o desejo do titular da Economia.
Contra a paralisia, Bolsonaro prepara uma minirreforma ministerial para o início do ano. Os ministros Onyx Lorenzoni (DEM-RS), da Casa Civil, Álvaro Antônio, do Turismo, e Abraham Weintraub, da Educação, devem perder seus postos. O segundo está no centro do escândalo das candidaturas-laranja, e Weintraub tem desagradado o próprio presidente com sua militância espalhafatosa nas redes sociais, além de executar uma gestão desastrosa na Educação. O objetivo é aumentar a interlocução com o Congresso. Bolsonaro avalia que a articulação política a cargo do general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) não está surtindo o efeito esperado.
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O problema, no entanto, continua sendo a ação divisionista e conflituosa que o presidente continua estabelecendo com os partidos e a sociedade — Bolsonaro ainda considera que o essencial é pregar para a sua bolha. Com um quarto do mandato presidencial já consumido, todas as mudanças que podem destravar a economia e garantir o desenvolvimento sustentável dependem do Congresso , que terá o controle de fato da agenda política. E de um novo centro, que deve emergir depois do caos instalado pelo descalabro dos anos petistas e de uma administração radical de direita, que só sobrevive como contraposição à esquerda.