O atual ministro da Ciência e Tecnologia na gestão do presidente Michel Temer (MDB), Gilberto Kassab (PSD), pediu licença do cargo de secretário da Casa Civil do governo do estado de São Paulo sob a futura gestão João Doria (PSDB), cargo que assumiria apenas no dia 1º de janeiro de 2019.
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O pedido foi feito por Kassab após ele se tornar alvo de uma operação da Polícia Federal na semana passada que cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços ligados a ele, inclusive um apartamento no Itaim Bibi, zona Sul de São Paulo, onde os policiais apreenderam R$ 300 mil em espécie, além de documentos e eletrônicos. A busca foi autorizada pela Justiça após uma delação da J&F acusá-lo de receber propina da empresa entre os anos de 2010 e 2016.
O afastamento ocorreu nesta quinta-feira (27) e foi "prontamente atendido" pelo governador eleito João Doria (PSDB). Neste período, Kassab fez questão de esclarecer, o futuro secretário não receberá salário, já que o pedido de licença foi com "perda de vencimentos".
O ministro também disse, através de nota oficial divulgada pela sua assessoria de imprensa, que a obrigação de compararer à Brasília com frequência para tratar de questões pessoais dificultaria sua atividade como secretário da Casa Civil . É na capital federal que Kassab terá que prestar esclarecimentos do caso e, por isso, Doria ficará sem o aliado que foi um dos principais articuladores políticos de sua campanha e que ocuparia o cargo responsável pela articulação política entre os deputados da Assembleia Legislativa de São Paulo e o Executivo.
“Absolutamente tranquilo sobre sua conduta ao longo da vida pública, Kassab decidiu licenciar-se do cargo para se dedicar à organização e ao encaminhamento das informações solicitadas por sua defesa, que comprovarão a lisura de seus atos”, disse em nota.
Kassab voltou a reafirmar sua confiança na Justiça brasileira, no Ministério Público e na imprensa. Ele diz que “entende que quem está na vida pública deve estar sujeito à especial atenção do Judiciário” e reforça estar à disposição para quaisquer esclarecimentos.
Operação da PF tinha Kassab como alvo
Na quarta-feira da semana passada (19), os agentes da Polícia Federal chegaram ao apartamento de Kassab em São Paulo por volta das 6h. Eles, porém, não conseguiram cumprir o mandado de busca e apreensão expedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, a pedido da procuradora-geral da República (PGR), Raquel Dodge, de imediato já que o local estava fechado.
O relator do caso no Supremo era filiado ao PSDB antes de ser nomeado ministro do Supremo e chegou a ser secretário municipal de Transporte de São Paulo, justamente na gestão de Kassab a frente da prefeitura paulistana.
Antes das 7h, no entanto, o advogado de Kassab chegou ao local e acompanhou a ação dos policiais até por volta das 10h. No local, a PF informou ter apreendido R$ 300 mil em espécie, além de documentos, computadores e outros eletrônicos que pudessem servir de prova para as alegações feita pelos executivos da J&F Wesley Batista e Ricardo Saud em delação premiada.
Segundo o documento enviado pela Procuradoria Geral da República (PGR) ao STF, os delatores informaram que repassaram R$ 58 milhões ao ministro da Ciência e Tecnologia através de duas formas.
Primeiro, em forma de mesada de R$ 350 mil, realizada ilegalmente através de contratos fictícios de alugueis de caminhões com a empresa Yape Transportes, ligadas ao político, totalizando R$ 30 milhões. Os policias investigam se a Yape Consultoria, também de Kassab, também foi utilizada no esquema.
Depois, o ministro Gilberto Kassab também teria vendido o apoio político do PSD, partido político fundado por ele, ao PT na campanha de reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2014. Os pagamentos teriam sido realizados pela J&F por meio de doações oficiais ao partido, além da quitação de notas fiscais falsas de prestação de serviços e da entrega de dinheiro em espécie aos envolvidos no esquema, totalizando outros R$ 28 milhões.
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Em nota a PGR afirmou que "o objetivo dos pagamentos era contar com poder de influência do ministro em 'eventual demanda futura de interesse do referido grupo'. Para viabilizar os repasses, os envolvidos celebraram contrato fictício de prestação de serviços com uma empresa do ramo de transportes que possuía relação comercial com a J&F".
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a ação dos policiais com base no inquérito que investiga se Kassab cometeu corrupção passiva, lavagem de dinheiro e caixa-dois. Moraes também determinou a quebra de sigilo bancário e telefônica de Kassab e das empresas investigadas de fazerem o repasse financeiro.
Além disso, fora o mandado de busca no apartamento de Kassab em São Paulo, outros sete mandatos foram cumpridos na capital paulista; em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista; em São José do Rio Preto, no interior; e em Natal, no Rio Grande do Norte; este último local porque os delatores informaram que os repasses feitos em troca do apoio político ao PT em 2014 foi feito para dois candidatos do PSD eleitos no estado potiguar nas mesmas eleições. Os nomes não foram divulgados, mas se sabe que um era deputado federal e outro era governador, justamente quando o atual governador Robinson Faria (PSD) foi eleito.
Diante de tudo isso, o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab é suspeito de ter cometido crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral. Ele, no entanto, nega as acusações e disse, na ocasião, que "não há nada que macule" sua imagem. "Ao longo de todos esses anos de vida pública não há nada que me comprometa no campo da imoralidade. Estou tranquilo porque sempre respeitei os princípios da ética. Estou à disposição do Ministério Público e do Poder Judiciário", afirmou.
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Já o governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), também emitiu nota oficial no mesmo dia da operação da PF , afirmando que confia "na conduta da Justiça e no amplo direito de defesa do ministro para os esclarecimentos necessários". Na ocasião, essa declaração de Doria foi vista como um apoio informal ao seu futuro secretário da Casa Civil, algo que não se confirmou agora que Kassab pediu licença do cargo para se defender das suspeitas na Justiça.