O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin atendeu a um pedido da Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, e determinou a abertura de um processo de apuração de pagamento de caixa dois para o deputados Onyx Lorenzoni (DEM), atual ministro extraordinário de transição no governo do presidente Michel Temer (MDB) e futuro ministro da Casa Civil no governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL).
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A denúncia é de que Onyx Lorenzoni recebeu pagamentos não declarados do grupo J&F, dono do frigorífico JBS. O futuro ministro é alvo de pelo menos um dos dez processos aberto a pedido da PGR com o objetivo de apurar o suposto pagamento de caixa dois a parlamentares. No caso de Onyx, os delatores da JBS relataram dois repasses de R$ 100 mil: um na campanha das eleições de 2014 e outro na campanha de 2012.
O próprio futuro ministro da Casa Civil já admitiu que recebeu o valor indevido por caixa dois em 2014, mas nega o recebimento de qualquer valor ilícito em 2012. Deputado pelo Rio Grande do Sul há 20 anos, Onyx sempre teve um forte discurso anti-corrupção como parlamentar e, inclusive, se aproximou de Bolsonaro por isso, já que essa foi uma das principais bandeiras da campanha do presidente eleito.
Com a abertura do novo processo, caso Dodge considere que há elementos para prosseguir com uma investigação, ela poderá pedir a abertura de um inquérito contra Onyx ou arquivar a petição se considerar as provas insuficientes.
Os outros deputados que se tornaram alvos de processos abertos pelo ministro Edson Fachin nesta terça-feira (4) foram Alceu Moreira (MDB-RS), Marcelo Castro (MDB-PI), Jerônimo Goergen (PP-RS), Paulo Teixeira (PT-SP) e Zé Silva (SD-MG). Já os senadores Ciro Nogueira (PP-PI), Eduardo Braga (MDB-AM), Wellington Fagundes (PR-MT) e Renan Calheiros (MDB-AL) também serão alvo de investigações da PGR.
O ministro Edson Fachin decidiu, portanto, fatiar a delação de executivos do grupo J&F e mandou instaurar procedimentos individuais em relação aos dez parlamentares.
Renan Calheiros e Onyx Lorenzoni, unidos por abertura de processos de investigação por caixa dois hoje, são velhos adversários políticos. Em 2016, quando o primeiro era presidente do Senado e o segundo relator de um pacote anticorrupção na Câmara dos Deputados, ambos trocaram acusações.
Enquanto Calheiros ironizou afirmando que Onyx Lorenzoni "parece nome de chuveiro, mas não é nome de chuveiro", o própro Onyx respondeu afirmando que Renan Calheiros era um bandido e que "bandidado a gente enfrenta na delegacia e no tribunal. Já assinei procuração e até o fim da tarde vou fazer uma interpelação judicial para que ele apresente provas da acusaçõa que me fez".
A acusação feita por Calheiros a qual Lorenzoni se referia era de que ele teria recebido justamente pagamento de caixa dois, nesse caso, no entanto, da indústria das armas, fortes lobistas, sobretudo, no Rio Grande do Sul, estado natal de Onyx.
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Apesar de ser o relator da Operação Lava-Jato e da delação dos executivos do grupo J&F no STF, Fachin não ficará automaticamente com os novos processos. Todos eles serão encaminhados para livre distribuição entre os ministros do Supremo, ou seja, haverá sorteio para a escolha dos relatores de cada caso. Dessa forma, com exceção do presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, que não participa dos sorteios, qualquer um dos demais dez integrantes do STF, inclusive o próprio Fachin, poderão ser sorteados para relatar um desses processos.
“Verificou-se, como consta nas planilhas do ‘item 2’ acima, situações em que o recebimento de dinheiro de forma dissimulada ocorreu no curso do mandato parlamentar por agentes políticos que ainda são detentores de foro no STF, fazendo-se necessária a autuação de petições autônomas para adoção de providências em relação a cada autoridade envolvida”, escreveu Dodge no pedido para a abertura dos processos.
O futuro ministro ainda não comentou a abertura do processo. Há duas semanas, no entanto, quando o jornal Folha de S. Paulo revelou o documento que mostra que Onyx Lorenzoni recebeu R$ 100 mil em 30 de agosto de 2012, repassado em espécie durante as eleições municipais e registrado na planilha dos delatores como "Doações-2012" como "Onyx-DEM", o futuro ministro declarou que "nada temo", atacou o jornal em discurso inflamado e, na sequência, pediu trégua à imprensa já que, segundo ele, o novo governo "não tem paz para se organizar e trabalhar".
"Há tempos tentam destruir Bolsonaro e agora tentam fragilizá-lo. Eu não temo ninguém, tenho a verdade comigo", disse. "Vamos parar com o terceiro turno em respeito à decisão das urnas. Jair Bolsonaro, Sérgio Moro e Onyx Lorenzoni são combatentes contra a corrupção, não me incluam nessa lama petista", emendou.
Na sequência, Lorenzoni afirmou que "não é a primeira vez que tentam me envolver em episódios de corrupção”, afirmou Onyx, após café da manhã com Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em 14 de novembro. "Sou um combatente da corrupção. Faz um ano que tentam destruir Jair Bolsonaro. Qual foi a resposta da sociedade? Uma vitória esmagadora.”
“No governo [eleito] não teve trégua. Todo dia teve alguém nos batendo. Não vão nos fragilizar. O que desejo é fazer uma transformação verdadeira do Brasil”, afirmou o ministro extraordinário de transição do governo Temer. “Vamos enfrentar com altivez qualquer tentativa de nos envolver com corrupção. Somos combatentes da corrupção.”
O futuro chefe da Casa Civil também fez questão de ressaltar que tem tatuado no braço o versículo bíblico, que está no livro de João (8:32): “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. Segundo ele, é uma recordação do erro do recebimento do dinheiro da JBS em 2014 e seu reconhecimento para evitar novos deslizes.
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Segundo os documentos revelados na ocasião e que agora sustentam o pedido de abertura de processo de investigação contra Onyx Lorenzoni e outros noves parlamentares, o ex-diretor de Relações Institucionais da J&F, Ricardo Saud, entregou um anexo à PGR em 3 de maio do ano passado, informando que a JBS doou via caixa dois, R$ 200 mil a Onyx em 2014 e 2012.
Em relação à doação ilegal em 2014, Saud detalhou ter usado como intermediário Antônio Camardelli, presidente da Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne). Lorenzoni, porém, afirmou desconhecer a pessoa que fez a delação à PGR e voltou a afirmar que a planilha apresentada por executivos do grupo JBS aos procuradores é falsa. Ele fez diversas críticas à Folha de S.Paulo, acusando o jornal de defender o PT.
De qualquer forma, os dois pagamentos [de 2012, revelado hoje, e de 2014, admitido por Lorenzoni] estão sendo investigados pela PGR desde agosto, por ordem do próprio ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin.
Depois da abetura do processo, no entanto, Onyx ainda não se pronunciou. Ele está reunido com o presidente Jair Bolsonaro no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde funciona o gabinete improvisado da equipe de transição, em Brasília (DF). Juntos, futuro presidente e futuro ministro da Casa Civil farão reuniões com cerca de 100 parlamentares de quatro partidos (MDB, PR, PRB e PSDB), alguns deles colegas de Onyx sob nova investigação da PGR.
É esperado, porém, que ele responda às perguntas dos jornalistas em algum momento do dia ou que, pelo menos, faça uma declaração à imprensa comentando a denúncia de caixa dois.
O presidente eleito Jair Bolsonaro, do qual Onyx será ministro, já afirmou diversas vezes que não aceitaria indiciados por corrupção em seu governo. “Nossos ministérios não serão compostos por condenados por corrupção, como foram nos últimos governos. Anunciarei os nomes oficialmente em minhas redes. Qualquer informação além é mera especulação maldosa e sem credibilidade“ disse através de sua conta oficial no Twitter.
O juiz Sergio Moro, futuro ministro da Justiça, foi outro integrante do futuro governo questionado sobre a situação do deputado e disse ter admiração por ele e pela defesa que Onyx fez das medidas anticorrupção, ele também afirmou que o deputado pediu desculpas.
Numa outra entrevista, Moro foi questionado sobre se defenderia o afastamento de um ministro suspeito de corrupção quando afirmou que "se a denúncia for consistente, sim", a pessoa deve ser afastada. Ele lembrou que ouviu de Bolsonaro que não haveria proteção no seu governo em meio a eventuais suspeitas. “[Ele, o presidente eleito, disse que] ninguém seria protegido" e que caberia a ele próprio defender o afastamento do responsável por um possível caso de corrupção que eventualmente integre o governo.
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No passado, Onyx Lorenzoni já foi alvo da Operação Lava Jato por um inquérito aberto por uma Delação da Odebrecht em 2017, mas o Ministério Público arquivou o caso por falta de provas.