No penúltimo debate presidencial antes do primeiro turno das eleições, os candidatos elevaram o tom do embate e das críticas mútuas. O foco prioritário, não por coincidência, foi o PT e Jair Bolsonaro, líderes nas pesquisas mais recentes.
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Sem a presença de Jair Bolsonaro (PSL), que se recupera do atentado sofrido em 6 de setembro, mas contando com a participação de Cabo Daciolo (Patriota), que retornou de seu jejum religioso, o debate presidencial contou ainda com Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede), Guilherme Boulos (PSOL), Fernando Haddad (PT), Álvaro Dias (Podemos) e Geraldo Alckmin (PSDB).
Realizado pela Folha de S.Paulo, Uol e SBT , este foi o terceiro debate entre os candidatos à Presidência da República nas eleições deste ano. Dividido em três blocos, contou com espaço para perguntas entre os presidenciáveis, questionamentos dos jornalistas dos três veículos e consideralções finais.
Já antes do debate os candidatos davam a senha do caminho que pretendiam seguir durante a discussão. "É possível que os institutos de pesquisa simplesmente errem porque a população está em permanente mutação” disse Ciro Gomes, já recuperado da cirurgia na próstata realizada na noite anterior, acrescentando que “ninguém está apaixonado, é um fim de ciclo, o ódio está demarcando o campo de uma forma muito grave".
Fernando Haddad também teve em mente a proximidade de 7 de outubro ao dizer que "no primeiro turno as pessoas escolhem quem elas preferem”. Já na segunda parte da eleição, afirmou, “é hora de abrir o diálogo com as forças políticas e setores da sociedade".
Cabo Daciolo, em linha com o que apresentaria nos três blocos do debate, apostolou: "Minha aliança é com Jesus Cristo".
O debate presidencial
Logo na primeira pergunta entre os candidatos, Guilherme Boulos, buscando emparedar Geraldo Alckmin, disparou: “Cada o dinheiro da merenda?”, questionou, em referência ao escândalo do desvio de dinheiro de merendas escolares em São Paulo.
O tucano respondeu com números de seu governo: São Paulo cresceu no Ideb, um dos índices de avaliação do ensino, e avançou em diversos outras estatísticas. Mas evitou o tema do dinheiro das merendas desviado durante seu governo.
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Foi quando Boulos emplacou seu primeiro “meme”. “Você não é nenhum santo, diferente do que muitos dizem – você é o Sérgio Cabral que não está preso”, disse. O tucano, então, acusou Boulos de ser um desocupado invasor de propriedades, deplorando pelo "baixo nível" de seu opositor. E negou, por fim, responsabilidade no roubo das merendas.
A segunda pergunta foi de Ciro Gomes para Fernando Haddad, ambos postulantes para uma das vagas no segundo turno. “Qual a sua proposta para o desenvolvimento regional pelo país?”, quis saber o pedetista. Em entrevistas anteriores, Ciro já havia insinuado que Haddad "desconhece" o interior do país.
O petista respondeu que foi o ministro lulista que mais andou pelo Brasil, levando universidades, creches, internet e ônibus escolares para diversas cidades e regiões da federação.
Como saída para o desenvolvimento nacional integrado, Haddad falou em retomar obras paradas: estradas de ferro, pontos energia renovável, entre outros, que, segundo candidato petista, estavam previstos no PAC, o programa de aceleração do crescimento de Dilma Rousseff, tendo sido brecados por Michel Temer.
O atual mandatário emedebista, inclusive, seria o sujeito de diversas perguntas e respostas, sempre tratado negativamente pelos candidatos - inclusive por Meirelles, seu correligionário no MDB. Foi o caso da indagação de Daciolo à Ciro.
“Glória a Deus”, começou o deputado, que em seguida culpou os políticos ali presentes pela falta de “ordem e progresso no país”, querendo saber as propostas do candidato para a saúde.
Ciro disse ser necessário revogar a PEC dos gastos aprovada por Temer. Propôs, então, a genérica dupla “gestão e eficiência” na área de saúde. Entre as proposições objetivas, falou em estipular premiações para gestores que atingirem nos aparelhos públicos voltados para a população.
Daciolo, em sua réplica, acusou o candidato de ter “corrido para um hospital público” quando se sentiu mal na noite de terça-feira (25). “Compreendo a sua indignação”, respondeu Ciro. “Sou parte dos poucos brasileiros que pode pagar plano de saúde, não sou um demagogo”, completou.
Outro momento de acusação viria em seguir. Haddad questionou Marina Silva sobre a PEC do teto de gastos e a terceirização imposta na reforma trabalhista. A candidata é favorável ou contra?
Marina respondeu que, em função da corrupção, o pais está no fundo do poço. É necessário retomar a credibilidade com os investidores, disse, a fórmula certa para retomar empregos. Silva, enfim, culpou o PT por ter colocado Temer onde ele está.
“Me desculpe”, disse Haddad”, “mas quem colocou o Temer lá foram vocês”.
No segundo bloco, cabia aos jornalistas formular perguntas para os candidatos. Ciro foi questionado se, em uma eventual gestão sua, os petistas seriam chamados a participar.
“Vou compor meus governos como compus os demais governos de que participei. Metade serão mulheres. Todos terão excelência técnica e ética. E adensamento político. Francamente, prefiro governar sem o PT”. Na resposta, o candidato chama Bolsonaro de “cria do PT” e “aberração”. A jornalista quer saber: e o MDB?
“Ele será destruído no meu governo pelos caminhos democráticos”. Em seguida, o pedetista elogia alguns emedebistas com quem gostaria de dialogar. E reafirma que é “amigo ou colega” de todos ali, apresentando-se como apto ao diálogo.
Meirelles foi chamado à responder sobre a reforma da previdência. O jornalista perguntou, também, se o ex-ministro chamaria Temer para uma eventual composição ministerial.
Líder da Fazenda nos anos Temer, Meirelles falou das “injustiças” da previdência, que penaliza os mais pobres. “Não faço parte do governo. Sempre escolhi equipe pela competência e seriedade”, diz, afirmando que não escolheria 0 ex-chefe para seu ministério.
A pergunta seguinte foi para Alvaro Dias. Ele apoiaria Bolsonaro no segundo turno?
Dias refez suas críticas ao PT e disse acreditar no “despertar” do povo brasileiro. Afirmou ainda acreditar ter chances de ir ao segundo turno. Mas deixou nas entrelinhas um possível apoio à Bolsonaro, já que seu principal objetivo nas eleições, disse, é “evitar a volta do PT”.
No terceiro bloco, Haddad inicia sua pergunta elogiando Meirelles. “Fui ministro da educação por 7 anos. Graças ao seu apoio, abri a porta das universidades para os alunos mais pobres. Qual será a sua política para a educação superior no Brasil?”.
Feliz com a menção positiva, Meirelles diz que tudo o que Haddad construiu foi baseado na política econômica adequada dos anos Lula. O petista “agradece aos elogios”, e diz que pretende investir no ensino médio. Cada universidade “adotará” uma escola estadual de baixo desempenho em sua gestão, promete.
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Marina perguntou para Álvaro Dias sobre suas propostas para as mulheres, população na qual mais incide o desemprego.
De forma genérica, o candidato falou da necessidade de “abrir espaços” para as mulheres, sobretudo na política. E prometeu “carinho” para com as mães.
Em seu turno de perguntar, Dias mirou Haddad. “Pretendo isentar do imposto de renda quem ganha até 5 mil por mês. O sr. propõe o mesmo. Como fará isso, se antes o PT não fez?”.
“Todos os programas sociais que o brasileiro conhece – Prouni, transposição do rio São Francisco, o Mais Médicos, a Bolsa Família – sairam do orçamento federal. A população mais pobre entrou no orçamento” disse Haddad.
“Agora queremos mexer também na receita”, completou, afirmando que quer “inverter a lógica” da arrecadação, cobrando mais dos ricos, e menos dos pobres, “fazendo a roda da economia girar”. “O senhor não tem respeito pela população que recebeu esses benefícios”, arrematou contra Dias, que pediu direito de resposta – o que lhe foi negado.
Ciro indagou Boulos – a quem, no tom cordato que vem adotando nestas eleições, chamou de “talentoso candidato”. Como encaminhar a questão do jovem no mercado de trabalho?
Boulos lamentou o morticídio dos jovens nas periferias e o sistema carcerário no país. “Não quero que nossos jovens tenham sua primeira arma, mas o primeiro emprego. Não quero construir presídios, mas escolas”, disse. Ciro, na réplica, reapresentou sua proposta de criar estágios remunerados para jovens no ensino médio.
Era a vez de Boulos perguntar. Direcionando-se à Daciolo, quis saber sobre a proposta do adversário quanto as mulheres.
Exaltado como sempre, o cabo proporcionou aos expectadores um dos momentos mais engraçados do debate. “Quero deixar para as mulheres da nação brasileira que elas serão prioridade. Metade do meu ministério será de mulheres”, disse, declarando amor à sua mulher e sua mãe, presentes na plateia.
“Estávamos com saudade de você nos debates”, disse um sorridente Boulos. “Glória”, cumprimentou Daciolo. “As mulheres vão salvar o Brasil do atraso”, acrescentou Boulos, convocando as pessoas para o ato “#Elenão”, de oposição à Bolsonaro, marcado em diversas cidades para o dia 29 de setembro.
Considerações finais no debate presidencial
Os candidatos à Presidência da República partiram, enfim, para as considerações finais. Cabo Daciolo agradeceu novamente a Deus, e, direcionando-se ao eleitor, arrematou com uma referência bíblica: “disperta, ó tu que dorme”. “Eu vou ser o próximo presidente da República em primeiro turno, com 51% dos votos”, profetizou, arrancando novos risos dos presentes.
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Guilherme Boulos despediu-se da seguinte forma: “Todos dizem que vão mudar o Brasil, mas ninguém muda o brasil andando com os mesmos de sempre. Aprendi, lutando por moradia ao lado dos sem-teto, que é preciso ter coragem e ter lado. Se você é contra esses sistema político falido, vote 50”.
Ciro Gomes agradeceu aos opositores, sempre muito educado, e se voltou aos indecisos: “Se você é eleitor do Bolsonaro porque é contra o PT, se você é eleitor do PT porque é contra o Bolsonaro, nós discordamos. Não podemos apostar na polarização”, concluiu, reforçando ser o mais preparado para ocupar o Planalto.
Henrique Meirelles apostou em sua experiência à frente do ministério na hora de se despedir do expectador. “O que vimos aqui hoje foi um ringue e um show. Ninguém brigando de fato pelo que é preciso para você. Isso se conquista com trabalho e competência”, terminou.
Já Fernando Haddad buscou reavivar a memória dos anos de Lula. “Meu governo será pautado por um principio: ampliar as oportunidades. De duas maneiras: com emprego e educação. Sairemos de qualquer crise com emprego e educação. Já provamos que isso é possível durante os 12 anos de normalidade democrática, quando o voto era respeitado. Vamos fazer o Brasil voltar a ser feliz de novo”, concluiu, lançando mão de seu bordão de campanha.
Geraldo Alckmin citou o chamado custo-país e defendeu a necessidade de reformas econômicas profundas. “O Brasil ficou um país caro, o emprego sumiu, não tem investimento. O país tem pressa, não pode errar de novo. Não podemos ir com o candidato da descriminação e nem com o PT. Temos tudo para nos recuperar. Com investimentos, oportunidades para os jovens, reduzindo o custo-Brasil”.
Marina Silva lançou mão de sua biografia, dirigindo-se prioritariamente às mulheres. “Vocês não sabem a alegria e o orgulho que tenho de estar aqui representando vocês. Eu, ex-empregada doméstica, disputando aqui, palmo a palmo esta eleição. Ninguém chama o Meirelles quando há um problema em casa: chama uma tia, uma avó experiente, para botar a ordem na casa. Não tenho ódio de ninguém e vou governar com os melhores”, despediu-se.
Alvaro Dias exerceu, então, o direito de resposta que não recebeu anteriormente. Sempre surfando na onda do antipetismo, refez as críticas de sempre ao partido. E afirmou que, terminado o debate presidencial , irá se encaminhar ao estádio em Itaquera para assistir Flamengo vs Corinthians pelo jogo de volta da semi-final da Copa do Brasil.
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