O peronista Sergio Massa e o ultraliberal Javier Milei disputam o segundo turno da eleição presidencial da Argentina.
O peronista Sergio Massa e o ultraliberal Javier Milei disputam o segundo turno da eleição presidencial da Argentina.
O peronista Sergio Massa e o ultraliberal Javier Milei disputam o segundo turno da eleição presidencial da Argentina.


Em outubro a Argentina passou pelo primeiro turno de uma eleição presidencial extremamente polarizada que resultou num 2º turno vindouro entre o atual ministro da Economia e integrante da coalizão Unión por la Patria, Sergio Massa , e o deputado de extrema direita, Javier Milei , da coalizão Libertad Avanza. 

A decisão definitiva virá no dia 19 de novembro, quando os eleitores irão às urnas escolher entre o responsável pela economia em frangalhos devido à dívida externa e inflação altas; e um candidato “outsider” que se inspira em figuras como Jair Bolsonaro e Donald Trump.

Mesmo com as primeiras pesquisas apontando certa vantagem de Massa sobre Milei o resultado ainda é imprevisível, e a única certeza é que o vencedor do pleito terá pela frente um governo difícil, com desafios econômicos e políticos na relação com o Congresso. 

Na análise de Paola Zuban, cientista política, mestre em Comunicação Política, co-fundadora, sócia e diretora de pesquisa na consultoria Zuban Córdoba y Asociados, o crescimento de Sergio Massa - que estava atrás nas pesquisas - entre as eleições primárias e o primeiro turno é um resultado tanto de uma estratégia bem traçada da campanha de Massa, quanto de erros de Milei e seus aliados na semana que antecedeu o primeiro turno.


Ela cita, por exemplo, falas de aliados de Milei que levantaram propostas que causaram medo na população, como a ideia de permitir que homens renunciem à paternidade de seus filhos; de ruptura com o Vaticano e ataques feitos ao Papa Francisco - que é argentino -  num país majoritariamente católico.

“Milei tentou moderar um pouco o discurso, mas na última semana voltou à sua radicalização, com um tom muito agressivo contra o resto dos dirigentes políticos e particularmente contra o ‘Radicalismo’, um dos partidos mais antigos da política da Argentina, que integra a coalizão ‘Juntos Por El Cambio’ da candidata Patricia Bullrich", explicou a cientista política.

"Por outro lado, a campanha de Sergio Massa foi cirúrgico em sua campanha nos lugares do país onde houve abstenção de eleitores. Ele foi buscar, com a estrutura partidária do Peronismo, aqueles eleitores para que fossem votar nas eleições gerais. Isso fez uma grande diferença no primeiro turno”, argumentou Paola.

Após o primeiro turno, Milei recebeu o apoio tanto da candidata que ficou em 3º lugar, Patricia Bullrich, quanto do ex-presidente Mauricio Macri , provocando uma ruptura na coalizão “Juntos por el Cambio”, pois muitos parlamentares de centro-direita recém-eleitos não desejam se associar às ideias de Milei. 

“Muitos deputados e senadores estão anunciando que não concordam com o acordo entre Patricia Bullrich e Javier Milei, reconfigurando um novo cenário político. O ‘Juntos por el Cambio’, que era a principal força de oposição até o surgimento de Milei, está dividido entre os que apoiam Javier Milei e os que dizem que ele é, literalmente, um desastre para a democracia e uma ameaça ao povo argentino."


Diante disso, Paola avalia que Sergio Massa tem, hoje, "um cenário um pouco mais favorável para disputar a presidência se considerarmos os apoios e os setores que se afastaram de Javier Milei”. 

Apesar do descontentamento do povo argentino - especialmente da classe média - frente à perda de qualidade de vida causada pela corrosão da economia ter favorecido o crescimento das ideias extremistas que Milei representa, o desfecho da campanha causou medo de um possível governo de extrema direita.

Esse fato levou parlamentares de oposição que não querem apoiar um candidato como Milei a se manifestarem contra o apoio da candidata derrotada Patricia Bullrich ao ultradireitista.

“As propostas de Javier Milei estão tão próximas das ideias levadas a cabo por Bolsonaro, num movimento que não é exclusivo da América Latina. Vimos avanços da direita radicalizada, aproveitando-se do descontentamento dos cidadãos, da frustração das pessoas com a política tradicional, que não tem sido capaz de responder à demanda por melhoria da qualidade de vida”, disse Paola.


“A Argentina precisou emitir muita moeda para fazer frente à pandemia, e isso gerou uma espiral inflacionária que criou uma crise econômica muito profunda, somada à dívida externa que a Argentina contraiu durante o mandato de Macri. Esses dois fatores que desvalorizam o peso deterioraram muito a qualidade de vida da classe média tradicional Argentina”, contou a cientista política. 

Paola pontua que, ao mesmo tempo, classes sociais mais vulneráveis que historicamente se identificam com o Peronismo , “tinham proteção social e pertencimento ao Peronismo, se sentiram abandonadas durante a pandemia. Isso debilitou as forças políticas tradicionais, e por isso cresce muito a direita radicalizada que vem com uma receita de plano econômico que promete magicamente, através da dolarização da economia, resolver todos os problemas”.

Assim, o cenário político fica ainda mais incerto, visto que a população está muito dividida e não é possível determinar qual dos candidatos tem a maior vantagem. “No segundo turno, a eleição se polariza muito e as diferenças sempre são muito apertadas. O contexto hoje é muito atípico, está muito alvoroçado e é bastante complexo”, disse Paola. 

Seja quem for o próximo presidente, Paola destaca que o governo será difícil, não só pela ausência de apoio popular massivo, mas pela dificuldade de conseguir maioria no Congresso para levar reformas adiante. 

“Vamos ter um presidente que vai ter metade do país contra si e um congresso muito complexo, porque o peronismo perdeu a maioria no Congresso eleito no primeiro turno, enquanto ‘Juntos Por El Cambio’ está fragmentado. Não se sabe como vão se estruturar os grupos na Câmara dos Deputados. O ‘Libertad Avanza’ obteve pelo menos 40 assentos na Câmara dos Deputados", explicou Paola.

A cientista política explicou que após o resultado do primeiro turno, há mais deputados e senadores alinhados ao Peronismo, mas com muito pouca diferença em relação ao número de parlamentares de oposição da coalizão "Juntos Por El Cambio."

"Para ter maioria na Câmara, é necessário 107 deputados. Preciso verificar com mais precisão, mas creio que o peronismo tem 104 deputados; que Juntos Por El Cambio tem 91; enquanto Libertad Avanza de Milei tem aproximadamente 41 deputados. Então temos 2 candidatos que não terão maioria parlamentar e vão precisar de Juntos Por El Cambio para negociar qualquer mudança que queiram propor no Congresso.”

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!