Heiko Thoms, embaixador da Alemanha no Brasil
Reprodução/Embassy Brasília 1.4.2022
Heiko Thoms, embaixador da Alemanha no Brasil

As sanções funcionam e a comunidade internacional deve estar coesa nesse sentido, para acelerar o fim da guerra. O recado foi dado pelo embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms, em entrevista ao GLOBO. “Está claro também: as sanções surtem efeito. Quanto mais países participarem, mais rapidamente vamos poder terminar a guerra e limitar seus impactos humanitários”, assegurou Thoms, num claro recado ao governo brasileiro.

Como o senhor avalia a posição do Brasil na guerra entre Ucrânia e Rússia?

Antes de tudo, gostaria de expressar meu reconhecimento pela forma como o governo brasileiro e a sociedade brasileira reagiram à guerra de agressão russa contra a Ucrânia. A enorme empatia dos brasileiros diante do sofrimento das pessoas na Ucrânia é impressionante. Não há como enaltecer suficientemente o acolhimento de refugiados da Ucrânia no Brasil.

É de imensa relevância que o Brasil tenha se posicionado de forma clara e, junto com a grande maioria da comunidade mundial, tenha condenado expressamente a violação flagrante do Direito Internacional cometida pela Rússia, nas quatro votações determinantes nas Nações Unidas: no Conselho de Segurança (em 25 de fevereiro), na Assembleia Geral (em 2 de março e em 24 do mesmo mês) e no Conselho de Direitos Humanos (em 4 de março).

É necessária uma ação decidida e coesa da comunidade internacional, sobretudo de todas as nações democráticas, para pôr fim à guerra iniciada pela Rússia. Uma guerra que foi iniciada absolutamente sem provocação. A nosso ver, as sanções deliberadas também são uma importante contribuição nesse sentido.

Em seus votos nas Nações Unidas, o Brasil condenou a Rússia, mas questionou as sanções e o envio de armas para a Ucrânia. Essa atitude causa mal-estar no âmbito da União Europeia?

Em primeiro lugar, é importante para nós que o Brasil tenha assumido uma posição clara, porque é uma grande nação democrática cujos votos têm grande peso no mundo todo e é membro do Conselho de Segurança da ONU. É importante que o Brasil tenha condenado o ataque russo.

O Brasil declarou o cumprimento da Carta da ONU como primeira prioridade para seu mandato temporário no Conselho de Segurança da ONU. É bom ver que o Brasil agora também está agindo de modo condizente. Segundo a Carta da ONU, a Ucrânia também tem todo o direito de se defender da agressão russa.

Quanto às sanções, precisamos primeiramente registrar o seguinte: o ataque russo à Ucrânia, violando o Direito Internacional, é o motivo das sanções. Isso quer dizer que ele também é o motivo para as consequências delas. Com antecedência, a UE e o G7 haviam anunciado sanções severas no caso de uma invasão russa. Mas o governo russo optou pela guerra. Está na mão da Rússia acabar com as sanções. Está claro também: as sanções surtem efeito. Quanto mais países participarem, mais rapidamente vamos poder terminar a guerra e limitar seus impactos humanitários.

O governo Bolsonaro já enfrentava questionamentos na Europa por sua política ambiental. A relação poderia desgastar-se ainda mais pelas diferenças sobre a guerra?

Não deveríamos misturar as duas questões. Na avaliação da guerra iniciada pela Rússia, acho que nós e o Brasil concordamos muito. Foi o que mostrou a forma como votamos nos grêmios relevantes das Nações Unidas.

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Em relação à política ambiental, o posicionamento brasileiro na COP26 em Glasgow nos animou. O objetivo declarado de deter o desmatamento ilegal até 2028 e reduzir a emissão de metano é um importante passo para a proteção do meio ambiente e também para a transformação econômica do Brasil rumo a mais sustentabilidade. O Brasil tem o potencial de se tornar novamente pioneiro no combate às mudanças climáticas globais. Porém, até agora, vemos somente anúncios e taxas de desmatamento crescendo cada vez mais, mas nenhum plano detalhado de como esses objetivos devem ser atingidos.

Quais objetivos intermediários devem ser alcançados no percurso até 2028? Quais medidas concretas devem ser adotadas para reverter a tendência atual, infelizmente bastante negativa? Tive muitas conversas com representantes do governo, do Congresso e de outras instituições e sei que muitos já reconheceram a grande importância de tomar medidas concretas, que despertem confiança.

Ao mesmo tempo, não quero esconder que acompanhamos com uma certa preocupação os projetos de lei atualmente em debate no Congresso. Os projetos sobre a liberação de áreas indígenas para a mineração e outras atividades econômicas, a regularização fundiária, o licenciamento ambiental e sobre a reforma do registro de defensivos agrícolas.

A guerra da Rússia na Ucrânia merece, claro, toda a nossa atenção. Mas é evidente que não podemos perder de vista a proteção do meio ambiente e do clima, muito menos tomar decisões que poderiam eventualmente representar retrocessos irreversíveis.

Qual é sua avaliação sobre a guerra? O mundo deve se preparar para um conflito de longo prazo?

Ninguém pode prever seriamente quanto tempo a guerra ainda vai durar. Mas estou convicto de que a guerra poderá terminar com maior rapidez, quanto mais determinados e coesos nós reagirmos, como comunidade internacional.

Precisamos fazer tudo para que uma solução pela via diplomática seja alcançada. Uma solução tem de ser acordada entre a Ucrânia e a Rússia. E, na verdade, não como um “diktat” russo, mas, sim, com uma negociação em pé de igualdade e com a preservação da soberania e da independência da Ucrânia.

Como vê o momento político no Brasil?

Em países democráticos, discursos e conflitos políticos sobre o futuro do país costumam se acirrar em anos eleitorais. Observamos isso no Brasil também. Estamos ansiosos para ver as decisões que as eleitoras e os eleitores brasileiros vão tomar nas eleições presidenciais, legislativas e de governadores deste ano.


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