O ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou que o governo prioriza para a liberação de verbas prefeituras cujos pedidos foram negociados por dois pastores. O ministro diz que isso atende a uma solicitação do presidente Jair Bolsonaro.
A gravação foi obtida pela "Folha de S.Paulo" e divulgada na noite desta segunda-feira.
Os pastores seriam Gilmar Santos e Arilton Moura, que ao menos desde janeiro de 2021 têm negociado com prefeituras a liberação de recursos federais. Eles não têm cargo no ministério.
"Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar. [...] Por que ele? Porque foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do Gilmar", disse o ministro na conversa.
Em seguida, o ministro indica haver uma contrapartida à liberação dos recursos: "Então o apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção de igrejas", diz sem dar detalhes.
De acordo com a Folha, a reunião ocorreu no ministério. Milton Ribeiro falou sobre o orçamento da pasta, cortes de recursos da educação e a liberação de dinheiro para essas obras. Participaram prefeitos, pastores e lideranças do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão do Ministério da Educação responsável pela gestão dos recursos em questão.
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Gestores e assessores disseram à Folha que os pastores negociam pedidos para a liberação de recursos e depois entram em contato com o ministro, que determina ao FNDE a oficialização do empenho. Alguns políticos foram recebidos na casa do próprio ministro, fora da agenda oficial.
O pastor Gilmar Silva dos Santos comanda a igreja Ministério Cristo para Todos, em Goiânia, ligada à Assembleia de Deus, e preside uma entidade chamada Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil Cristo para Todos, da qual Arilton aparece como secretário.
O jornal "O Estado de S. Paulo" já havia mostrado que a dupla atuava facilitando agendas para pessoas de fora do governo e participando da liberação de verbas para prefeitos. De acordo com a reportagem, Gilmar e Arilton participaram de pelo menos 22 agendas no ministério, sendo 19 com o próprio ministro.
As interferências de reigiosos na pasta, que tem à frente Milton Ribeiro, também pastor evangélico, acontece num momento de queda drástica dos recursos para Educação. Levantamento feito pelo GLOBO, no fim do ano passado, revelou que a verba destinada a investimentos na educação básica, que compreende ensino fundamental e médio, caiu 13%. Dados oficiais do próprio MEC apontam que a rubrica recebeu R$ 6,9 bilhões em 2020 contra R$ 6 bilhões em 2021.
Em 2018, o orçamento para esse segmento alcançou R$ 7,5 bilhões. Além disso, o jornal mostrou que os recursos despencaram em todas as modalidades de ensino, educação infantil, de jovens e adultos, superior e profissionalizante. O maior corte foi na educação de jovens e adultos (EJA): enquanto em 2018, foram empenhados R$ 76 milhões, no ano passado, apenas R$ 4 milhões foram destinados à modalidade, uma redução de 94%. Em 2013, a mesma rubrica, considerada fundamental para a erradicação do analfabetismo no país, tinha ultrapassado a casa de R$ 1 bilhão em recursos.
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