Justiça, religião e moral
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Justiça, religião e moral


Houve um tempo em que se falar em direito e religião como campos separados era algo sem sentido. As normas religiosas eram também jurídicas e o direito se manifestava levando em conta a religião.

Um conhecido escritor, Fustel de Coulanges, dizia que na Grécia antiga, os juízes não eram escolhidos entre os mais capacitados, preparados ou estudados. Não. O bom juiz era aquele amado pelos deuses. A moral, por sua vez, era ela própria construída com base nos costumes e estes, naturalmente, estavam embebidos em práticas e valores religiosos.

Com o passar do tempo, o direito de separou da religião, e também da moral, muito embora essa última ainda seja, de algum modo, inspiração para a criação de leis e também de julgamentos. Essa separação, assim, criou um universo jurídico em que a moral é, digamos, mediada. E a religião não teria mais espaço.

A religião, em tese, não teria espaço dentro do direito na maioria dos países, mas em países muçulmanos, por exemplo, o corão (livro sagrado do islamismo) é uma fonte normativa utilizada também no universo jurídico. E, na verdade, mesmo em países sem religião oficial (laicos), a religião ainda joga um papel importante no direito.

Veja-se o exemplo do  aborto no Brasil. Por mais que se queira invocar a laicidade do Estado brasileiro, como pretender um alijamento total da religião do debate, se a ideia de início da vida não é unívoca? Para os religiosos, o início da vida se dá com a concepção, para os não religiosos, ateus, agnósticos e descrentes de todo o gênero, não há que se falar em concepção, mas simples fases de desenvolvimento de uma multiplicação celular.


Mais: quem delibera sobre normas relativas ao tema são representantes do povo, parlamentares, e se o povo escolheu pessoas religiosas e que se pautam por máximas religiosas em todos os campos de suas vidas, pode-se até criticar esse transporte de concepções transcendentais para dentro de debates estritamente laicos na teoria, mas há que se reconhecer ser algo próprio da democracia.

Outro exemplo é a  pena de morte, tema de polêmica certa e que parece ser atraente em qualquer contexto de conversas. Sabe aquela festinha familiar? Pois, ela pode ocorrer logo após o cometimento de um crime impactante e aí aquele seu primo distante vai mandar algo como “tem que matar esse cara!”, se referindo ao assassino, confesso ou não.

Entra aí uma mistura de sentimentos morais e religiosos. Religião é aspecto por demais subjetivo e as concepções são muito variadas de acordo com as crenças adotadas. Já a moral, construída em sociedade, pode ser um auxiliar útil do direito.

Há 50 anos, por exemplo, era praticamente impensável haver proteção jurídica formal às minorias, uma realidade concreta na atualidade. Parece ser claro que novos costumes, e via de regra uma nova moral, construiu também novas normas e um novo direito.

A questão, portanto, não é de se criticar ou, ainda pior, demonizar a moral, mas atentar para que tipo de conteúdo moral estamos nos voltando e buscando aplicação.

Para quem quiser acessar mais material meu e de outros pesquisadores, deixo aqui o  link do Instituto Convicção, do qual faço parte.

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