Pesquisadores brasileiros descobriram um novo gênero e espécie de borboleta em montanhas na Bacia do Rio Doce, no leste de Minas Gerais, mas o animal já está ameaçado de extinção. A descoberta foi publicada nesta sexta-feira (15) na revista científica Zootaxa, e o estudo foi conduzido por pesquisadores do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA) e da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).
A nova espécie foi batizada como Agojie rupicola , nome que mistura ciência e cultura pop. 'Agojie' é uma homenagem às guerreiras Agojie do reino de Daomé, na África Ocidental, que foram representadas no filme "A Mulher Rei", de 2022, protagonizado por Viola Davis. Já 'rupicola' faz referência aos ambientes rochosos da Mata Atlântica, habitat onde as borboletas foram encontradas. Popularmente, os pesquisadores nomearam a nova espécie como borboleta guerreira das pedras.
Danilo Cordeiro, doutor em Entomologia* e pesquisador do INMA, foi quem coletou a nova espécie de borboletas pela primeira vez, em expedição nas montanhas do leste de Minas Gerais. "A minha especialidade é o grupo das moscas e mosquitos, mas como essa região tem uma lacuna muito grande de conhecimento, eu tenho buscado coletar diversos grupos e entrar em contato com especialistas de cada grupo para trabalhar junto comigo, para que a gente possa realmente conhecer esses animais", afirma.
Quando Danilo viu as borboletas pela primeira vez, dois aspectos chamaram sua atenção. O primeiro, relata ele, é que os animais pareciam batalhar próximos às pedras quentes em um dia ensolarado. O segundo é a beleza da espécie. "Quando a gente vê ela na sombra, ela é meio que um marrom; mas quando o sol bate, tem um tom avermelhado que é bem bonito", descreve o pesquisador.
Nova espécie
Danilo, então, coletou algumas amostras e as enviou para a análise de Thamara Zacca, professora do Departamento de Entomologia do Museu Nacional. A pesquisadora, que já desconfiou logo de cara que se tratava de algo novo, fez diversos estudos para cravar que este era, de fato, um novo gênero e espécie de borboleta.
Dentre as análises, foram feitos, por exemplo, estudos sobre a genitália do animal e avaliações a respeito dos ocelos - os círculos escuros nas asas das borboletas. Todos os aspectos analisados foram comparados com outras espécies e gêneros já registrados, chegando à conclusão de que se tratava de um animal ainda não catalogado cientificamente. A primeira coleta feita por Danilo foi em 2020 e, de lá para cá, a nova espécie vem sendo estudada pelo grupo.
"A identificação das espécies, à primeira vista, pode até parecer algo simples, mas requer muito estudo e pesquisas até a definição de um nome", explica Thamara.
Junto com outras espécies, a borboleta guerreira das pedras faz parte de uma coleção de 250 borboletas e mariposas que foram doadas pelo INMA ao Museu Nacional. Um dos objetivos é ajudar a reconstruir a coleção científica da instituição, destruída por um incêndio em setembro de 2018.
Ameaça de extinção
A recém-descoberta borboleta já é classificada pelos cientistas como ameaçada de extinção. Isso acontece por diversos motivos, como o fato da espécie estar distribuída em uma região bastante restrita e pela diminuição da qualidade ambiental na área.
Danilo explica que as montanhas da Bacia do Rio Doce têm muita invasão de vegetações exóticas, o que influencia na manutenção da fauna local. "A gente não sabe ainda como essa borboleta lida com esse problema, porque a gente não sabe se ela consegue se alimentar dessas outras gramíneas. E outras borboletas também podem invadir o ambiente e aí ela pode perder, por competição, o espaço", explica.
Esses e outros aspectos devem continuar sendo estudados pelos pesquisadores, que agora querem entender como essas borboletas se alimentam, como interagem com outras espécies locais e qual o impacto de incêndios criminosos, comuns na região, nas borboletas guerreiras das pedras.
"Eu costumo dizer que quando a gente descobre uma espécie, se abre uma janela de conhecimento. Agora que a gente sabe que ela existe, a gente vai ter que descobrir todas as outras coisas sobre essa espécie", afirma Danilo.
Para que as pesquisas continuem e a fauna e flora local possam ser preservadas, os pesquisadores se articulam para que a área se torne uma unidade de conservação. "Temos conversado com a comunidade, os órgãos ambientais e o poder público local para pensar na melhor estratégia de proteção das montanhas da região. Uma proposta de unidade de conservação está sendo elaborada com o auxílio do Plano de Ação Territorial Capixaba-Gerais, uma importante ferramenta para pensar coletivamente ações para proteger espécies ameaçadas de extinção", afirma Paulo Minatel Gonella, pesquisador da Universidade de São João del-Rei.
*Entomologia é a especialidade da biologia que estuda os insetos sob todos os seus aspectos e relações com o homem, as plantas, os animais e o meio-ambiente.