Uma adolescente de 14 anos que havia sofrido ataques racistas na escola onde estuda, em Curitiba (PR), teve seu caderno rabiscado com ameaças na manhã desta quarta-feira. Duas páginas foram preenchidas com as frases “vou te matar preta desgraçada’’ e “não vai ficar assim”. O autor das intimidações não foi identificado.
O primeiro ataque sofrido pela menina ocorreu no Colégio Militar Sebastião Saporski no dia 10 deste mês. Na ocasião, ela teve o caderno rabiscado enquanto a turma estava fora da sala de aula, na classe de Educação Física.
Quando voltou à sala, a aluna percebeu que seus materiais estavam mexidos, e que havia frases escritas nele, como “só menina branca é bonita”, “onde já se viu ter preto nesse colégio” e “preta desgraçada”. No dia seguinte, ela foi recebida na escola pelos colegas e professores com demonstrações de carinho, em um ato antirracista que protestava contra o ataque realizado.
A mãe da adolescente, que preferiu não ser identificada, disse ao Globo que tanto a jovem quanto a família estão em choque e com medo.
"A minha filha chegou em casa muito abalada. Eu e meu esposo tivemos que sair correndo do trabalho e, quando chegamos na escola, a polícia já estava lá", contou a mãe, que é cabeleireira.
Ela afirmou que não vai trabalhar durante essa semana para fazer companhia à filha em casa, que não irá mais à escola até o fim do ano.
"Não tem como, estamos nervosos, com o coração apertado. Por que há uma pessoa tão jovem, com tanto ódio, sem motivo? A gente se preocupa com a nossa filha, depois de ver a ameaça, fica medo de que aconteça alguma coisa", desabafou.
De acordo com a cabeleireira, por causa da pandemia da Covid-19, as aulas presenciais estão sendo transmitidas online, o que garante que a menina continue estudando de casa. O casal de pais registrou um segundo Boletim de Ocorrência no 4º Distrito Policial de Curitiba. O primeiro foi feito na semana passada, após os primeiros ataques.
Procurados pelo Globo, a Polícia Civil e a escola não responderam até a publicação da reportagem.
A mãe da adolescente afirmou não ter muitas explicações da diretoria do colégio sobre o ocorrido. Segundo ela, as câmeras de segurança do local ainda vão ser analisadas pela Polícia.
"Não consigo suspeitar de ninguém", confessou a mulher. "Minha filha nunca brigou na escola, sempre foi muito querida e rodeada de amigos. Nunca teve inimizades. A prova disso foi a forma com que ela foi acolhida no colégio, com cartazes e gestos de apoio, por alunos de todas as idades e pelos professores", lembrou.
Mobilização dos alunos
No dia 11 deste mês, logo após o primeiro ataque à adolescente, os alunos do Colégio Militar Sebastião Saporski organizaram um ato antirracista em apoio à colega, com diversos cartazes de repúdio ao racismo e roupas pretas.
Um vídeo postado nas redes sociais de uma colega mostra os alunos enfileirados no corredor da escola, segurando cartazes e caminhando com os braços levantados e punhos fechados, um símbolo que representa solidariedade, apoio e resistência.
Foram confeccionados dezenas de cartazes, que continham frases em homenagem e apoio à vítima, como “racismo é crime”, “racismo é o pior grau da ignorância humana”, “você não está sozinha”, “não precisa ser negro para lutar contra o racismo” e [colégio] “Saporski é um lugar de tradição e respeito e aceita qualquer um independente da cor”, sendo o último uma referência direta a uma das mensagens deixadas no caderno da menina.
O Globo apurou que, após as primeiras agressões, a diretoria do colégio promoveu duas palestras para a conscientização dos alunos: uma com a temática do racismo e outra sobre violência e impulsividade.