Morreu, nesta sexta-feira, no Hospital da Restauração (HR), na área central de Recife (PE), Roberta da Silva, a mulher trans que teve 40% do corpo queimado por um adolescente , em 24 de junho. O óbito ocorreu às 9h, segundo a assessoria de comunicação da unidade de saúde.
Ainda de acordo com o HR, Roberta da Silva teve falência respiratória e renal. O quadro de saúde dela se agravou nas últimas horas. A equipe médica da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) realizou hemodiálise , mas a paciente não reagiu.
Antes disso, ela teve um braço completamente amputado e parte do outro devido à gravidade dos ferimentos. Inicialmente, a informação era de que ela tinha 33 anos, mas o hospital afirmou, nesta sexta, que ela tinha 32, segundo documentos.
O ataque contra Roberta ocorreu quando ela, que morava nas ruas do Centro do Recife, dormia perto do Terminal de Ônibus do Cais de Santa Rita , segundo relato da vítima aos médicos. Um adolescente teria jogado álcool e ateado fogo nela. Ele foi apreendido em flagrante pelo crime.
Por mensagem de áudio, uma mulher, que se identificou como irmã de Roberta, falou ao G1 que a família não pretendia se manifestar sobre a morte por enquanto.
O prefeito do Recife, João Campos (PSB), a codeputada estadual do mandato coletivo Juntas Robeyoncé Lima (PSOL) e a vereadora Liana Cirne (PT), entre outros, lamentaram a morte de Roberta.
Cirurgias
A vítima passou por várias cirurgias ao longo de 15 dias de internação. Primeiro, teve o braço esquerdo amputado, em 26 de junho. Mesmo com os cuidados, teve necrose progressiva e, quatro dias após a primeira intervenção, os médicos removeram parte do braço direito, preservando apenas um pedaço acima do cotovelo.
No dia 5 de julho, a situação de Roberta voltou a se agravar. Levada para a unidade de Terapia Intensiva (UTI), a vítima teve que ser intubada.
O médico Marcos Barretto, chefe da Unidade de Queimados do HR, afirmou, durante o tratamento, que Roberta teve queimaduras na cabeça, além de lesões graves em várias partes do corpo.
Em nota, o governo de Pernambuco afirmou que prestava "respeito e solidariedade à família, às amigas e aos amigos de Roberta e a toda a comunidade LGBT".
"Roberta era assistida pelos programas Atitude e recebia o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Neste momento a família recebe apoio e amparo da Coordenadoria LGBT do Estado e da Secretaria de Assistência Social do município do Recife", informou em nota.
O adolescente de 17 anos apreendido pela Polícia Civil por ato infracional análogo a tentativa de homicídio qualificado contra Roberta cumpre internação provisória na Funase, uma instituição para jovens infratores, onde aguarda sentença.
Repercussão
No Twitter, o prefeito de Recife, João Campos (PSB), afirmou que lamenta profundamente a morte de Roberta: "É intolerável qualquer vida perdida para o ódio e para o preconceito", declarou.
Campos disse, ainda, que a prefeitura pretende dar o nome de Roberta à Casa de Acolhida LGBTI+. "Vamos avançar com novas ações para ampliar o atendimento a esta população", escreveu.
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A codeputada do mandato coletivo Juntas Robeyoncé Lima (PSOL), que acompanhou Roberta no hospital, também escreveu em seu Twitter sobre o falecimento de Roberta. "Atacada de maneira cruel, ela foi mais uma vítima da transfeminicídio em Pernambuco", disse. Robeyoncé pediu que as pessoas mandem "boas energias para que ela tenha uma passagem serena".
A deputada estadual Teresa Leitão (PT) disse, em suas redes sociais, que Roberta foi " mais uma vítima do preconceito em Pernambuco".
A vereadora da capital pernambucana Liana Cirne (PT) postou em seu Instagram votos de solidariedade à família da vítima. "Toda nossa solidariedade à família de Roberta, que deixa mãe e irmã". Cirne lembrou, ainda, que no último mês quatro casos de violência contra mulheres trans foram registrados no estado. "Não é possível tolerar tanto ódio!", escreveu.
A vereadora Dani Portela (PSOL) também se manfestou nas redes sociais: "Infelizmente acabamos de saber que Roberta não resistiu e morreu, após uma luta de 15 dias no hospital. Que sociedade é essa que faz adolescentes matarem mulheres trans queimadas vivas? Não podemos nos calar diante isso, temos que ir até o fim!".
A pedagoga, assessora parlamentar e travesti Ana Flor cobrou pelas redes sociais políticas públicas efetivas para que casos como o de Roberta não se repitam. "Toda minha solidariedade aos familiares e amigos. Não tenho muitas palavras", escreveu.
A deputada estadual de São Paulo Erica Malunguinho (PSOL) também lamentou a morte pelas redes sociais. "Roberta foi vítima de transfeminicídio. Pensar políticas públicas para conter essas violências é uma demanda histórica do movimento de travestis e transexuais no Brasil. A política institucional precisa ouvir o que os movimentos estão dizendo". declarou.
Violência contra mulheres trans
O crime contra Roberta gerou grande repercussão. Além do caso dela, foram registrados três assassinatos de mulheres trans no último mês em Pernambuco. Em todo o país, 80 pessoas transexuais foram mortas no primeiro semestre deste ano, segundo relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
No dia 28 de junho, Dia do Orgulho LGBTQIA+, manifestantes pediram o fim da violência contra as mulheres trans. No ato, no Centro do Recife, eles lembraram o caso de Roberta.
No município de Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste pernambucano, uma mulher trans identificada como Fabiana da Silva Lucas, de 30 anos, foi morta com vários golpes de faca às margens da PE-160. O crime aconteceu na última quarta-feira (7).
Na segunda-feira (5), uma cabeleireira de 37 anos identificada como Crismilly Pérola foi assassinada com um tiro na comunidade Beira Rio, na Várzea, Zona Oeste do Recife. Na data, a família afirmou que acredita que o crime foi motivado por transfobia.
A mãe dela, Maria Elizabeth da Silva, contou que a filha sofria preconceito e discriminação e que, há cerca de um mês, ela havia sido hospitalizada porque fraturou um dos braços em uma briga. Pelo que relataram para Maria Elizabeth, o motivo também seria transfobia.
Em junho, uma mulher trans foi encontrada morta dentro de casa, no Ipsep, na Zona Sul do Recife. A vítima foi identificada como Kalyndra Selva Guedes Nogueira da Hora, de 26 anos. O companheiro dela foi preso como suspeito de cometer o crime.
Pronunciamento do governo
Os casos de violência motivaram o governador Paulo Câmara (PSB) a se pronunciar na quarta-feira (7). De acordo com ele, o governo criou um grupo de secretarias para discutir com a sociedade ações para oferecer mais oportunidades ao público LGBTQIA+.
O Comitê de Prevenção e Enfrentamento às Violências LGBTfóbica, como foi chamado, é composto pelas secretarias estaduais da Mulher; de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude; de Defesa Social; de Justiça e Direitos Humanos; de Saúde e de Educação.
Segundo o estado, por meio de um documento que deve ser entregue pelo Levante Feminista com o apoio de outras instituições do movimento LGBTQIA+ em Pernambuco, o governo deve articular ações de assistência, formação, qualificação, conscientização, empregabilidade, geração de oportunidades e campanhas institucionais para combater a intolerância, o preconceito e a marginalização.