Em abril de 2018, parentes de Hélio Baptista Lyra, coronel já falecido, procuraram o Exército para se desfazer de três armas que haviam feito parte do acervo do oficial. Eram duas pistolas — uma delas brasonada, de propriedade das Forças Armadas — e um revólver, que foram entregues no Serviço de Fiscalização de Produtos Controlados (SFPC) da 1ª Região Militar, no Palácio Duque de Caxias, Centro do Rio. Pela legislação brasileira, a arma brasonada deveria voltar para o arsenal do Exército e as demais seriam destruídas. As três armas, entretanto, alimentaram um esquema de desvio de armamento do Exército.
Uma investigação conjunta do Ministério Público Militar (MPM) e do Exército descobriu que centenas de armas de propriedade de colecionadores — vários já falecidos — que seriam destruídas ou incorporadas ao arsenal das Forças Armadas foram desviadas para clubes de tiro, empresas de segurança e outros colecionadores. As duas pistolas e o revólver do acervo do coronel Lyra, por exemplo, foram "requentados" e revendidos para um tenente-coronel do Exército e dois atiradores esportivos. De acordo com o MPM, armas apreendidas com criminosos cuja destruição pelo Exército havia sido determinada pela Justiça também fazem parte do esquema.
Na última sexta-feira, a investigação avançou: por ordem da Justiça Militar, 182 armas foram apreendidas em endereços relacionados a 13 pessoas — entre colecionadores, militares e civis — no Rio, no Espírito Santo e no Paraná. Desse total, 101 foram desviadas no esquema; as 81 restantes estavam em situação irregular.
Os alvos dos mandados de busca e apreensão são os receptadores das armas "requentadas" pelo esquema — entre elas, as pistolas e o revólver do coronel Hélio Lyra.
Na sede da Guardian Segurança Vigilância, na Zona Oeste do Rio, que pertence ao major da reserva da PM Álvaro Fernandes Sabino, onde foram apreendidas 83 armas. Já na Confederação de Tiro e Caça do Brasil, no Centro do Rio, foram apreendidas peças de fuzis.
A operação foi um desdobramento da prisão, em abril do ano passado, do ex-chefe do SFPC, tenente-coronel Alexandre de Almeida. O militar, identificado como principal o responsável pelo esquema, era a mais importante autoridade do setor no controle de armas que circulam no Rio de Janeiro e Espírito Santo. Foi Almeida quem recebeu as armas da família do coronel Lyra, dias antes de ser preso. Segundo o inquérito, o oficial registrava as armas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), o cadastro das armas registradas no Exército, em nome de seus novos donos ilegalmente. Um mês após a prisão, a Justiça Militar determinou sua soltura. A investigação segue em andamento.