Com aumento da demanda, em algumas UPAs foram instaladas tendas para acelerar a triagem
Gabriel de Paiva / Agência O Globo
Com aumento da demanda, em algumas UPAs foram instaladas tendas para acelerar a triagem

Nesta quarta-feira (22), três pacientes da clínica da família de Manguinhos, com suspeitas de Covid-19 , começaram a apresentar falta de ar. A necessidade de intubação fez com que a equipe determinasse o encaminhamento para unidades de emergência, mas, o sistema da rede municipal de saúde acusava a falta de leitos.

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A saída foi bater na porta da UPA de Manguinhos, que fica próxima à clínica, e negociar que pelo menos duas fossem recebidas. Para a outra paciente, médicos precisaram instalar um equipamento de oxigênio para que ela aguentasse até a liberação de uma vaga, o que aconteceu quase uma hora após o horário de fechamento da clínica.

No meio de todo o drama, pacientes e profissionais ainda precisaram passar minutos deitados no chão por causa de um tiroteio nas redondezas. O episódio ilustra o cenário de dificuldades e improvisos dentro de um sistema colapsado em meio à pandemia.

"Ficamos quatro horas aguardando uma vaga, enquanto elas estavam sem oxigênio suficiente. Uma paciente possui lupus e está com todo quadro de Coronavírus. Conseguimos que a UPA Manguinhos a entubasse. Outra é idosa, tem 85 anos, com sintomas de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e foi transferida para a UPA Costa Barros às 19h, sendo que a clínica só funciona normalmente até às 18h. Mandaram uma ambulância básica, então um médico nosso precisou acompanhar. Estamos com dificuldade enorme de levar para qualquer lugar, porque todos leitos estão ocupados. Ficamos quatro horas aguardando uma resposta. Se não bastasse, ainda fomos surpreendidos por um tiroteio aqui em frente. A situação é de caos total", desabafou uma médica da clínica da família de Manguinhos, que pediu para não se identificar.

Se os leitos de hospitais destinados exlusivamente para o tratamento de Coronavírus no Rio já estão saturados, o mesmo acontece nas UPAs. Com isso, não são poucos os problemas nas transferências de pacientes das clínicas da família, que cuidam da atenção primária de milhares de pessoas com comorbidades, como diabetes e hipertensão, para UPAs ou Centros de Emergência Regional ( CER ).

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A central de regulação da prefeitura, explica a médica, tem operado direcionando pacientes das casas e clínicas para UPAs e CERs, e pacientes destes para hospitais, como Ronaldo Gazzolla.

"Precisamos que os hospitais de campanha sejam abertos e que as pessoas compreendam a gravidade da situação e colaborem realmente para a redução da velocidade de transmissão, ficando em casa. É muita gente doente ao mesmo tempo, o sistema não aguenta. Ainda estamos com tendência de piora. Antes, as ambulâncias demoravam até duas horas para chegar, hoje já é muito mais", afirmou a médica.

Problemas na triagem

Um médico que trabalha na UPA de Magalhães Bastos afirmou que, nessa semana, todos tiveram a noção de que "a pandemia chegou".

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"Semana passada começou a ser mais notável, mas nessa semana lotou tudo. Só abre vaga quando morre alguém ou um paciente vai para o Ronaldo Gazolla. Agora a pandemia chegou. Deveria haver excepcionalmente nesse período algum médico na triagem ou autonomia para a enfermagem fazer coisas como passar protocolos de tratamentos e realizar alguns procedimentos para ajudar", disse o médico.

Atualmente, nas triagens, profissionais anotam as queixas e fazem aferições de: saturação, glicose, pressão arterial e temperatura. Pacientes, então, são classificados como azul, verde, amarelo ou vermelho, em ordem crescente de gravidade. Já os suspeitos de Coronavírus , que são a maioria, ficam segregados. Mas o médico acredita que, dentre eles, poderia haver separação para agilizar o atendimento.

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"Todo mundo com sintoma gripal já colocam como suspeito de Covid , na dúvida. Poderiam colocar uma nova divisão entre esses pacientes, entre quem tem queixa respiratória grave ou leve. Dessa forma, quem não precisa de internação é liberado com mais agilidade e o sistema funciona melhor", afirmou.

Com o aumento da demanda, a Secretaria estadual de Saúde ( SES ) vem colocando tendas nas áreas externas de UPAs, para agilizar as triagens. Até o momento, as tendas já funcionam nas unidades Tijuca, Copacabana, Botafogo, Marechal Hermes, Campo Grande II, Bangu, Fonseca, Penha, Campo Grande II, Caxias I, Itaboraí, Sarapuí, Nova Iguaçu II, Engenho Novo, Cabuçu, Jacarepaguá, São Gonçalo I e II. As próximas tendas serão implantadas nas UPAs Maré, Magé e Ilha do Governador. Já a rede municipal ainda não colocou tendas.

Presidente do Sindicato dos Médicos do Rio , Alexandre Telles entende que colocar mais médicos na triagem seria bom para agilizar o atendimento, mas ele lembra que há dificuldades de oferta de profissionais nesse momento: "há milhares de profissionais afastados por causa do contágio. Eles poderiam ajudar nos diagnósticos na triagem, mas estamos sofrendo com escassez de médicos".

Ambulâncias enviadas para unidades sem leitos

Outro problema relacionado à falta de leitos da rede é a nova gestão das ambulâncias do SAMU, antes de responsabilidade do Corpo de Bombeiros. Recentemente, o governo estadual contratou a Organização Social (O.S.) OZZ para fazer essa gestão, num contrato que é investigado pelo Tribunal de Contas do Estado. Segundo um médico , muitas ambulâncias estão sendo enviadas para unidades sem leitos, por falta de controle no sistema.

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"A O.S. não está sabendo trabalhar bem dentro da plataforma de regulação. Assim, muitas vezes a ambulância é enviada para uma UPA que não tem vaga , então o paciente fica até três horas dentro do veículo esperando a internação. É surreal", lamentou o médico.

Procurada, a SES respondeu que detectou aumento nos atendimentos da UPA, mas não deu números. A Secretaria municipal de Saúde também não deu dados sobre as ocupações nas UPAs .

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