O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF) , disse que agentes governamentais devem usar as redes sociais com "moderação e responsabilidade", notadamente o presidente da República, devendo suas manifestações refletir a obrigação pública que diz respeito ao cargo "do qual está investido". O ministro, no entanto, não citou nominalmente o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) .
A manifestação de Lewandowski foi feita no voto que proferiu no julgamento da ação apresentada pelo PSOL que questiona a postura de Bolsonaro perante a pandemia de covid-19. O partido aponta lesão a preceitos fundamentais em declarações e manifestações públicas feitas pelo presidente da República e alguns membros do Congresso Nacional.
Em seu voto, o ministro afirma que as redes sociais tendem a amplificar o fenômeno da polarização de grupo, mas representam um importante fórum de debates públicos, dos quais, com uma frequência cada vez maior, participam autoridades governamentais, cujos pronunciamentos adquirem caráter oficial, sobretudo quando tratam de temas de interesse da coletividade, ainda que seus emissores não tenham essa intenção.
"Por isso, é preciso que todos aqueles que delas participem ajam com moderação e responsabilidade, notadamente o Presidente da República, devendo suas manifestações refletir, sempre e necessariamente, o elevado múnus público do qual está investido", disse.
A relatora da ação é a ministra Rosa Weber, que rejeitou o pedido feito pelo partido por considerar que o Judiciário não pode "estabelecer uma curatela judicial sobre o Presidente da República", "instaurando-se espécie anômala de controle de constitucionalidade jurisdicional preventivo".
Para Rosa, "transgressões pontuais e episódicas aos princípios e regras constitucionais, praticadas por autoridades públicas ou particulares, ocorrem com frequência no universo fenomênico e exigem a intervenção judicial reparadora, em caráter preventivo ou repressivo, diante de situações concretas e específicas".
Lewandowski, porém, discordou da ministra por entender que nada impede que as determinações estabelecidas pelo Judiciário, sobretudo em um caso como o analisado, "se projetem para o futuro, de modo a garantir o cumprimento de suas decisões ao longo de um período mais dilatado".
"Nesse sentido, penso que embora a responsabilização a posteriori tenha um papel importante, ela não consiste – e não pode consistir – na única forma de prevenção contra a erosão democrática que pode ser provocada pelo discurso das autoridades governamentais", disse o ministro.
Segundo o ministro, "o discurso dos agentes governamentais – e, por discurso, refiro-me a todo e qualquer pronunciamento externado na esfera pública, de ampla e fácil disseminação – não pode ser infenso à análise judicial de sua conformação com os princípios que regem nossa Carta Política".
"Numa república plural e democrática como se pretende seja a nossa, não é difícil perceber que todo e qualquer pronunciamento governamental, sobretudo quando amplificado pela utilização maciça de redes sociais, pode estimular reflexões, comportamentos, e até mesmo influenciar atitudes de violência e desrespeito aos princípios fundamentais invocados na inicial, por conta do fenômeno que a Economia Comportamental nomina de “polarização de grupo”, ressaltou.
A ação está sendo julgada pelo plenário virtual do STF, quando não há o debate entre os ministros, até o próximo dia 18. Até agora, votaram apenas três ministros: Rosa Weber, que foi acompanhada por Alexandre de Moraes, e Lewandowski.
Na petição, apresentada em abril de 2020, o partido defende que “se a garantia do direito à saúde é dever do Estado, cumpre primariamente ao Chefe de Estado, ou seja, ao Presidente da República, providenciar a tomada das medidas necessárias para sua regulamentação, fiscalização e controle”.
Entre os fatos mencionados na ADPF estão a manifestação antidemocrática do dia 20 de abril, em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, e a reunião ministerial do dia 22 de abril, na qual Bolsonaro declarou-se enfaticamente competente para intervir na Polícia Federal. Na mesma ocasião o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, declarou que todos os Ministros do STF deveriam ser postos na cadeia, tratando-os como “vagabundos”.