Prédio da Procuradoria-Geral da República
Reprodução
Prédio da Procuradoria-Geral da República

A P roposta de Emenda à Constituição (PEC) que enfraquece o poder do Ministério Público foi retirada de pauta da Câmara dos Deputados em sessão desta quinta-feira . A decisão foi tomada pelo vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), após o plenário indicar que não havia apoio suficiente para a aprovação da medida.

O texto altera as regras do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar a conduta dos promotores e procuradores de todo o Brasil.

Segundo o relatório apresentado pelo deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), o Congresso Nacional seria o único órgão responsável por indicar o corregedor do CNMP. Além disso, o texto permite que o conselho anule atos de investigação, abrindo brecha para uma interferência direta na atuação dos promotores e procuradores, o que não existe atualmente.

A proposta provocou revolta entre promotores e procuradores, pois é vista dentro do Ministério Público como uma tentativa de retaliação e de interferência externa no órgão.

Na tarde desta quinta-feira, o autor da original da proposta, Paulo Teixeira (PT-SP), ainda tentou costurar entendimento para que houvesse um recuo em cinco pontos da PEC. Anunciou que o PT apresentaria destaques para retirar trechos considerados sensíveis pelo Ministério Público.

O esforço, porém, não deu certo. Durante a votação de um requerimento de retirada de pauta, os parlamentares perceberam que a PEC não teria votos suficientes para aprovação do mérito.

O requerimento foi rejeitado por placar de 216 votos não e 197 sim, ou seja, venceu a continuidade da votação. O placar, porém, foi considerado um indicador de apoio reduzido ao texto, que seria apreciado em seguida. Para que um alteração à Constituição seja aprovada, são necessários pelo menos 308 votos. A favor da continuidade da sessão havia 92 votos a menos do que seria necessário para o mérito. Marcelo Ramos, então, tomou para si a decisão de retirar a PEC da pauta.

Entre a noite de quarta e a manhã de quinta-feira, procuradores pressionaram para que a PEC fosse engavetada.

Pelas regras atuais, o corregedor nacional é escolhido em votação feita pelo CNMP dentre os membros do Ministério Público que integram o conselho. A mudança deixaria essa escolha para o Congresso Nacional, que precisa indicar um membro do Ministério Público com antiguidade na carreira para a função de corregedor.

A PEC foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no último mês de maio. Depois, a Câmara formou uma comissão especial, mas o prazo das discussões se esgotou. Com isso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu levar o projeto para votação no plenário.

Na quarta-feira, Paulo Magalhães apresentou um novo texto que foi visto como ainda mais prejudicial à independência do Ministério Público, por estabelecer a escolha do corregedor unicamente pelo Congresso e a possibilidade de interferência em investigações.

Além disso, a PEC aumenta a composição do CNMP das atuais 14 cadeiras para 15 e diminui de quatro para três os conselheiros escolhidos pelo Ministério Público da União (instituição composta por Ministério Público Federal, Ministério Público do Distrito Federal e Ministério Público do Trabalho). Com isso, o Congresso aumenta a influência externa na instituição.

Perguntado sobre as alterações apresentadas, o relator afirmou que o Congresso precisa ter um papel maior na fiscalização.

"O sistema republicano tem que ter fiscais, não é verdade? Durante a audiência pública houve uma pergunta de um advogado: “quem fiscaliza os fiscais?”. E eu fiquei sem responder. Então, é natural que haja fiscalização numa República", disse Magalhães.

Nas redes sociais, o procurador Hélio Telho afirmou que a instituição "está prestes a acabar" e disse que a proposta "acaba com a independência funcional". "Conselheiros indicados politicamente poderão trancar inquéritos instaurados pelo Ministério Público, desobrigar o cumprimento de suas requisições, desautorizar recomendações, retirar ações judiciais, inclusive criminais, mudar pareceres e desistir de recursos", escreveu.

A procuradora regional Janice Ascari, que coordenou a força-tarefa da Lava-Jato de São Paulo, escreveu que a PEC "desnatura o CNMP, o MP e órgãos internos do MPF, tornando-os, definitivamente, órgãos comandados por políticos, de fora da carreira". O procurador regional Wellington Saraiva disse que a proposta "permitirá influência política diretamente na atividade dos membros e membras do Ministério Público".

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) também escreveu: "O parecer da PEC 5/2021, caso aprovado, enfraquecerá o MP de forma irreversível, por meio da politização do CNMP e da relativização da independência funcional, com a possibilidade de interferência indireta do Congresso em investigações".

A PEC também faz uma alteração no Conselho Superior do Ministério Público Federal, órgão deliberativo sobre a gestão da instituição, que impede que o procurador-geral da República tenha minoria, situação que ocorre hoje com Augusto Aras. O conselho tem feito cobranças e tentado discutir a abertura de pedidos de investigação contra Aras.

Pela proposta, dois terços das cadeiras do Conselho Superior seriam escolhidas pelo próprio procurador-geral da República. Com isso, o chefe da instituição dificilmente perderia a maioria do colegiado, que hoje tem sido um dos principais focos internos de atritos para Aras. Não está claro se essa mudança já valeria imediatamente para a atual gestão dele.

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!