O plenário da Câmara dos Deputados deve analisar nesta quinta-feira uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altera as regras do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar a conduta dos promotores e procuradores de todo o Brasil. Segundo a proposta, o Congresso Nacional seria o único órgão responsável por indicar o corregedor do CNMP.
A proposta provocou revolta entre promotores e procuradores, pois é vista dentro do Ministério Público como uma tentativa de retaliação e de interferência externa no órgão. Na noite de ontem, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), tentou colocar o tema para votação. No entanto, diante de protestos de parlamentares, a discussão foi adiada para hoje.
Pelas regras atuais, o corregedor nacional é escolhido em votação feita pelo CNMP dentre os membros do Ministério Público que integram o conselho. A mudança deixaria essa escolha para o Congresso Nacional, que precisa indicar um membro do Ministério Público com antiguidade na carreira para a função de corregedor.
Além disso, o texto da proposta permite que o conselho anule atos de investigação, abrindo brecha para uma interferência direta na atuação dos promotores e procuradores, o que não existe atualmente. Nas redes sociais, procuradores do MPF fizeram duras críticas às mudanças.
A PEC, apresentada pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP), foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no último mês de maio. Depois, a Câmara formou uma comissão especial, mas o prazo das discussões se esgotou. Com isso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu levar o projeto para votação no plenário.
Nesta quarta-feira, o deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), relator da PEC, apresentou um novo texto que foi visto como ainda mais prejudicial à independência do Ministério Público, por estabelecer a escolha do corregedor unicamente pelo Congresso e a possibilidade de interferência em investigações.
Além disso, a PEC aumenta a composição do CNMP das atuais 14 cadeiras para 15 e diminui de quatro para três os conselheiros escolhidos pelo Ministério Público da União (instituição composta por Ministério Público Federal, Ministério Público do Distrito Federal e Ministério Público do Trabalho). Com isso, o Congresso aumenta a influência externa na instituição.
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Perguntado sobre as alterações apresentadas nesta quarta-feira, o relator da proposta, Paulo Magalhães (PSD-BA), afirmou que o Congresso precisa ter um papel maior na fiscalização.
"O sistema republicano tem que ter fiscais, não é verdade? Durante a audiência pública houve uma pergunta de um advogado: “quem fiscaliza os fiscais?”. E eu fiquei sem responder. Então, é natural que haja fiscalização numa República", disse.
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Magalhães afirma que conversou com integrantes do Ministério Público sobre o assunto, mas que não tratou do mérito do seu texto.
Procuradores do Ministério Público criticaram a proposta. Nas redes sociais, o procurador Hélio Telho afirmou que a instituição "está prestes a acabar" e disse que a proposta "acaba com a independência funcional". "Conselheiros indicados politicamente poderão trancar inquéritos instaurados pelo Ministério Público, desobrigar o cumprimento de suas requisições, desautorizar recomendações, retirar ações judiciais, inclusive criminais, mudar pareceres e desistir de recursos", escreveu.
A procuradora regional Janice Ascari, que coordenou a força-tarefa da Lava-Jato de São Paulo, escreveu que a PEC "desnatura o CNMP, o MP e órgãos internos do MPF, tornando-os, definitivamente, órgãos comandados por políticos, de fora da carreira". O procurador regional Wellington Saraiva disse que a proposta "permitirá influência política diretamente na atividade dos membros e membras do Ministério Público".
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) também escreveu: "O parecer da PEC 5/2021, caso aprovado, enfraquecerá o MP de forma irreversível, por meio da politização do CNMP e da relativização da independência funcional, com a possibilidade de interferência indireta do Congresso em investigações".
A PEC também faz uma alteração no Conselho Superior do Ministério Público Federal, órgão deliberativo sobre a gestão da instituição, que impede que o procurador-geral da República tenha minoria, situação que ocorre hoje com Augusto Aras. O conselho tem feito cobranças e tentado discutir a abertura de pedidos de investigação contra Aras.
Pela proposta, dois terços das cadeiras do Conselho Superior seriam escolhidas pelo próprio procurador-geral da República. Com isso, o chefe da instituição dificilmente perderia a maioria do colegiado, que hoje tem sido um dos principais focos internos de atritos para Aras. Não está claro se essa mudança já valeria imediatamente para a atual gestão dele.