Integrantes da direita na Câmara dos Deputados estão incomodados com a onda de críticas contra o Congresso Nacional que tomou conta das redes sociais na última semana. Durante reunião de líderes desta terça-feira (8), parlamentares acusaram o Planalto de usar as plataformas digitais para incitar os ataques virtuais e pressionaram membros do governo por explicações sobre as publicações que fizeram termos como “Congresso da Mamata” ficar entre os assuntos mais comentados por três dias seguidos, entre terça (1º) e quinta-feira (3).
“Fica aqui o nosso desagravo. Queremos resposta. Esperamos que realmente tenha o esclarecimento dos fatos”, destacou o líder da oposição na Câmara, deputado Zucco (PL).
A onda de críticas tomou conta das redes sociais após o Congresso derrubar o decreto presidencial que aumentou o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF) . Uma semana depois da decisão do parlamento, bombaram nas plataformas digitais publicações demonstrando o descontentamento da população em relação às emendas parlamentares .
Os internautas apontaram que, por um lado, o Congresso derrubou uma medida do governo que visava aumentar a arrecadação para cumprir a meta fiscal sob a alegação de que o Executivo estaria gastando mais do que arrecada e colocando a conta para o povo pagar, mas, por outro, pressiona pela liberação das emendas, que, muitas vezes, são usadas para fins corruptos.
Diante disso, termos como “Congresso da Mamata”, “ Hugo não se importa ” e “ Agora é a vez do Povo ” ficaram no topo da lista dos assuntos mais comentados do X (Ex-Twitter) , com mais de 4 milhões de menções.
Muitos dos ataques foram dirigidos diretamente ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos). A hashtag “Hugo Motta traidor” foi uma das mais comentadas na semana passada , o que fez dobrar o número de pesquisas pelo nome do deputado no Google e o interesse dos internautas pela trajetória do parlamentar.
O termo faz referência aos rumores que surgiram, após a derrubada do decreto do IOF, sobre Motta ter descumprido um acordo que havia sido firmado com o Ministério da Fazenda. Cerca de duas semanas antes do presidente da Câmara anunciar a inclusão na pauta de votação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que anulou os efeitos da medida do governo, líderes no Congresso e o Executivo se reuniram e, juntos, costuraram uma saída para o aumento do tributo.
Três dias depois dessa reunião, o governo publicou um novo decreto reduzindo as alíquotas do IOF . Com essa nova medida, o Executivo acreditava ter pacificado o tema, mas Motta reviveu o debate semanas depois e pegou a Fazenda de surpresa. Por isso, surgiram nas redes sociais críticas à postura do presidente da Casa Baixa.
Para a oposição, essa movimentação na internet foi provocada pelo governo. “Cerca de 80% deste parlamento decidiu [derrubar o IOF], eles judicializaram e, o pior, atacaram de forma covarde usando as redes sociais”, apontou Zucco.
Segundo relatos de líderes após a reunião desta terça-feira, Motta também está incomodado com a situação. Apesar de não ter verbalizado a insatisfação, parlamentares afirmaram que era nítida a irritação do presidente da Casa diante dos ataques e do debate que foi levantado durante o encontro desta manhã. A jornalistas, deputados alegaram que ficou claro que “Motta está mordido”.
Explicações oficiais
A oposição quer explicações oficiais sobre as estratégias de comunicação do governo. Para isso, o deputado Zucco protocolou um requerimento para a convocação do ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Sidônio Palmeira, com o objetivo de prestar esclarecimentos relativos às ações da pasta.
A audiência pública com o ministro será realizada na quarta-feira (9), na Comissão de Comunicação (CCOM) da Câmara. “Amanhã convocamos o ministro, inclusive com requerimento de minha autoria, e falaremos com o ministro mais importante desse governo, que é o Sidônio, para eles explicar os gastos ou possíveis gastos públicos com o ataque que foi feito à Câmara Federal”, ressaltou Zucco.
“Parte desses ataques teria sido financiado com recursos públicos, impulsionamentos nas redes sociais, de vídeos de inteligência artificial, colocando o povo brasileiro contra o Congresso Nacional de uma forma fortuita, de uma forma que preocupa todos os líderes partidários”, alegou o deputado Marcel Van Hattem (Novo), líder do partido Novo na Câmara.
O deputado relatou que, durante a reunião, os líderes partidários mencionaram “de uma forma bastante enfática” o tema e prestaram solidariedade ao presidente Motta.
“Não é esse tipo de acirramento de ânimos que a gente quer ver. Ainda mais nesse período, em que a população brasileira exige do Congresso Nacional medidas que contenham a criminalidade; contenham a expansão fiscal que se está, nesse momento, verificando no país; e que se corte gastos sem aumentar impostos, que foi um recado muito claro do Congresso Nacional quando derrubou o decreto do IOF”, disse Van Hattem.
Governo nega ter patrocinado ataques
O deputado José Guimarães (PT), líder do governo na Câmara, falou sobre a discussão que surgiu ao final da reunião de líderes. O parlamentar negou que o Executivo tenha gastado dinheiro público para promover os ataques nas redes sociais e garantiu que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é contra “qualquer estratégia de responsabilizar o Congresso”.
“O governo não patrocinou, não encaminhou nenhum gasto oficial sobre essas fake news. Quem introduziu as fake news do Brasil foram eles [oposição], não fomos nós. Nós fomos vítimas disso”, argumentou Guimarães.
O líder apontou que a direita política brasileira “fez escola” em relação a ataques virtuais e agora reclama que está sendo vítima de um movimento que usou, por muito tempo, em benefício próprio. “Quem fez escola nesse país e que montou a maior rede de ilegalidade, que atingiu a democracia e todos nós, foi a direita, liderada pelo ex-presidente [Bolsonaro]. Portanto, nós dissemos para eles, que eles têm pouca autoridade para, agora, se sentirem vítimas desse tipo de coisa”, disse o deputado.
“Nós deixamos claro que tanto eu como a ministra Gleisi [Hoffmann - Relações Institucionais], e outros parlamentares se manifestaram também, somos contrários a qualquer estratégia de responsabilizar o Congresso. A nossa guerra não é contra o Congresso, a nossa guerra é buscar o equilíbrio. Por isso que o governo recorreu ao Supremo”, acrescentou Guimarães.
O deputado ressaltou que o governo acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para decidir sobre a constitucionalidade da decisão do Congresso de derrubar o decreto do IOF de forma legítima, usando das prerrogativas legais que são colocadas à disposição do Executivo para manter o sistema de contrapeso. “Foi legítima a posição do governo de recorrer, está dentro do escopo que é governar o Brasil. Era só que faltava, querer impedir o presidente de exercer a sua plenitude no exercício da Presidência da República”, afirmou o petista.
“Nós não vamos permitir ataques ao Congresso. Tem uma disputa na sociedade. Nós achamos que o andar de cima tem que pagar imposto, não é só o andar de baixo, e essa é a disputa que está na sociedade, não tem nada contra o Congresso”, alegou Guimarães.
Regulação da redes
Com essa movimentação nas redes sociais, que atingiu a oposição, o tema da regulamentação das redes sociais voltou a entrar no radar . O líder do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara, Lindbergh Farias (PT), colocou essa pauta na mesa após integrantes do Partido Liberal (PL) reclamarem, durante a reunião desta manhã, dos ataques das últimas semanas.
“Eu acho que é cada vez mais urgente a gente pautar o tema da regulação das redes sociais. Porque agora surgem vídeos a cada minuto, contra todos. E esse é um tema que é fundamental para votar, porque sinceramente eu não sei como vai ser o próximo processo eleitoral. E não adianta alguém achar que é contra um, vai virar generalizado. É uma explosão que está acontecendo”, defendeu Farias.
O deputado avaliou que essa onda de críticas dos últimos dias colocou “mais responsabilidade no parlamento para avançar nesse debate da regulação” das redes sociais. Apesar disso, o presidente Motta não falou sobre pautar o tema, nem fez qualquer sinalização de concordância com a volta dessa discussão.
A oposição também se recusou a apoiar a pauta, apesar de reclamar sobre os ataques sofridos nos últimos dias. Para o deputado Zucco, o incômodo com as críticas não justifica retomar o debate sobre a regulamentação. "Não é questão de regulamentação das redes. Existe a injúria, a calúnia, a difamação que se desponta. A questão específica é o uso do gasto público", disse o líder.
Farias apontou contradição nessa cobrança por explicações, feita pela oposição. “Os deputados do PL fizeram uma fala sobre sobre as redes sociais. Eu acho interessante. Essa turma toda, que montou o gabinete do ódio, não tem autoridade para falar sobre isso”, avaliou. “Eu acho engraçado quando dizem: ‘nós contra eles’. Gente, nós estamos há 500 anos com eles contra nós”, completou
“Eles [oposição] falam todo dia da pauta. Qual é a pauta deles? Desvincular salário mínimo da previdência, mexer com os pisos de saúde e educação. Aí a gente não pode falar que os bilionários têm que pagar, que as bets têm que pagar, que quem ganha 10 milhões de reais e paga imposto de renda de menos 2% tem que pagar. Eu acho muito interessante isso. É como se tivéssemos que ficar calados”, opinou Farias.