
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou, nesta segunda-feira (02), que o governo avalia novas alterações no Imposto sobre Operações Financeiras ( IOF), e que outras correções no sistema tributário financeiro também estão em estudo.
Segundo ele, o impasse sobre o reajuste pode ser resolvido nesta semana. A declaração foi dada a jornalistas na portaria do ministério, em Brasília, após o Congresso Nacional anunciar o prazo de 10 dias para o governo apresentar alternativas para o aumento do imposto.
"Nós sabemos o que precisa ser feito. Precisamos tomar uma decisão política do que será feito. E, diante do que eu ouvi, acredito que nessa semana a gente possa resolver e melhorar a regulação do IOF” , afirmou Haddad. Segundo o ministro, os ajustes no IOF precisam ser analisados em conjunto com reformas estruturais.
Para Haddad, não é mais possível dissociar medidas de curto prazo de mudanças definitivas nas regras fiscais do país. "Quer alterar o curto prazo? Altera o longo prazo junto, porque aí você faz uma combinação que dá para o investidor, para o cidadão trabalhador, o horizonte das regras do jogo daqui para frente, com previsibilidade, com transparência, e com discussão sobre a justiça", analisou.
Apesar da sinalização de que haverá revisão, Haddad negou a possibilidade de negociar pontos isolados do decreto que alterou o IOF, como a taxação sobre operações de risco sacado. Ele também descartou mudanças na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) como solução adequada para o atual desafio fiscal.
Segundo Haddad, o governo pretende promover ajustes que corrijam distorções no sistema tributário ligado ao setor financeiro, o que permitiria uma reavaliação mais ampla do decreto do IOF. Ao ser questionado sobre quais medidas estão sendo consideradas, o ministro preferiu não antecipar detalhes, mas reforçou que a CSLL não deve ser incluída entre as alternativas em análise no momento.
"A CSLL tem um problema que é a noventena. Já estamos no meio do ano, ela não é o melhor remédio para o problema que estamos enfrentando agora" , disse.
O ministro ainda reforçou a intenção de retomar a agenda de reformas estruturantes, como forma de garantir a sustentabilidade fiscal. Segundo Haddad, em 2023, medidas como o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária foram responsáveis por melhorar a avaliação do Brasil junto a agências de risco e investidores internacionais. Agora, ele quer retomar esse caminho.
"Eu tenho duas alternativas. Uma é, com uma medida regulatória, resolver o problema de forma paliativa para cumprir as metas do ano. A outra, que interessa mais à Fazenda, é voltar para as reformas estruturais", afirmou. "Em 2023, várias foram feitas, nós ganhamos nota com as agências de risco, ganhamos prestígio, os investimentos voltaram", acrescentou.
Entre as propostas já encaminhadas pelo governo ao Congresso estão a limitação dos supersalários no serviço público e as mudanças nas aposentadorias dos militares. Haddad citou essas iniciativas como pré-condições importantes para discutir uma reforma administrativa mais ampla.
"Já mandamos algumas dimensões da reforma administrativa que, na minha opinião, deveriam preceder toda e qualquer votação: a questão dos supersalários e o acordo que foi feito com as forças [armadas] em torno de aposentadoria" , opinou. "Daríamos um bom exemplo para começar a discutir esse tema começando pelo topo do serviço público" , completou.
Alternativa ao aumento do IOF
Nos próximos dias, o Ministério da Fazenda deve apresentar ao presidente Lula e aos chefes do Congresso um pacote com alternativas ao aumento do IOF. A expectativa do ministro é que, caso haja consenso, a solução encontrada seja mais sustentável e menos paliativa.
"É definir qual vai ser o recorte que vai ser feito dessas medidas e apresentar aos três presidentes. Se nós chegarmos a uma boa definição, 70, 80, 90% daquilo que for discutido. Se houver uma compreensão de que é hora de avançar, eu acredito que vamos dar uma perspectiva muito mais sustentável" , afirmou Haddad.
Com espaço limitado para ampliar os gastos discricionários nos próximos anos, o governo precisa encontrar soluções que permitam cumprir as metas fiscais sem comprometer áreas essenciais como investimentos, ciência, fiscalização e programas sociais. Para Haddad, isso só será possível com responsabilidade e visão de longo prazo.
"Eu prefiro soluções estruturais, como qualquer ministro da Fazenda. Se o Congresso está dizendo que também prefere, vou eu dizer o contrário? É muito melhor para o país soluções estruturais. O que a Fazenda não pode é perder a iniciativa. Se deixarmos a acomodação falar mais alto, não vamos avançar."
Equilíbrio fiscal
O aumento do IOF gerou uma discussão entre o Congresso e o Planalto. Ao anunciar a medida, o ministro Haddad comentou que ela é necessária para garantir o cumprimento da meta fiscal, já que o parlamento não aprovou medidas suficientes para compensar os benefícios fiscais que foram concedidos recentemente, como a desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia e municípios de pequeno porte.
Por outro lado, o Congresso acusa o governo de gastar mais do que arrecada e aumentar impostos para compensar os gastos desenfreados. “O governo não pode gastar sem freio e depois passar o volante para o Congresso segurar” , disse o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), na semana passada.
“O Estado não gera riqueza, consome. E quem paga essa conta é a sociedade. A Câmara tem sido parceira do Brasil ajudando a aprovar os bons projetos que chegam do Executivo e assim continuaremos. Mas quem gasta mais do que arrecada não é vítima, é autor”, alfinetou Motta.
A fala do deputado surgiu um dia depois de Haddad comentar sobre a dificuldade imposta pelo Congresso em relação ao ajuste fiscal. “Hoje nós vivemos um quase parlamentarismo. Quem dá a última palavra sobre tudo isso é o Congresso” , disse Haddad.
Haddad afirmou que o Congresso não aprovou medidas suficientes para cobrir a perda de arrecadação provocada pela prorrogação da desoneração da folha. Além disso, o parlamento decidiu manter o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), que desonerou R$ 15 bilhões ao setor. Segundo o ministro, esses benefícios fiscais custaram R$ 45 bilhões aos cofres públicos.
“Se tivesse entrado no caixa, teríamos um superávit de R$ 35 bilhões no ano passado. Mas não foi o Executivo que produziu essa renúncia” , falou. “Precisamos voltar a discutir determinadas regras, determinados procedimentos para ajudar no cumprimento da meta. Precisamos de parceria para conseguir endereçar, até por meio de aprovação de lei. 80% das vezes, nós [do governo] conseguimos achar um caminho. Em outros momentos, nós não achamos” , acrescentou Haddad.
Recuo
A possibilidade de recuo e o estudo de alternativas já havia sido comentada pelo secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan. Após uma reunião com membros da Federação Brasileira de Bancos ( Febraban) para discutir os impactos causados pelo aumento do IOF, principalmente para pequenos e médios empresários, o número 02 de Haddad afirmou que o governo está fazendo uma “avaliação cuidadosa e célere do que é melhor para o país” .
O governo recuou parcialmente da medida de reajuste do imposto. No mesmo dia em que o decreto foi anunciado, a Fazenda decidiu revogar o trecho do aumento do imposto para os investimentos no exterior. O receio era de que parecesse uma forma de controlar a saída de recursos do Brasil, o que poderia gerar desconfiança no mercado e prejudicar a imagem do país entre investidores.
Prazo de 10 dias
O pronunciamento de Haddad ocorreu cerca de quatro dias depois do acordo articulado com os presidentes da Câmara, Hugo Motta(Republicanos), e do Senado, Davi Alcolumbre(União Brasil). Em reunião com os parlamentares e a participação de outros integrantes do Congresso Nacional, ficou acordado um prazo de 10 dias para a Fazenda apresentar alternativas à medida que aumentou o IOF.
De acordo com Motta, o ministro Haddad apresentou os motivos que levaram ao aumento do imposto e, depois do debate, os parlamentares entenderam que a medida mais prudente no momento seria dar tempo ao governo para estudar formas de revogar essa decisão e, ainda assim, manter o equilíbrio fiscal.
Caso a Fazenda não apresente alternativas, os parlamentares decidiram que será pautado o Projeto que susta efeitos pode ser pautado o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que susta os efeitos da medida que aumentou o IOF.
Por que o governo aumentou o IOF?
O reajuste na alíquota do IOF para algumas operações é uma alternativa para tentar conter o déficit fiscal. Segundo o Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, enviado pelo Executivo ao Congresso, o crescimento de gastos obrigatórios e a frustração de receitas por causa da falta de compensação da desoneração da folha de pagamento fizeram a estimativa total de déficit primário para 2025 aumentar de R$ 29,5 bilhões para R$ 97 bilhões.
O que mais impactou o déficit, segundo o governo, foi a perda causada pelas despesas como o Benefício de Prestação Continuada( BPC) e a queda de R$ 67,5 bilhões na arrecadação, sendo mais de R$ 20 bilhões causados pela desoneração da folha.
Diante desse cenário, segundo os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet(Planejamento), o contingenciamento e o aumento do IOF são necessários para garantir o cumprimento da meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias e respeitar o novo arcabouço fiscal, que limita o crescimento real das despesas a 2,5% ao ano.
Com a decisão, o IOF vai variar conforme o tipo de operação e o perfil do contribuinte. Nas compras internacionais com cartão de crédito, débito e pré-pago, por exemplo, a alíquota subiu para 3,5%. A mesma taxa passa a valer para a compra de moeda estrangeira em espécie. A justificativa do governo é unificar as cobranças e evitar distorções entre operações de mesma natureza.
Também houve mudança para quem investe em previdência privada. Planos do tipo VGBL com aportes mensais acima de R$ 50 mil passam a pagar 5% de IOF. Segundo o governo, a ideia é evitar que pessoas com altíssima renda usem esse tipo de aplicação como forma de pagar menos imposto, o que acaba distorcendo o objetivo original do benefício previdenciário.
Já para empresas, a alíquota na contratação de empréstimos subiu de 0,38% para 0,95%, e a cobrança diária passou de 0,0041% para 0,0082%, com teto anual de 3,95%. No caso do Simples Nacional, o teto subiu de 0,88% para 1,95% ao ano.
Apesar das mudanças, algumas operações continuam isentas do imposto ou com alíquota zero. É o caso de financiamentos habitacionais, crédito estudantil, empréstimos ligados à exportação, programas de geração de emprego e renda, entre outros.