Ailton Silva , preso na carceragem de Curitiba da Polícia Federal em 2014, acusa a Polícia Federal de forçá-lo a mudar o depoimento sobre um grampo que ele diz ter sido colocado ilegalmente nas celas dos presos da Operação Lava Jato . Os áudios foram divulgados nesta segunda-feira (5) pela CNN Brasil.
Segundo Ailton, as celas ficaram vazias antes dos presos da Lava Jato chegarem. Neste período, um agente da PF subiu na cela, implantou o grampo e depois os presidiários da operação foram levados para os locais.
“Quando eu estava na carceragem da Polícia Federal, no mês de março de 2014, foi deflagrada a Operação Lava Jato. E até então a gente não sabia o motivo, porque lá não tinha informação da televisão, de rádio, de nada. E as celas foram todas esvaziadas e os presos que estavam lá foram todos transferidos para outros presídios”, explicou.
“Ai esvaziaram todas as celas, checara, todas as celas, isso os agentes federais e a gente ficou no pátio, no fundo das celas, que tinha acesso para um portão. E aí eu vi a movimentação de três agentes que estavam lá. Os carcereiros, que na verdade eram guardas municipais e dois policiais federais. E eles subiram as grades para tentar acessar as celas por cima. E aí, eles não conseguiram porque tinha um cadeado e tiveram que quebrar o cadeado”, acrescentou.
“Demorou um tempinho. E eu fiquei num lugar que eles não estavam me vendo, e eu fiquei observando o que estava acontecendo. Curioso, né? Aí eu vi que eles quebraram o cadeado quando conseguiram subir, e eu vi que um dos policiais federais subiu alguma coisa de volume na mão. Cuidando daquilo lá para não cair. Ele demorou um tempo lá em cima, tipo uns 10 minutinhos, depois voltou, e já voltou sem esse material”, completou.
Ailton Silva, que é médico veterinário, contou para Alberto Youssef que um agente da PF colocou grampo ilegal para captar conversas do doleiro com outros presidiários.
A Polícia Federal soube da informação, abriu uma sindicância e chamou o veterinário para prestar esclarecimentos. Ele confirmou que viu o policial federal implantando o grampo nas celas, no entanto, em um segundo depoimento, mudou de posição. Segundo Ailton, a mudança aconteceu após se sentir ameaçado pela turma que trabalhava em conjunto com a Operação Lava Jato de Curitiba.
“Aí, passado alguns dias, já tinha naquele mesmo dia, começou a chegar os presos da Lava Jato. E passado alguns dias eu criei um vínculo com pessoal, depois de uns dois dias já estava conversando com eles ali que a gente ficava solto. As celas, umas grudadas com as outras, e eu peguei conversando com o Youssef. Eu falei: ‘Youssef vocês tão ficando acordados à noite. Não ouve barulho de nada e aí dá para ouvir tudo o que vocês estão falando lá. Só que um policial federal subiu e colocou uma escuta na cela de cima de vocês ali, não sei qual cela que está, mas tá em cima de alguma cela de vocês’”, relembrou.
Ailton relatou que as celas foram fechadas e, no dia seguinte, soube que Youssef encontrou a escuta. No mesmo dia, o doleiro recebeu a visita do advogado e apresentou o aparelho. Naquela semana, várias reportagens saíram na imprensa, de acordo com o veterinário.
Com a repercussão, Silva foi chamado para depor. “O delegado perguntou para mim e eu confirmei tudo conforme foi. E perguntou para mim se eu tinha como confirmar o policial federal que tinha subido na cela e colocado a escuta. E eu não sabia o nome na verdade. Aí ele perguntou para mim se poderia confirmar por foto. Falei: ‘Se eu ver a foto, confirmo’. Aí ele demorou um tempo, com outro policial federal, foi lá e montou tipo assim, um croqui, um organograma de fotos de Polícia Federal, mas sem nome, sem nada, só fotos, fotos bem nítidas, ele colocou 12 fotos se não me engano, várias fotos”, relatou.
“E eu, como vi o policial federal, sem dúvida nenhuma eu reconheci o policial federal que colocou a escuta. Na hora que eu identifiquei o policial, o próprio delegado falou: ‘É ele mesmo’. Confirmou com exatidão: ‘É ele mesmo’. E ainda sorriu, com a maior vontade de ferrar os caras. Mandou eu assinar lá, assinei o depoimento, assinei o reconhecimento do policial e aí me mando embora já”, continuou.
Preso se sentiu ameaçado
Dias após o depoimento, Ailton foi chamado novamente para prestar novos esclarecimentos sobre o assunto. Ele relatou que conversou com outro delegado, que o questionou se realmente tinha certeza sobre o policial federal que colocou a escuta na cela. “Confirmei com exatidão”, reforçou.
Só que, segundo o veterinário, ele foi pegou de surpresa, porque precisou prestar um novo depoimento. “O delegado começou a conversar comigo e pediu para eu confirmar o que eu tinha falado, e eu confirmei. Aí esse delegado pediu para todos desligarem o telefone, desligarem o computador, desligarem tudo que era eletrônico e que estava dentro da sala. E aí ele falou assim: ‘Ailton, vamos conversar. Primeiro você está usando de má-fé, está tendo algum engano, porque o policial federal que você acusou, ele estava de folga no dia em que você falou que ele colocou a escuta’. Então ali eu já vi que estava a sacanagem”, denunciou.
“Aí eles pegaram e falaram assim: ‘Você quer mesmo prejudicar a Polícia Federal? Prejudicar o nome da Polícia Federal? Você sabe a encrenca que você está entrando? Você sabe o que pode causar isso para você’. Foi uma ameaça. Eu me senti ameaçado na hora e vi que estava ferrado”, explicou.
Ailton ainda contou que um homem entrou na sala e o delegado afirmou ser o advogado do Yousseff. “Não sei se era ou não”, pontuou. O suposto advogado disse que o doleiro teria feito um acordo com a PF para encerrar a sindicância.
"Eu entendi a ameaça e falei assim: 'Não, eu não sei do que o senhor está falando, eu não dei depoimento, eu não fiz reconhecimento, eu não fiz nada'. Ele falou: 'Tá bom então, então você vai falar da seguinte forma que eu vou te dizer agora'. E ele pediu para eu falar o seguinte: que eu estava numa situação muito difícil, que eu estava alterado psicologicamente, psiquiatricamente, que a cabeça toda… que eu não vi nada, que eu me enganei sobre a identificação do policial que colocou a escuta, e assim foi feito. Conforme ele terminou de falar, ele mandou ligar os computadores, o escrivão ligou, ligaram os celulares, ligaram tudo e eu dei o depoimento dessa forma", concluiu.
Escute os áudios abaixo:
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