Em meio à desarticulação da terceira via e enfrentando isolamento no PSDB, o ex-governador João Doria tem um único caminho para viabilizar sua candidatura à Presidência: aplacar sua alta rejeição nas pesquisas de intenção de voto. Embora reconheça as dificuldades, a equipe do tucano aposta nas inserções de propaganda partidária, que começaram na semana passada na TV, para reverter sua imagem de “marqueteiro” e “almofadinha”. A estratégia combina humor, ao assumir de vez o apelido de “calça apertada”, e mostra realizações de sua gestão em São Paulo.
Essa receita foi apresentada numa inserção de 30 segundos na sexta-feira. A peça brinca com a camisa “justinha” de Doria e com a famosa calça. Depois, emenda que as peças são usadas por aquele que “trouxe a vacina” Coronavac contra a Covid-19 para o Brasil. No final, Doria propõe “comida no prato, emprego e dinheiro no bolso”.
Para se aproximar do eleitorado e afastar a pecha de empresário rico, a equipe do marqueteiro Lula Guimarães resgatou o nome “João”, que remete à campanha vitoriosa para a prefeitura paulistana em 2016. Guimarães argumenta que pesquisas qualitativas mostram que a alta rejeição de Doria é possível de ser quebrada porque está ligada à sua imagem pessoal, enquanto que a população reconhece suas realizações.
"É muito mais fácil diminuir a rejeição de um candidato que é acusado por usar calça apertada do que um que foi contra a vida e a vacina ou outro que se envolveu em denúncia de corrupção".
Em outra frente, Doria quer convencer o eleitor de que as opções não se restringem apenas a Lula ou a Bolsonaro. O tucano busca se apresentar como alternativa a eleitores que podem optar pelo voto útil para evitar qualquer um dos lados da polarização. Em sabatina do UOL e “Folha de S.Paulo”, Doria admitiu abrir diálogo com Lula em nome da preservação da democracia e da derrota de Bolsonaro.
Lula Guimarães disse que as declarações de Doria referem-se à defesa da democracia. Segundo ele, apesar das divergências entre Doria e Lula, não há como negar que o petista é um democrata e que Bolsonaro atenta diariamente contra as instituições.
"Os resultados dos governos Lula, Dilma e Bolsonaro foram ruins pro Brasil. Neste aspecto a diferença entre eles é nenhuma. A única diferença entre os dois é especificamente em relação à democracia, que o Bolsonaro tenta a todo tempo derrubar", afirma.
No PSDB, a avaliação é a de que Doria errou a dose na comunicação e provocou uma “superexposição” de sua imagem, com mais de 130 coletivas no Palácio dos Bandeirantes, sendo muitas delas com agendas negativas, como fechamento de comércio e estatísticas de mortes pelo novo coronavírus.
Antes do Carnaval, Doria conseguiu uma momentânea vitória interna na resistência que sofre no partido quando o ex-governador gaúcho Eduardo Leite recuou publicamente da posição de contestar o resultado das prévias tucanas e seguir se apresentando como pré-candidato do PSDB ao Planalto. Sua aceitação, porém, ainda é baixa na sigla. Na atual bancada de 22 deputados federais tucanos, nenhum deles pode ser considerado hoje um entusiasta da candidatura Doria, como informou o colunista Lauro Jardim.
Ainda assim, o pré-candidato tem dito a interlocutores que vai levar a sua candidatura até o final e que está disposto inclusive a judicializar — na sigla há um grupo que ainda tenta viabilizar o nome de Eduardo Leite.
Se o cenário dentro do partido é complicado, nos últimos dias as possibilidades de aliança com outras siglas também se tornaram mais incertas. A negociação com MDB e União Brasil para um nome único se complicou desde que o União sinalizou a intenção de se descolar do grupo. Além disso, aliados da senadora Simone Tebet (MDB-MS), que tentam frear o bolsonarismo no partido com sua candidatura, acreditam que Doria tem pouca viabilidade e são mais simpáticos ao nome de Leite.
Com isso, o entorno de Doria já começa a avaliar a possibilidade de uma candidatura única pelo PSDB. No partido, há quem não descarte uma composição com Leite, embora o entorno do gaúcho negue. Leite tocava uma campanha a presidente paralela, mas tem dado sinais de que vai focar suas atenções na reeleição do seu estado. Na sexta-feira, ele abriu mão de seis inserções no rádio na TV que o PSDB havia oferecido. Ele disse que sua intenção é para que Doria tenha mais espaço para crescer nas pesquisas. No partido, porém, o gesto é lido com ironia, e opositores afirmam que o gaúcho aposta que, quanto mais espaço o paulista tiver, menos viabilidade ele terá.
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