A participação do presidente Jair Bolsonaro em atos antidemocráticos no feriado de 7 de setembro dificultou ainda mais a indicação do ex-advogado-geral da União André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF) . Parlamentares passaram a falar abertamente na substituição do nome do ex-AGU pelo do procurador-geral da República, Augusto Aras.
A indicação de André Mendonça está parada há tempo recorde no Senado, como mostrou o GLOBO, outro indicativo de que a nomeação pode ter subido no telhado. São mais de 40 dias de espera desde que seu nome foi oficializado pelo presidente Jair Bolsonaro para que o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (DEM-AP), marque sua sabatina. Entre os atuais ocupantes do STF, a que mais aguardou até a apreciação da CCJ foi Rosa Weber: 29 dias.
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O AGU é visto como um nome que agrada o nicho do setor evangélico, mas não tem trânsito o suficiente entre políticos. Aras, por outro lado, é elogiado por senadores do PP, PL e MDB, por exemplo, por seu traquejo com o Congresso Nacional. Senadores devem aproveitar o clima de insatisfação generalizada com o Palácio do Planalto para pressionar pela troca.
Em conversa com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), nesta quarta-feira, Alcolumbre disse se sentir mais 'respaldado' para continuar sem pautar a indicação de Mendonça. Antes do feriado, havia expectativa de que a indicação começasse a andar nas próximas duas semanas. Agora, o presidente da CCJ está mais confortável para barrar o processo.
Na avaliação de Alcolumbre, as ações de Bolsonaro contes o STF já estariam fazendo com que senadores antes favoráveis a Mendonça agora revejam o voto.
Nos últimos meses, apesar das dificuldades de Mendonça no Senado, chamou a atenção de parlamentares que o ex-advogado-Geral parecia ter sido abandonado pelo Palácio do Planalto. Alguns senadores chegaram a especular que Bolsonaro fez a indicação apenas para agradar o eleitorado evangélico, mas sem a intenção de concretizar a ação de fato. Se não der certo, a culpa recairá sobre o Senado.
Aliados de Davi Alcolumbre chegaram a dizer que Mendonça é "candidato de si mesmo". Pessoas próximas ao advogado, no entanto, consideram o movimento positivo por ajudar a descolar Mendonça da imagem de Bolsonaro, que tem problemas na interlocução com a Casa, e com isso conquistar votos da oposição e dos independentes.
De acordo com relatos de senadores ao GLOBO, o próprio Alcolumbre fez um movimento direto em defesa de Augusto Aras há cerca de dois meses, quando passou a ir de gabinete em gabinete pedindo votos ao procurador-geral. Diante da movimentação, Bolsonaro enviou a recondução de Aras ao Senado para tentar conter a iniciativa. Agora, o nome do chefe da PGR ganhou novo fôlego.
Um senador ligado ao Planalto, que faz parte de um partido do centrão, procurou Bolsonaro para insistir que Aras seria melhor candidato do que Mendonça, mas ouviu que o presidente não estava disposto a ceder neste caso.
Além de Aras, outra alternativa cogitada pelos senadores seria o nome do ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Os outros nomes apresentam alguns problemas para Bolsonaro. No caso de Aras, ele deixaria a vaga aberta na PGR e precisaria ser substituído, o que também preocupa alguns parlamentares. Já Martins é ligado à cúpula do MDB e a adversários do presidente, como o senador Renan Calheiros (MDB-AL), o que provoca mais resistência.
Governistas também admitem dificuldades para Mendonça. Vice-líder do governo, o senador Marcos Rogério (DEM-RO), concorda que é melhor esperar o momento de turbulência passar.
"Acho que, neste momento, o melhor é esperar baixar a fervura. Os líderes devem conversar mais e buscar entendimento. Quem está à frente dos Poderes, a par das divergências, precisa buscar entendimento e tomar decisões que não extrapolem o limite constitucional que se impõe a todos. Mas isso deve valer para os chefes de todos os Poderes, não apenas para um deles", disse Marcos Rogério.
Para pessoas próximas a Mendonça, ele ainda tem chances de viabilizar a indicação se Bolsonaro resistir à pressão dos senadores. A aposta é que o Senado não poderá resistir por muito mais tempo, já que o STF está com um ministro a menos.