Na manhã desta quinta-feira, 02, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou um projeto aprovado no Congresso que revoga a Lei de Segurança Nacional, criada na ditadura militar para punir opositores do regime. Apesar disso, ele fez 5 vetos importantes, dentre eles ao ponto que tipificava o crime de "comunicação enganosa em massa", para punição de pessoas que disseminam fake news.
Bolsonaro é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito das fake news por disseminar informações falsas a respeito de urnas eletrônicas e poderia ser atingido pela mudança da lei. A publicação ocorre às vésperas das manifestações previstas para o 7 de setembro.
A justificativa do veto, antecipada pelo GLOBO, é de que "contrariaria o interesse público por não deixar claro qual conduta seria objeto da criminalização, se a conduta daquele que gerou a notícia ou daquele que a compartilhou (mesmo sem intenção de massificar)".
Durante a semana, militares recomendaram ao presidente o veto ao artigo que revogava a Lei de Segurança Nacional. Entretanto, por pressão política, o presidente optou por sancionar esse trecho do projeto. Caso contrário, o governo federal poderia sofrer mais uma derrota simbólica.
O prazo para que Bolsonaro tomasse sua decisão sobre a lei, que também estabelece crimes contra o Estado Democrático de Direito, entre os quais o golpe de estado ou impedimento das eleições, terminava na última quarta-feira, 1º.
O Congresso Nacional ainda pode derrubar os vetos do presidente se houver maioria em ambas as Casas, Senado e Câmara. Existe um prazo de trinta dias para que o Congresso decida.
Bolsonaro também vetou o trecho que possibilitaria a partidos políticos com representação no Congresso entrarem com ações privadas contra suspeitos de cometerem os crimes na LSN. O governo alega, no texto em estudo, que "a proposição contrariaria interesse público por não se mostrar razoável para o equilíbrio e a pacificação das forças políticas no Estado Democrático de Direito".
Levantamento do GLOBO mostrou que mais da metade dos inquéritos policiais instaurados com dispositivos da LSN, entre 2010 e 2021, ocorreram no governo Bolsonaro, justamente contra adversários. A lei de é de 1983, fim da ditadura militar. Por outro lado, a legislação também serviu de base para o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinar a prisão em flagrante do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), após ameaças aos integrantes da Corte.
Outro veto está no trecho que estabelece como crime o "atentado a direito de manifestação", em que seria punido quem impedisse o "livre e pacífico" exercício de manifestação. "Ante a dificuldade de caracterizar, a priori e no momento da ação operacional, o que viria a ser manifestação pacífica, gerar-se-ia insegurança jurídica", alega a justificativa do governo para os vetos.
Aprovada no Senado no dia 10 de agosto, o projeto que extingue a LSN define crimes contra a democracia, como golpe de estado, impedir ou perturbar a realização das eleições, incitação de crime às Forças Armadas, comunicação enganosa em massa, atentado contra a soberania e espionagem, entre outros pontos.
A aprovação no Senado ocorreu no mesmo dia em que houve um desfile militar na Esplanada do Ministérios. Agora, os vetos parciais de Bolsonaro devem ocorrer dias antes das manifestações pró-governo, convocadas para o dia 7 de setembro em meio à crise entre os Poderes. A militância bolsonarista promete ir às ruas com críticas ao STF.
A revogação da LSN foi defendida no Congresso por ser associada ao período do regime militar. Em seu discurso durante a votação, o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), disse que era hora de o Brasil "sepultar" a lei que era um "resquício da ditadura e que não condiz mais com a nossa Constituição".
OS VETOS
1. Fake news em massa
O presidente vetou o artigo que criava o crime de "comunicação enganosa em massa", definido pela promoção ou financiamento da disseminação por aplicativos de mensagem de mentiras capazes de comprometer a lisura das eleições.
Entre as justificativas do veto, o presidente afirmou que a lei não deixava claro se quem seria punido seria quem gerou a notícia ou quem a compartilhou. Bolsonaro também questionou se haveria um "tribunal da verdade" para definir o que viria a ser entendido por inverídico a ponto de constituir um crime.
2. Ações de partidos politicos
O artigo previa a possibilidade de que partidos políticos ingressassem na Justiça contra os crimes previstos na lei se o Ministério Público não agisse no prazo estabelecido.
Segundo a justificativa do presidente, o artigo levaria o debate da esfera política para a esfera jurídico-penal, e multiplicaria iniciativas na Justiça criminal por partidos em detrimento do "adequado crivo do Ministério Público".
3. Atentado ao direito de manifestação
O projeto de lei também criava o crime de atentado ao direito de manifestação, definido como o impedimento, mediante violência ou grave ameaça, do exercício de manifestação.
De acordo com o presidente, o artigo foi vetado porque seria difícil caracterizar anteriormente ou durante a ação, o que seria uma manifestação pacífica. Isso, afirmou a Presidência, geraria "grave insegurança jurídica para os agentes das forças de segurança responsáveis pela manutenção da ordem" em casos em que manifestações inicialmente pacíficas resultassem em ações violentas, com necessária repressão do Estado.
4. Pena maior para militares
A lei previa ainda que, caso um dos crimes previstos na lei tivesse sido cometido por militares, a pena seria acrescida de 50% da prevista. De acordo com a Presidência, o trecho foi vetado porque violaria o princípio da proporcionalidade, colocando o militar "em situação mais gravosa que a de outros agentes estatais".
O presidente em sua justificativa do veto também indicou que isso seria uma "tentativa de impedir as manifestações de pensamento emanadas de grupos mais conservadores."
5. Pena maior para funcionarios públicos ou com arma de fogo
O projeto também definia que a pena prevista seria aumentada em 1/3 caso o crime fosse realizado com grave violência ou emprego de arma de fogo, e também em casos em que o condenado fosse funcionário público.
O argumento apresentado pelo governo foi similar ao dos militares. Segundo o presidente, a condição de funcionário público não poderia justificar uma pena maior.