Após a derrota na Câmara da proposta do voto impresso e seguidos ataques de Jair Bolsonaro (sem partido) ao sistema de votação , o governo agora quer buscar diálogo com o Judiciário para construir uma alternativa para o que chamam de auditoria das urnas eletrônicas. O principal argumento para acenar com uma trégua é que o resultado no plenário indica que o debate sobre o sistema de votação não está pacificado. O Planalto não conseguiu os 308 votos necessários para a aprovação da mudança, mas somou 229 votos favoráveis contra 218 parlamentares que rejeitaram a proposta.
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O sistema de votação tem sido alvo frequente de contestação do presidente, que, sem provas, coloca em xeque a confiabilidade dos resultados das eleições. Bolsonaro também tem feito ataques pessoais ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, o que agravou a crise institucional com o Judiciário. Enquanto ministros do Executivo se movimentam para reverter a indisposição, magistrados são céticos na construção de um acordo.
Bastidores:
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Na próxima semana, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, tem um encontro marcado com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). A audiência, como mostrou O Globo, foi pedida por Nogueira na semana passada. Na ocasião, a crise entre Executivo e Judiciário já estava instalada, mas ainda não tinha atingido seu ápice, quando Fux cancelou a reunião entre os Poderes em resposta aos ataques de Bolsonaro.
Ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, disse não ter dúvidas de que será possível buscar uma contagem pública dos votos, defendido pelo presidente.
"Sinceramente, eu acho que o Parlamento exerceu o seu direito. Isso é do jogo. Não tenho nenhuma dúvida de que nós vamos construir alternativas juntos, inclusive ao próprio TSE em um diálogo para buscar condição de ter apuração pública dos votos. Acho que isso é super importante para dar tranquilidade a todos e evitaria muitos problemas no presente e no futuro. Eu trato com naturalidade o que aconteceu e, por ora, vamos buscar outro caminho, de entendimento", disse Onyx ao Globo.
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As declarações de Bolsonaro, no entanto, seguem sendo um empecilho. Na manhã desta quarta-feira, menos de 12 horas do voto impresso ser derrotado na Câmara, o presidente Jair Bolsonaro voltou a levantar suspeitas sobre a “lisura das eleições.”
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"Estou feliz com o Parlamento brasileiro. Não tivemos 308 votos, mas (foi) 229 a 218 (votos), se não me engano. 10, 11 (votos) de diferença, pouca coisa. Mas é uma demonstração que esse pessoal votou de forma consciente e deu um grande recado ao Brasil. Eles não acreditam na lisura das eleições", disse Bolsonaro, em conversa com apoiadores no Palácio da Alvorada.
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Interlocutores da Corte ouvidos pelo Globo afirmam que a ordem no TSE foi de evitar comemorações ou declarações, e que o momento é o de buscar mecanismos para aumentar ainda mais a transparência do sistema de votação — ou até resgatar a confiança de quem passou a duvidar das urnas eletrônicas.
Nos bastidores do TSE, já havia a ideia de que, uma vez encerrado o debate na Câmara e com os ânimos arrefecidos, o tribunal deverá, aos poucos, dar início a estudos para viabilizar novas medidas de transparência sobre segurança. Uma delas é o aumento do número de urnas que passará pelos testes de integridade, que são realizados no dia da votação oficial, por meio de amostragem, para demonstrar publicamente o funcionamento dos equipamentos.
Relator do texto e aliado de Bolsonaro, o deputado Filipe Barros (PSL-PR), que antes do início da votação, já admitia a derrota na Câmara, disse ter se surpreendido com o resultado, o que mostra que o assunto ganhou as ruas e não está encerrado. Ele, no entanto, disse que os testes de integridades do TSE não são suficientes.
"Esse assunto não tem como estar morto ou ter sido enterrado. Ouvi que estavam tentando construir um caminho do meio, uma espécie de aumentar a porcentagem das urnas, em que é feita a famosa votação paralela, o teste de integridade. Fico feliz caso o TSE tome esse decisão, mas todos os especialistas que ouvimos na comissão especial são categóricos em afirmar que a metodologia do teste é ineficaz. Acho que é bacana, mas na prática não resolve o problema", disse Filipe Barros.
O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), disse que o assunto está encerrado na casa, mas avalia que o resultado da votação reforçou o discurso de Bolsonaro.
"Deram ao presidente um discurso agregador. Ele vai ficar nessa onda e vai juntando gente atrás dele. A opinião estava favorável ao voto impresso, mas eles (disse apontado ao STF) acham que podem tudo lá. Na estratégia política, o discurso para o presidente é bom", disse Barros, ao deixar o Planalto nesta quarta-feira.