Com celeridade de tramitação criticada por especialistas, a PEC da reforma política deve ser votada amanhã pelo plenário da Câmara, segundo afirmou ontem o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). O relatório da deputada Renata Abreu (Podemos-SP), aprovado na segunda-feira em comissão especial, prevê a adoção do distritão nas eleições de 2022 e também abre a possibilidade de volta das coligações proporcionais, que desde o ano passado haviam deixado de fazer parte do processo eleitoral.
Por ser uma Proposta de Emenda à Constituição, o texto precisa de 308 votos entre os 513 deputados para avançar ao Senado. Há a expectativa de um acordo no plenário para escolha ou do distritão, ou das coligações proporcionais. No distritão, seriam eleitos os candidatos a deputado federal e estadual mais votados em cada estado, mesmo que o partido não atinja o quociente eleitoral. Com as coligações proporcionais, duas ou mais siglas podem somar seus votos para atingir o quociente e, assim, ocupar melhores posições no cálculo de divisão de cadeiras.
Para o cientista político Magno Karl, enquanto a última reforma eleitoral, de 2017, teve o objetivo de favorecer a governabilidade e fortalecer os partidos a longo prazo ao extinguir as coligações e também introduzir cláusulas de desempenho, o projeto atual é uma “colcha de retalhos” desenhada para atender “objetivos de curto prazo” de grupos no poder. As primeiras versões do relatório de Renata Abreu previam a transição do distritão para um sistema distrital misto a partir de 2024, mas o trecho foi suprimido em acordo para acelerar a ida do texto ao plenário, o que também incluiu as coligações.
O especialista avalia que a celeridade na Câmara já antecipa dificuldades na tramitação no Senado, que teria de liberar o texto para sanção presidencial até outubro para valer nas eleições de 2022, e também atende a uma busca por projeção política de Lira como aliado do governo Jair Bolsonaro.
"Lira tem o objetivo de entregar o maior número possível de reformas. Por isso, tenta limpar logo da agenda da Câmara as PECs da reforma política e também a do voto impresso, sem deixar de acenar como aliado do governo", afirmou Karl, que é diretor-executivo do Livres, participante da campanha “Freio na reforma”, encabeçada por entidades como o ITS Rio e a ONG Transparência Partidária.
Concentração de poder
Enquanto a adoção do distritão ganhou apoio de partidos do centrão na Câmara, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já declarou que a proposta tende a ser derrubada na Casa. Já a PEC do voto impresso foi defendida pela base bolsonarista no Congresso e nas redes.
A cientista política Hannah Maruci, professora da UFRJ, avalia que o distritão é um dos pontos mais problemáticos da reforma política por favorecer o personalismo e induzir que partidos privilegiem candidatos que já têm maior visibilidade em cargos eletivos, dificultando a renovação e a diversidade de representação. Para a especialista, mais do que o conteúdo, a forma acelerada como a reforma vem avançando na Câmara também é preocupante.
"Considerando as PECs do distritão, do voto impresso e o projeto do novo código eleitoral, estamos tendo a maior reforma política e eleitoral desde a redemocratização, e não está sendo feita de forma legítima. É um processo a toque de caixa para trazer, em diversos âmbitos, concentração de recursos e de poder", criticou.
O texto da reforma política também prevê o “voto preferencial”, que acaba com o segundo turno e permite que os eleitores escolham até cinco candidatos à Presidência, com redistribuição dos votos válidos até que um candidato atinja maioria absoluta. Outro ponto criticado é a atribuição de peso duplo aos votos dados a mulheres e negros para o cálculo de divisão do fundo partidário. Especialistas avaliam que o dispositivo permite a concentração de recursos em poucas candidaturas, e defendiam que o critério fosse o número de mulheres e negros eleitos.