Horas após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) comparar, nesta sexta-feira (19), as restrições dos governadores da Bahia, Rio Grande do Sul e Distrito Federal a um estado de sítio , autoridades começaram a temer que o presidente pudesse usar a mesma ferramenta para reverter as decisões tomadas localmente para conter o avanço da Covid-19 . Cogitou-se a ideia após uma conversa dele com um grupo de apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada , quando Bolsonaro disse que poderia aplicar “medidas duras” contra restrições mais severas de governos locais.
Para o professor Rubens Beçak, que dá aulas na Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) e é especializado em direito constitucional, no entanto, é muito pouco provável que Bolsonaro decida usar esse tipo de instrumento para evitar a restrição de circulação populacional determinada por governadores.
"O estado de sítio é uma alternativa para situações mais críticas, onde nós usamos meios extraordinários heterodoxos em uma situação de excepcionalidade para garantir o funcionamento da Constituição . É uma medida que valeria para o País todo e ainda precisaria passar por avaliação do Congresso, onde o presidente precisaria de maioria. Eu tenho dúvidas se ele tem essa maioria", afirma Beçak.
Na Constituição, o estado de sítio está previsto no artigo 137, que diz que, além de uma votação no Congresso , o presidente precisa consultar o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. Conforme explica Beçak, porém, esses órgãos são apenas consultivos e não teriam o poder de vetar uma decisão de Bolsonaro.
No estado de sítio, podem ser tomadas as seguintes medidas contra as pessoas: obrigação de permanência em localidade determinada; detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns; restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei; suspensão da liberdade de reunião; busca e apreensão em domicílio; intervenção nas empresas de serviços públicos; e requisição de bens.
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Embora seja uma opção que ele também ache pouco provável, o especialista diz que a alternativa mais adequada neste momento para Bolsonaro seria o estado de defesa. Mesmo assim, Beçak lembra que o dispositivo seria usado para fazer "exatamente o contrário" do objetivo que ele tem.
"Usar o estado de defesa para fazer com que a população não precise cumprir o isolamento é fazer o tiro sair pela culatra. Na situação de descontrole que nós estamos, o Bolsonaro estaria usando o estado de defesa pelas razões opostas. Isso pavimentaria, inclusive, o caminho para o terreno da responsabilização. Ele ficaria com a corda no pescoço para um impeachment ", diz o professor da USP.
De acordo com a legislação brasileira, o estado de defesa é uma medida mais branda em comparação ao estado de sítio. Nesse caso, o presidente não precisa de autorização prévia do Congresso, mas deve enviar a decisão para apreciação dentro de 24 horas.
A partir do recebimento da decisão, o Congresso tem dez dias para colocá-la em votação. É necessária a maioria absoluta para que ela continue valendo, sendo que o prazo máximo para que a decisão vigore é de 30 dias prorrogáveis por mais 30.
Em um estado de defesa, ficariam restritos os direitos de reunião, ainda que exercida no seio das associações; sigilo de correspondência; sigilo de comunicação telegráfica e telefônica; e ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública.