As eleições municipais de 2020 marcaram uma ruptura do que aconteceu em 2016 e 2018, quando os "outsiders" da política tiveram bom desempenho e os nomes mais tradicionais sofreram derrotas. Neste ano, candidatos apoiados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), como o deputado federal Celso Russomanno e o prefeito Marcelo Crivella , saíram do pleito como grandes derrotados.
Em contrapartida, o Centrão , grupo conhecido por fazer mais negociações em troca de cargos do que por afinidades ideológicas, foi considerado o grande vitorioso. A título de exemplo, DEM, PP, PSD e Republicanos foram, nessa ordem, os partidos que mais cresceram em número de prefeitos na comparação do 1º turno de 2016 e de 2020.
Não bastasse essa mudança, o 2º turno das eleições ainda teve grandes emoções, como resultados apertados, disputa acirrada entre familiares e candidato a prefeito eleito mesmo estando em internado em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com Covid-19.
Relembre os cenários que se desenharam nas principais cidades brasileiras
São Paulo
Em São Paulo, o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos) apostou todas as suas fichas na sua aproximação com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Uma das propostas do parlamentar era, inclusive, a criação de um auxílio paulistano. A medida seria implantada nos mesmo moldes do auxílio emergencial e seria viável, segundo Russomanno, pela renegociação das dívidas da capital paulista com o governo federal.
Essa aproximação com Bolsonaro, no entanto, custou caro. De acordo com as pesquisas Datafolha do 1º turno, Russomanno despencou de 33% dos votos válidos, em pesquisas feitas nos dias 5 e 6 de outubro, para 13% no último levantamento feito pelo instituto de pesquisa, nos dias 13 e 14 de novembro. A perda de fôlego se traduziu em uma queda do primeiro para o quarto lugar nas pesquisas.
No resultado oficial, o candidato de Bolsonaro ficou realmente na quarta posição, mas com um percentual de 10,5% (560,6 mil votos), ficando atrás de Bruno Covas (32,85%), Guilherme Boulos (20,24%) e Márcio França (13,64%). No 2º turno, a vitória foi para Covas, que foi eleito em 2016 como vice de João Doria (PSDB) e assumiu menos de dois anos depois após o cabeça de chapa deixar o cargo para disputar o governo do estado de São Paulo.
Rio de Janeiro
O prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), que buscava a reeleição para a Prefeitura da capital carioca, foi o candidato apoiado por Bolsonaro. Ao contrário do que ocorreu em São Paulo, porém, o representante do presidente na disputa conseguiu passar para o 2º turno.
Com altos índices de impopularidade, Crivella teve percentual de 21,9% (576,8 mil votos) no 1º turno. Ele ficou atrás de Eduardo Paes (DEM), que teve 37,01% (974,8 mil). Mas no 2º turno essa diferença aumentou. O percentual atingido por Paes foi de 64,07% (1,62 milhão de votos), enquanto Crivella teve 35,93% (913,7 votos) .
Esse distanciamento teve como origem vários posicionamentos. Paes teve o "apoio crítico" do PT de Benedita da Silva e do PSOL de Renata Souza. Além disso, o candidato derrotado Paulo Messina (MDB) recomendou voto contra Crivella, assim como o PSB.
Considerados os únicos que poderiam se aproximar do atual prefeito, o PDT, que disputou o 1º turno com a Delegada Martha Rocha , ficou neutro. Já o candidato Luiz Lima (PSL), que atraiu parte dos eleitores bolsonaristas, declarou neutralidade.
Belo Horizonte
Entre as capitais, Belo Horizonte foi a cidade que mais teve um cenário previsível desde o início da campanha. Como já era de se esperar, o vencedor foi o prefeito Alexandre Kalil (PSD), que foi reeleito para o cargo. A vitória veio com folga, com mais de 50 pontos percentuais de diferença para o segundo colocado.
Dos demais pleiteantes, nenhum teve mais de 10% dos votos válidos. Bruno Engler (PRTB), que foi o candidato por Bolsonaro, conquistou 9,95%. Ele foi seguido por João Vitor Xavier (Cidadania), com 9,22%, Áurea Carolina (PSOL), com 8,33%, Rodrigo Paiva (Novo), com 3,63%, Nilmário Miranda (PT), com 1,88%, e Luisa Barreto (PSDB), com 1,39%. Os demais candidatos tiveram menos de 1%.
Kalil foi um dos poucos eleitos em 2016 na onda da anti-política que conseguiu mais um mandato. Empresário do ramo da construção e especializado em obras de infraestrutura, ele tem 61 anos e este será seu segundo cargo público. Em 2014, o prefeito se candidatou a deputado federal por Minas Gerais pelo PSB, mas acabou não eleito.
Porto Alegre
Porto Alegre foi uma das cidades em que a esquerda via mais chances de vitória. A candidata do PCdoB, Manuela D’Ávila , até passou para o 2º turno, mas acabou derrotado por Sebastião Melo (MDB).
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A disputa pela liderança no 1º turno foi acirrada e Melo terminou a corrida com 31,01% dos votos válidos. Manuela teve 29%, fazendo a diferença entre os dois ser de apenas 13 mil votos. Já no 2º turno, Melo ficou com 54,63% dos votos válidos , ampliando sua vantagem para quase 10 pontos percentuais em relação à Manuela (45,37%).
A avaliação é a de que o ganho de fôlego do prefeito eleito foi por conta do apoio de José Fortunati (PTB), que renunciou à candidatura após uma irregularidade na candidatura de seu candidato a vice, André Cecchini. Fortunati já havia sido vereador da capital gaúcha. Em 2008, foi eleito como vice, mas assumiu a cadeira de prefeito dois anos depois após a renúncia de José Fogaça. Foi reeleito em 2012 e cumpriu mandato até 2016.
Recife
A corrida à Prefeitura da capital pernambucana foi uma disputa que ultrapassou os limites da política e virou briga de familiares de duas das linhagens mais tradicionais da cidade. Os protagonistas desse embate foram João Campos (PSB), filho do ex-governador Eduardo Campos, e Marília Arraes (PT), neta do também ex-governador Miguel Arraes, do qual Campos é bisneto. O cruzamento desses nomes faz com que os dois sejam primos.
Nas pesquisas de opinião do 1º turno, Campos e Arraes disputaram a liderança cabeça a cabeça. Ora os levantamentos mostravam um candidato na frente, ora outro. Campos saiu na frente, mas com vantagem apertada de menos de 10 mil votos à frente. Enquanto ele teve 29,17% dos votos válidos, sua adversária teve 27,95% no 1º turno.
Duas semanas depois, porém, a vitória do candidato do PSB se consolidou. Campos venceu o 2º turno com 56,27% dos votos válidos, enquanto Arraes ficou com 43,73%. Aos 27 anos, ele se tornou o candidato mais jovem a se eleger prefeito no Recife.
Goiânia
Em Goiânia, o candidato Maguito Vilela (MDB) venceu as eleições municipais do leito de um hospital . O político de 71 anos foi internado no dia 27 de outubro com Covid-19 e passou para o 2º turno com 36,03% dos votos válidos sem nem ficar sabendo, já que estava inconsciente e respirando com ajuda de aparelhos.
O candidato do MDB venceu, com 52,60% dos votos válidos, o adversário Vanderlan Cardoso (PSD), que ficou com 47,4%. Hoje Vilela segue internado, mas não está mais com a Covid-19. Após o fim do pleito, ele chegou a ter um sangramento nos pulmões, precisou ser sedado e passar por uma cirurgia.
Em agosto deste ano, o prefeito eleito perdeu duas irmãs para a Covid-19 em um intervalo de menos de 10 dias. Elas tinham 82 e 76 anos e moravam em Jataí, cidade natal do político, localizada no sudoeste de Goiás.
Belém
Margem de vitória pequena também foi registrada em Belém, capital do Pará. No final do 1º turno, a candidatura do Delegado Federal Eguchi (Patriota) era uma das apoiadas por Bolsonaro vista com maior potencial para ser bem-sucedida, mas quem vai assumir a cadeira de prefeito da capital paraense a partir de janeiro de 2021 será Edmilson Rodrigues (PSOL).
O resultado mostra que Eguchi ficou com 48,24% dos votos válidos (364 mil) no 2º turno, enquanto Rodrigues teve 51,76% (390,7 mil). A diferença entre os dois foi de pouco mais de 26 mil votos.
Apesar da derrota, em seu discurso logo após o fim do pleito Eguchi disse que poderia apoiar Edmilson Rodrigues "sem problema nenhum se ele tiver interesse em ajudar a população, melhorar a qualidade de vida". O Patriota e o PSOL são partidos com linhas ideológicas opostas no espectro político.
Rio Branco
Rio Branco foi a única capital em que um candidato apoiado pelo presidente foi eleito. Com 62,93% dos votos válidos, Tião Bocalom venceu a atual prefeita Socorro Neri (PSB), que tentava ser reconduzida ao cargo.
Bocalom, que iniciou a disputa atrás nas pesquisas de intenção de voto, quase foi eleito em primeiro turno. Ele obteve 49,58% dos votos válidos, ante 22,68% da candidata à reeleição.
Anteriormente, Bocalom disputou a capital outras duas vezes e tinha concorrido três vezes, sem sucesso, à vaga de governador do Acre. Com a idade de 67 anos, ele é professor formado em matemática e já foi vereador na cidade de Nova Olímpia, no Paraná, onde começou sua carreira política.
Fortaleza
Em Fortaleza, o Capitão Wagner, outro candidato apoiado por Bolsonaro, também amargurou derrota no 2º turno. Mas dessa vez a vantagem foi apertada. O militar teve obteve 48,31% dos votos válidos (624,8 mil). Seu concorrente, José Sarto Nogueira (PDT), conquistou 51,69% dos votos (668,6 mil).
Em suas tradicionais lives às quintas-feiras nas redes sociais, Bolsonaro chegou a manifestar apoio ao capitão fortalezense. A associação do nome do presidente, porém, fez com que a campanha do militar não decolasse. Isso não pôde ser evitado mesmo com esforços nos últimos dias de campanha para fazer um desprendimento da ligação a Bolsonaro.