O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) pediu a abertura de uma investigação para avaliar se a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está sofrendo “influências político-ideológicas” no processo de análise dos estudos da CoronaVac. Na segunda, a Anvisa suspendeu o estudo clínico da vacina e, nesta terça-feira, presidente Jair Bolsonaro, publicou uma postagem sobre o assunto dizendo que havia “ganho mais uma” .
A CoronaVac é desenvolvida em parceria pelo Instituto Butantan, do governo de São Paulo, e pelo laboratório chinês Sinovac . A vacina é uma das quatro que está no estágio 3 dos estudos clínicos, omais avançado antes da liberação ao público.
Na segunda-feira, no entanto, a Anvisa anunciou a suspensão do estudo após a ocorrência de um “evento adverso grave” . Mais tarde, foi informado que o “evento” foi a morte de um voluntário queparticipava dos testes.
Segundo as autoridades de São Paulo, a morte do voluntário não tinha relação direta com os testes aos quais o voluntário estava sendo submetido. Ainda não há estimativa sobre quando os testes serão retomados .
Em sua representação, o sub-procurador do MP-TCU Lucas Furtado pediu que o TCU abrisse uma investigação e passasse a avaliar as tomadas de decisão da Anvisa em relação à suspensão dos testes com a CoronaVac para saber se a medida foi tomada com base em critériostécnicos ou se sofreu influências político-ideológicas.
“Já não bastasse o risco de um vírus fatal no âmago da nossasociedade. Agora, ao que parece, a luta é contra outros vírus: a guerra política brasileira ”, disse Furtado em sua representação.
Furtado criticou, ainda, a postagem de Bolsonaro sobre a suspensão dos estudos: “questiono-me novamente qual seria vantajosidade para a saúde dos brasileiros ocancelamento de uma vacina que, até então, estava sendo aprovadapor todos testes. Seria vantajosidade política ? A meu ver, não existem motivos para comemorar”.
A polêmica em torno da decisão da Anvisa de suspender os testes clínicos da CoronaVac se prolongou durante toda a terça-feira. O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, reagiu dizendo em coletiva de imprensa que a decisão da Anvisa causou indignação. Segundo ele, o evento não tem relação com os testes da CoronaVac.
"Do ponto de vista clínico do caso, é impossível que haja relacionamento do evento com a vacina. Essa definição (impossível) encerra a discussão", salientou o presidente do Butantan.
O diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barras Torres, no entanto, também chamou uma entrevista coletiva e afirmou que os dados repassadas pelo Instituto Butantan foram “ insuficientes e incompletos ” e que, por isso, a agência decidiu pela suspensãodos estudos.
"As informações veiculadas ontem foram consideradas, pela área técnica, insuficientes, incompletas, para que ontem fosse possível,de posse delas, continuar permitindo o desenvolvimento vacinal ", disse o diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barras Torres.
A polêmica ganhou mais um contorno depois que o presidente do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), Jorge Venâncio, disse que o órgão avaliou as informações repassadas pelo Instituto Butantan e não via motivos para a suspensão dos estudos .
"Não pedimos suspensão de estudo, de jeito nenhum. O voluntário tomou a segunda dose da vacina 22 dias antes, não tinha nenhum problema de saúde e chegou a fazer um check-up particular, com uma bateria de exames, pouco depois. Então não tem nenhuma lógica suspender um estudo que mobiliza milhares de pessoas para uma vacina que precisamos desesperadamente", disse Venâncio.
Há semanas, o presidente Jair Bolsonaro vem criticando a CoronaVac, colocando em xeque a qualidade do produto e chegou a afirmar que, mesmo que a vacina fosse aprovada pela Anvisa , o governo federal nãoa compraria. Dias depois, Bolsonaro recuou e disse que o governo poderia, sim, adquirir o produto.
Enquanto o governo paulista fechou parceria com o laboratório chinês Sinovac, o governo federal fechou um acordo no valor de R$ 1,9 bilhão para a compra e transferência de tecnologia da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford, o laboratório AstraZeneca e a FundaçãoOswaldo Cruz (Fiocruz). Em setembro, o estudo clínico da vacina também foi suspenso após a morte de um voluntário. O estudo, no entanto, foi retomado dias depois.