Professores de Direito acreditam que os fatos apresentados pelo ex-ministro Sergio Moro no depoimento prestado à Polícia Federal podem ser usados para enquadrar o presidente Jair Bolsonaro, no máximo, no crime de prevaricação (ato praticado por servidor púbico para satisfazer interesse pessoal), considerado de baixa gravidade. Alguns dos juristas classificaram o relato como "decepcionante", diante da expectativa de que ele poderia apresentar algo bombástico sobre a conduta do presidente Jair Bolsonaro .
"Para quem esperava que viria algo bombástico contra o Bolsonaro, foi decepcionante. O Moro deixa bem claro de que aquilo que ele falou na coletiva é verdade, mas, ao ver dele, não atribui nenhum crime ao presidente da Repúbllica", avalia Gustavo Badaró, professor de Direito processual penal da USP.
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Para Badaró, no depoimento "está implícito é que teria talvez um ato de improbidade". No trecho em que Moro relata ter recebido uma mensagem de Bolsonaro afirmando expressamente que "queria" a Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro sob sua influência, sem explicar seus interesses específicos nesse cargo, o professor da USP vê uma possibilidade de crime.
"Isso eventualmente, dependendo de outros elementos, poderia caracterizar crime de prevaricação do presidente, que é uma infração de menor potencial ofensivo. Do ponto vista penal, é muito pouca coisa. Embora do ponto de vista político, seria algo grave".
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O seu colega David Teixeira de Azevedo, professor de Direito penal da USP, discorda da possibilidade de o presidente ser enquadrado por crime de prevaricação ou por improbidade adminsitrativa porque é atribuição do presidente nomear o chefe da Polícia Federal. Ele entende que para isso deveria haver, por exemplo, uma mensagem explícita do presidente dizendo que gostaria de proteger os filhos em alguma investigação.
"A impressão que eu tenho é que ele prometia uma bomba e o que veio foi um estalinho. Ele prometia a comprovação de fatos graves e criminosos. Eu li o depoimento do Moro de algum modo decepcionado porque esperava que houvesse elementos consistentes de uma conduta do presidente violadora da constituição, e não é".
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Davi Tangerino, professor de Direito penal da FGV-SP, concorda que o ex-ministro não trouxe os elementos para incriminar o presidente. "A declaração foi um pouco frustrante no sentido que ele traria elementos novos. Basicamente ele colocou no papel o que já tinha saído na imprensa".
De acordo com Tangerino, a ingerência de Bolsonaro na Polícia Federal, pelo relato de Moro, fica apenas no campo da ilação. Já a desembargadora Ilana David, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, afirma que o depoimento de Moro é apenas o primeiro passo de uma investigação que, por enquanto, ainda não é possível saber onde vai chegar. Segundo ela, Bolsonaro terá de ser ouvido no decorrer do processo para explicar alguns detalhes, como o fato de ter dito que queria apenas uma das superintendências da PF, entre 27 delas.
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"Uma hora o presidente terá de se interrogado e dizer porque queria a superintendência da Polícia Federal no Rio, e não qualquer outra. Ele tem de ter uma motivação. Apesar de ter o poder administrativo de nomear alguém para a Polícia Federal, isso nem de longe gera a obrigação de fornecer informações. A Polícia Federal é uma polícia de estado, não de um governo", explica Ilana.
A desembargadora afirma que, por enquanto, o que há são alusões ao fato de que no Rio de Janeiro há investigações que envolvem um dos filhos do presidente e, inclusive, deputados bolsonaristas envolvidos em atos contra a democracia.
Segundo Ilana, o presidente pode responder por obstrução de justiça, caso fique demonstrado que ele queria informações para beneficiar determinadas pessoas ou prejudicar alguma investigação em andamento.
"Este é o tipo de processo que sangra. Sabemos como começa, mas não sabemos onde vai dar", diz ela.
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O professor de criminalística Mauricio Dieter, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, por outro lado, afirma que o depoimento do ex-ministro da Justiça não constitui prova, já que ele próprio consta como investigado. Dieter afirma que apenas o andamento das investigações poderá confrontar versões de Moro e de integrantes do governo, entre eles o próprio presidente Jair Bolsonaro.
"Qualquer conclusão é precipitada. O depoimento de um investigado não constitui prova", explica. Dieter afirma que embora as atitudes possam ser vistas como reprováveis, não necessariamente podem ser vistas como crime.