Conflitos têm sido maiores entre Bolsonaro e João Doria
Marcos Corrêa/PR
Conflitos têm sido maiores entre Bolsonaro e João Doria

Um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro radicalizar o discurso do enfrentamento ao coronavírus e defender medidas menos restritivas que as recomendadas pelos organismos internacionais, governadores defenderam em carta conjunta a adoção de "bom senso, equilíbrio e união" para impedir o avanço da doença no país. Em reunião de mais de duas horas, eles mantiveram a divergência em relação à posição de Bolsonaro, mas minimizaram o alcance de seu ato.

O texto, divulgado na noite desta quarta-feira, evita o confronto com o presidente da República e o convida a agir em sintonia com os dirigentes estaduais. Mas reafirmaram a disposição de se reunirem novamente e promover ações consorciadas, tendo como referência o que preconizam “organizações médicas internacionais”, o que vai na contramão do que passou a defender Bolsonaro na noite de terça-feira, em pronunciamento à TV.

O encontro foi promovido pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que controlava o tempo de fala de cada governador e disse que o objetivo do encontro "não era transformá-lo em uma trincheira contra o governo federal". Ele classificou o pronunciamento do presidente como "equivocada e maldosa em relação aos brasileiros".

Os governadores pediram a suspensão por um ano da dívida dos estados com governo federal e bancos estatais, além da abertura de linhas de crédito no BNDES para aplicação em serviços de saúde.

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Pleitearam também que o BNDES alargue o prazo para pagamento de dívidas e pequenas, médias e grandes empresas; que o governo federal reduza a meta de superávit primário e viabilize recursos livres para os estados, além de aprovar o projeto de renda mínima para população vulneráveis.

Os governadores destacaram a necessidade de apoio do governo federal para compra de equipamentos de saúde, para mitigar os impactos econômicos e expandir a proteção social da população de baixa renda.

"A proteção social precisa ser potencializada. Quem tem condições de ajudar nessa potencialização é o governo federal", afirmou Paulo Câmara (PSB), governador de Pernambuco.

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O governador da Paraíba, João Azevedo (PSB), defendeu que o Ministério da Saúde assuma o protagonismo no suprimento de equipamentos e insumos para que todos os estados possam enfrentar essa situação.

"Na Paraíba, vamos seguir recomendações da OMS", disse o político, para quem “qualquer ruptura institucional neste momento seria um grande erro”.

"Nós temos que ter prudência, e muita tranquilidade para lidar com essa situação", completou, numa referência à divergência com o presidente da República.

O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC) defendeu a ampliação de repasses em regiões mais afetadas, como Sul e Sudeste, e disse que não seguirá a linha adotada pelo presidente.

"Nós nos pautamos pela avaliação dos técnicos e peritos e decidimos com base nessas informações. Qualquer decisão pautada no achismo implica responsabilização direta daquele que o faz. O pronunciamento em rádio e televisão não é ato jurídico. É manifestação política e não tem qualquer reflexo na determinação do que se deve e o que não deve fazer", disse o governador carioca.

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O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), alertou os colegas sobre uma possibilidade de o presidente, ao final da crise, colocar na conta dos chefes dos executivos estaduais os danos econômicos.

"É importante lembrar que o presidente simplesmente vive no conflito. A sua história e a sua trajetória política foram sempre de confrontos e conflitos."

O gaúcho acredita que, caso os planos dos governadores seja bem sucedido e a quantidade infectados não seja tão grande no Brasil em comparação com outros países, o presidente tentará adotar o discurso de que sua tese do baixo risco do coronavírus se confirmou.

"Se tudo der certo com os nossos esforços, vamos garantir a saúde e a vida de muitos brasileiros. Mas teremos um problema econômico, que parece sugerir, no final ele [Bolsonaro] vai dizer que não foi tudo aquilo que se projetava e vai dizer que tivemos problemas econômicos por conta das ações dos governadores."

O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), disse que "brigas neste momento não vão resolver" a situação.

"Temos que trabalhar juntos. Temos que em primeiro manifestar o compromisso com a democracia."

Aliado de Bolsonaro, Marcos Rocha (PSL), governador de Rondônia, também pediu recursos e defendeu, ao contrário do presidente, o fechamento das escolas. Ele pediu apenas um olhar mais atento para a economia, mas não fez aos colegas uma defesa explícita do presidente.

"Temos que pensar saúde e economia em conjunto."

O mineiro Romeu Zema (Novo) foi na mesma linha e defendeu a preservação de "empregos e empresas". "Seria muito bem vinda uma medida como a de outros países, em que a empresa arca com parte do recuso, o governo com outra parte, e o empregado abrisse mão de parte do ganho durante este período. De forma que o gasto que o governo teria agora seria muito menor do que ele teria depois, para reativar a economia", afirmou.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (MDB) também acompanhou o encontro. O único a não participar foi o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha Barros Júnior (MDB).

A reunião foi articulada no dia seguinte ao pronunciamento mais recente do presidente Jair Bolsonaro, que defendeu na TV mudanças na política de isolamento por causa do avanço do novo coronavírus pelo país.

O presidente defende o isolamento apenas de idosos e grupos de risco, o que especialistas e infectologistas consideram medida arriscada, por ampliar a presença do vírus na população e o risco de sobrecarga à rede pública de saúde.

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