No julgamento em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisa se é possível usar assinaturas eletrônicas no processo de criação de um partido político, o relator do caso, ministro Og Fernandes, entende que não cabe à Corte analisar o assunto. Por questões técnicas, ele votou para "não conhecer" a consulta, ou seja, para que o tema não seja discutido. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Luis Felipe Salomão, que prometeu devolver o caso para análise do plenário do TSE, composto de sete integrantes, na sessão da próxima terça-feira.
A consulta sobre a possibilidade de uso do certificado digital, sem assinaturas físicas, foi feita no fim do ano passado pelo deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Mas o julgamento atraiu o interesse do presidente Jair Bolsonaro e apoiadores, que querem criar o partido Aliança pelo Brasil a tempo de disputar a eleição municipal do ano que vem.
Posteriormente, porém, os defensores do novo partido recuaram da estratégia ao constatarem que o instrumento seria muito caro. A assinatura digital é um mecanismo expedido pela Receita Federal e por outros órgãos autorizados. Cada um dos eleitores com a intenção de apoiar a criação do partido de Bolsonaro precisaria comprar um dispositivo que não sai por menos de R$ 150. Os apoiadores de Bolsonaro passaram a citar outro meio de angariar apoios: a biometria. Mas isso também está longe de virar realidade, em razão de entraves tecnológicos.
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Reservadamente, ministros duvidam que a Corte autorize o uso da biometria.
"A consulta é cabível quando formulada em tese pelo consulente legítimo e versar exclusivamente sobre matéria eleitoral. No caso presente, o consulente Jerônimo Pizzolotto (Goergen) é parte legítima, pois ocupa mandato federal. Entretanto, o questionamento apresentado não pode, a meu juízo, ser conhecido, uma vez que trata de matéria que desborda dos limites da congnição em âmbito de consulta. A jurisprudência do TSE, interpretando dispositivo supracitado entende que a consulta é cabível para sanar dúvidas de matéria eleitoral strito sensu. Dessa maneira, questionamentos que voltam apenas à organização ou a administração da Justiça Eleitoral destoam da finalidade do instituto", disse Og Fernandes.
Por certificação digital, por biometria ou pelo método manual, os ministros do TSE avaliam que dificilmente haverá tempo hábil para o novo partido cumprir todas as exigências formais e participar das eleições municipais de 2020. Segundo a legislação eleitoral, a nova legenda tem até abril para conseguir 491 mil assinaturas de apoiamento, um número calculado a partir das eleições de 2018. Os apoiadores devem morar em pelo menos um terço dos estados brasileiro e somarem, no mínimo, 0,1% do eleitorado de cada um desses estados. Por fim, as assinaturas precisam ser checadas pelos cartórios eleitorais.
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Em abril deste ano, a área técnica do TSE emitiu parecer favorável às assinaturas eletrônicas. Segundo os técnicos, “a utilização de assinaturas eletrônicas certificadas digitalmente tem validade jurídica reconhecida”. O setor citou uma medida provisória de 2001 que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e uma lei de 2006, que valida atos eletrônicos realizados por meio de assinatura digital.
Em contrapartida, o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, manifestou-se de forma oposta. Para ele, a modalidade seria equivocada, excluiria a participação de uma camada da sociedade sem condições de arcar com os cursos da tecnologia.
“Ao ver do Ministério Público Eleitoral, portanto, o uso de assinaturas eletrônicas para peticionamento eletrônico de apoiamento a criação de partidos políticos é lícito, mas não é possível. Torná-lo uma possibilidade, porém, no ambiente de prioridades e escassez é um equívoco, pois não é nem uma via universal nem igualitária, nem uma via que simplifica e encurta os fluxos de trabalho como a biometria”, escreveu o procurador, que aproveitou para defender a biometria como meio de apoiamento à criação de legendas.