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Deputada Joice Hasselmann foi alvo de ataques de Eduardo Bolsonaro e de grupos pró-presidente.
Valter Campanato/ABr
Deputada Joice Hasselmann foi alvo de ataques de Eduardo Bolsonaro e de grupos pró-presidente.

Da noite para o dia, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), de 41 anos, se transformou de líder do governo no Congresso — e uma das parlamentares da maior confiança do presidente Jair Bolsonaro —, em inimiga número um de seus filhos. Destituída da liderança, a parlamentar passou a ser achincalhada nas redes sociais, especialmente pelo deputado Eduardo Bolsonaro, o filho 03 do presidente, que se utiliza de uma poderosa milícia digital para detonar desafetos, inclusive integrantes do próprio governo do pai. Essa rede, segundo ela, é composta por 21 perfis falsos no Instagram, 1.500 páginas fakes no Facebook, e centenas de contas no Twitter, abastecidas por assessores parlamentares, pagos com recursos públicos. Ela afirma que vai denunciar Eduardo na comissão de ética da Câmara e na CPMI da Fake News. Jornalista e autora de um livro sobre a biografia do ex-juiz Sergio Moro, Joice foi a mulher mais bem votada de toda a história da Câmara, com mais de um milhão de votos, que ajudaram Bolsonaro a ter uma votação espetacular em São Paulo. Agora, ela está a um passo de romper com o presidente: “Bolsonaro não tem inteligência emocional nenhuma. É abaixo de zero”.

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Quando deixou a liderança do governo no Congresso, a senhora disse que sabia muito bem o que Bolsonaro fez no verão passado. Quais foram os malfeitos?

Acho que o mais grave é a existência de uma rede grande na Internet, que, desde a época da campanha, produz material para atacar pessoas, com fake news e material para denegrir reputações. Mas quando começaram a fazer montagens com minha imagem, como a nota de três reais, uma porca com meu rosto, pessoas extremamente obesas com meu rosto, aquilo me motivou a investigar. Eu peguei uma dessas imagens e disse que sabia o que eles fizeram no verão passado. E quando eu fui ver, tudo estava no perfil do Eduardo. Ali, ele assumiu a autoria desses memes agressivos.

Eles faziam o mesmo na campanha?

Durante a campanha existia fake news para todo o lado, da parte do Bolsonaro, como por parte do PT. E pelo volume de posts, estava claro que havia robôs. Mas quando os ataques começaram, já durante o governo, contra integrantes do próprio ministério, como aconteceu no caso dos ministros Gustavo Bebianno e Santos Cruz, que foram demitidos, eu fiquei impressionada. No caso do Santos Cruz, tratava-se de um herói de guerra, 46 anos amigo do presidente, e ele foi massacrado. No caso do vice-presidente Hamilton Mourão chegaram a insinuar que ele desejava que o presidente morresse. Tudo isso me assustou muito. E eu comecei a pesquisar.

E de onde partiam os ataques?

Contra mim, os ataques começaram ainda na campanha, com a narrativa de que Joice não é Bolsonaro, Joice é Doria. E espalharam isso no Brasil inteiro. Em segundos, eles disseminam isso nas redes. E o que sabemos até agora? Eles têm 21 perfis no Instagram, tais como Snapnaro, Bolsonéas e Bolsofeios. Cada um desses perfis está ligado a um assessor parlamentar de um dos três filhos do presidente , do Eduardo, do Flávio e do Carlos. Eles já eram assessores na campanha e agora continua com eles, mas pagos com dinheiro público. O Carlos tem assessores dessa área de Internet lotados até em gabinetes de outros deputados.

Quem são esses deputados?

Não posso revelar porque vão ficar bravos comigo. Mas tem um deputado muito ligado ao presidente, do PSL do Rio de Janeiro, que tem dois desses assessores do Carlos lotados em seu gabinete em Brasília. Eles são contratados para abastecer essas redes. No caso do Eduardo, está lotado em seu gabinete o Dudu Guimarães. Ele é dono de um desses perfis, o Snapnaro. O Eduardo lançou no Twitter a campanha deixe de seguir a pepapig. E começaram a ligar minha imagem a uma porca. Quatro horas depois, o Snapnaro publicou um Twitter com uma porca com biquíni preto andando, e embaixo havia um texto: Joice Hasselmann indo para a liderança. É só juntar as coisas.

A senhora disse que esse grupo tem páginas fakes?

São 1.500 páginas fakes ou não, que usam o Facebook para atacar as pessoas. Eles organizam as montagens em grupos de whatsapp. Criam os grupos e lá dão as orientações sobre as pessoas que eles desejam destruir. E aí criam o material, que passa a ser publicado em toda a mídia social. Em cinco segundos eles conseguem publicar o mesmo material em centenas de perfis ao mesmo tempo. Esse esquema é pilotado pelos funcionários dos gabinetes dos filhos do presidente, pagos com recursos públicos.

E são apenas os assessores parlamentares envolvidos?

Não, o grupo é maior. Eles usam os funcionários e assessores do partido também. Utilizam ainda robôs. Nos ataques a mim, isso ficou comprovado. Eu não participei dessa parte na campanha, mas quem participou me disse que havia o uso indiscriminado de robôs, para mandar mensagens para 10 mil e até 100 mil pessoas de forma instântanea. A gente vê que há até 50 mil pessoas xingando ao mesmo tempo. Só pode ser robôs.

Na campanha, falou-se que o esquema de robôs e redes de whatasapp era pago por empresários. É verdade?

Sim, os empresários bancavam, mas não sei dizer quem são. Ouvi falar do Luciano Hang, da Havan .

E o gabinete da maldade que funciona no quarto andar do Palácio do Planalto, como ele opera?

Ali tem produção de material de rede, produção de dossiês contra as pessoas que eles querem denegrir e disparam nas redes. O próprio presidente já chegou a disparar do celular dele material contra deputados, contra pessoas que estavam sendo cotadas para o ministério e ele não queria. Quem opera esse gabinete no Palácio do Planalto, conhecido por ‘gabinete do ódio’, é o Tércio (Arnaud Tomaz) e os dois Mateus (José Matheus Salles Gomes e Mateus Matos). O Carlos Bolsonaro é quem controla o grupo. Eles são chefiados ainda pelo Filipe Martins, assessor internacional do governo.

A senhora pretende denunciá-los?

Sim, vou procurar o Ministério Público de São Paulo e também fazer um boletim de ocorrência na polícia. Vou fazer em São Paulo porque tem menos interferência. Não confio fazer em Brasília. Se o presidente passa a mão no telefone e faz lobby para o filho ser líder do PSL, imagina o que ele pode fazer com a polícia de Brasília! Vou denúnciá-lo à Comissão de Ética da Câmara também. Vou denunciar Eduardo até na CPMI da Fake News . Já me convidaram para ir à CPMI.

O presidente também está envolvido ou é uma ação só dos filhos?

Não sei se o presidente comandou, mas é claro que o presidente sabe. Não tem como ele não saber.

Esse grupo usa de artilharia até para detonar os amigos?

Eles usam o material para destruir os aliados também. E isso eu falei para o presidente. Nunca vi lógica em transformar tantos aliados em inimigos.

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A senhora disse que o presidente tinha inteligência de -20. O que isso significa?

O presidente não tem inteligência emocional nenhuma. É abaixo de zero. Não dá para entender a cabeça do presidente. E é com esse comportamento pouco inteligente e beligerante que ele está transformando aliados em inimigos ou fazendo com que nós não acreditemos mais. Eu, por exemplo, já tenho dúvidas de que seja possível estabelecer um clima de paz e de reformas.

A senhora afirmou que eles estabeleceram uma espécie de monarquia.

Já falei isso na Câmara, quando eu ainda era líder. A gente não vive no império. Vivemos numa República, em que cada macaco tem que ficar no seu galho. Os meninos têm plena certeza de que eles fazem parte da presidência da República. Eles não conseguem separar a cozinha de casa do Palácio do Planalto. O melhor que eles teriam a fazer era não estarem na política. Mas já que estão, deveriam cuidar de seus mandatos.

O Delegado Waldir denunciou que para a indicação do Eduardo para a liderança houve compra de votos de deputados, com o oferecimento de cargos. O que aconteceu de fato?

No dia em que foi feita a primeira lista para se indicar o Eduardo, o general Ramos foi para o gabinete do Major Vitor Hugo com o Eduardo. E vi os deputados chegando, sendo pressionados por eles. Mas em relação ao oferecimento de cargos e dinheiro do fundo partidário isso está na gravação que fizeram do próprio presidente. Ele falou nesse áudio divulgado que o líder é responsável pela distribuição de cargos e do fundo partidário, afirmando que era melhor os deputados ficarem do lado do governo. O presidente deixou isso bem claro.

Quantos cargos foram dados?

São 108 cargos no partido, mas no governo são milhares. E o que foi pior: mandaram tirar cargos de quem não votou no Eduardo. Há uma deputada para quem o general Ramos ligou, a Soraya Monato, à qual disse que iria tirar os cargos que ela tinha se ela não votasse no Eduardo. Ela disse: pode tirar, eu só tenho um.

Os deputados do PSL têm muitos cargos no governo?

Parte dos deputados do PSL ficaram por último. O presidente deu cargos primeiro para o MDB, para o DEM…

Por que privilégios ao MDB?

Por que você acha que estou tão decepcionada? O combate à corrupção é tudo mentira. Estão destruindo o Moro. O presidente nunca ligou para o Rodrigo Maia ajudar na votação do pacote anticrime. Mas ligar para deputados pedindo para votar no Eduardo ele ligou. Estou preocupada em ver a força do Renan Calheiros no governo. Ele manda no senador Eduardo Gomes (recém-empossado na liderança do governo no lugar de Joice) e no Fernando Bezerra (líder do governo no Senado). O presidente não é bobo. Tem 28 anos de Congresso. Ele sabe quem ele está colocando dentro do governo. Será que essa é a nova política? Quando estive na liderança, eu fiz a nova política. Ao chegar lá, o senador Jucá tinha 28 cargos fantasmas e exonerei todos.

O Delegado Waldir disse suspeitar que o presidente participou da operação policial contra o deputado Bivar. A senhora acredita nisso?

Foi tudo meio suspeito. Eles brigaram em um dia e no outro a polícia foi à casa do Bivar. Por que essa perseguição ao Bivar e ao mesmo tempo se mantém o Marcelo Álvaro no Ministério do Turismo? O laranjal é o mesmo.

O que está por trás da briga no PSL?

A briga toda é pelo dinheiro do fundo. O presidente e os filhos querem colocar recursos do fundo nos diretórios controlados por eles, como São Paulo e Rio. O PSL de São Paulo funcionava no escritório da advogada Karina Kufa, que tem uma relação próxima com o Eduardo e com o presidente. A Karina queria que Bivar mandasse dinheiro para os diretórios que Eduardo comanda. Ele quer usar os recursos para manter o esquema de ataques da milícia.

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A senhora está rompendo com o presidente?

Eu não vou romper com ele. A não ser que ele me obrigue. Só vou romper se perceber que o governo não tem jeito. No meio desse caos, o presidente tem que entender que ele não está lidando com o gabinetizinho dele lá no anexo 2/3 e que o Palácio é muito maior que isso. Ele não pode ser lobista de filho. Precisa retomar o cuidado com o Brasil. Se ele fizer o papel de presidente, eu vou ficar do lado dele.

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