Mais vale o coração partido do que a alma vendida. Foi o que disse a ex-deputada federal Heloísa Helena ao ser expulsa do PT, no início do primeiro governo Lula, por votar contra a reforma previdenciária proposta pelo governo. A declaração com boas doses de heroísmo é, no tempo de descarte de peças do tabuleiro político, um acalento aos ouvidos dos decapitados pelo governo Bolsonaro . Desde a exoneração do então secretário-geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno, por discordar do rei, houve uma fartura de demissões. Todas sob o mesmo princípio: não disse “amém” à da cartilha de Bolsonaro, está fora.
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Quem pensa que a última cabeça a rolar foi a do ex-deputado federal Alexandre Frota do jogo está enganado: Paulo Fona, secretário de Imprensa do presidente até a última semana, também foi colocado porta a fora. Durou menos de uma semana por assumir supostos “pendores esquerdistas”. Já o aguardado afastamento de Frota foi motivado pelas críticas ao governo federal.
O caminho para expulsão do PSL foi aberto a pedido do senador Major Olímpio, acompanhado da deputada Carla Zambelli, ambos do PSL de São Paulo. Pouco antes, o senador deu a senha. Segundo ele, era preciso “se adaptar ao estilo do chefe, não o contrário”.
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Em entrevista à ISTOÉ concedida dias antes da expulsão, Frota reconheceu que não estava afinado com as ideias do capitão reformado e vaticinou o próprio infortúnio. Seu destino pode ser o DEM ou o PSDB. Nos últimos dias, o flerte com os tucanos foi intensificado.
“Olavos amestrados”
O relacionamento entre Bolsonaro e Frota começou a dar sinais de desgaste em abril deste ano, quando o parlamentar chamou a ala do governo ligada ao guru Olavo de Carvaho de “olavos amestrados”. Não parou por aí. Em uma de suas declarações contra o comportamento brucutu de Bolsonaro, afirmou que os aliados só tiveram paz em dois momentos: quando o capitão tirou o dente e o twitter dele ficou fora do ar.
Durante a votação do primeiro turno da Reforma da Previdência, ele criticou o empenho lânguido do governo em vender o próprio peixe, disparando lições para que Bolsonaro começasse a trabalhar. Mas o estopim foram os petardos lançados contra a indicação de Eduardo Bolsonaro à embaixada dos EUA. “Diplomaticamente, ele não soma em nada. Fritar hambúrguer onde não tem, falar inglês, ser amigo do filho do Trump e surfista não da a ele crédito”, afirmou.
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Pelo caminho da proscrição, também já passaram o ex-ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República, Carlos Alberto Santos Cruz, por levar a comunicação do Planalto a caminhos desgostosos a Carlos Bolsonaro, e quatro integrantes da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, que confirmaram a execução de Fernando Santa Cruz por parte ditadura militar.
A exoneração mais rumorosa, no entanto, foi a do ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão. Ele ousou discordar, com evidências científicas, das afirmações infundadas de Bolsoanto sobre desmatamento na Amazônia. Dançou. Quem está com os dias contados é o atual presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O motivo? O órgão foi responsável por vasculhar as contas bancárias de Flávio Bolsonaro, o Zero Um.
A saída de Frota mostra que o sistema político-partidário é suficientemente poderoso para não se abalar com o comportamento dos chamados “rebeldes”, ainda mais se o partido é o que dá sustentação ao governo de Bolsonaro, avesso às críticas.
Ao lado da deputada do PDT, Tabata Amaral, Frota faz parte do grupo de parlamentares insistentes em suas teses e dispostos a manter erguida a bandeira da independência, à margem das determinações de cima. A outra categoria é daqueles que seguem a tradição partidária porque sabem de sua importância. “O parlamentar que se coloca contra isso tem uma debilidade, porque parlamento não é ideia própria, é ideia de grupo”, afirma o cientista político Humberto Dantas. Evidentemente que esse está longe de ser o paradigma de um governo acostumado a degolar quem lhe desagrada. O cadafalso aguarda a próxima voz dissonante.