O jornalista Glenn Greenwald criticou o presidente Jair Bolsonaro por ter insinuado, durante entrevista coletiva neste sábado (27), que o editor do site "The Intercept Brasil" poderia ser preso após a divulgação de mensagens do ministro da Justiça Sergio Moro e de procuradores da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba
Ao comentar a portaria de número 666 , que permite a deportação sumária de estrangeiros considerados "perigosos", Bolsonaro disse que a normativa nada tem a ver com o caso de Glenn Greenwald , mas destacou que ele "talvez pegue uma cana aqui no Brasil".
Pelo Twitter , o jornalista ressaltou que não há evidências de que tenha cometido qualquer crime e que Bolsonaro "não tem o poder" de mandar prender pessoas.
Na última terça-feira (22), a Polícia Federal (PF) prendeu quatro suspeitos de invadir contas do aplicativo de mensagens Telegram de autoridades. Um dos presos, Walter Delgatti Neto, disse ter repassado o material de forma anônima e gratuita ao "The Intercept", que defendeu a publicação do conteúdo por ver nele assuntos de interesse público.
"Ao contrário dos desejos de Bolsonaro, ele não é (ainda) um ditador. Ele não tem o poder de ordenar pessoas presas. Ainda existem tribunais em funcionamento. Para prender alguém, tem que apresentar provas para um tribunal que eles cometeram um crime. Essa evidência não existe", ressaltou Glenn em sua conta do Twitter neste sábado (27).
Nesta manhã, Bolsonaro afirmou a jornalistas que a portaria assinada por Moro não se aplica ao jornalista "até porque ele é casado com outro homem e tem meninos adotados no Brasil". Chamou-o ainda de "malandro" por ter se casado com "outro malandro", nas palavras dele, "para evitar um problema desse", em referência à deportação. O editor do "The Intercept" é marido do deputado federal David Miranda (PSOL-RJ), com quem tem dois filhos adotivos.
"Bolsonaro - sendo ele - também implicou que eu me casei com David Miranda e adotei dois filhos para evitar a lei de deportação. Ele evidentemente acha que eu tenho o poder de prever o futuro: David e eu nos casamos há 14 anos quando eu era advogado, antes de me tornar jornalista. A teoria dele é insana: casei com David 14 anos atrás porque eu previa que precisaria disso no futuro. E sugerir que alguém adotaria - e cuidar de - dois filhos para manipular a lei é nojento", escreveu o jornalista na rede social.
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Glenn ainda ressaltou que o Brasil tem 47 mil crianças em abrigos e que a adoção deveria ser "linda e encorajada, não zombada". Além disso, destacou que pode sair do Brasil de forma voluntária quando quiser, mas não o fará. "Não fiz e não vou, apesar dessas ameaças. Por quê? Porque sei que não têm nada contra mim. Vou defender a democracia do país dos meus filhos."
Premiado pela série de reportagens que expuseram um sistema de vigilância ilegal da Agência de Segurança Nacional (NSA), do governo norte-americano, a partir de documentos vazados pelo ex-técnico Edward Snowden, Glenn também escreveu no Twitter que foi defendido por veículos de imprensa de todas as ideologias quando os governos dos Estados Unidos e do Reino Unido o ameaçaram implicitamente.
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Associações de jornalistas criticam Bolsonaro
No Twitter, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) publicou: "Ao ameaçar de prisão um jornalista que publica informações que o desagradam, o presidente Bolsonaro promove e instiga graves agressões à liberdade de expressão. Sem jornalismo livre, as outras liberdades também morrerão. Chega de perseguição".
O presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Paulo Jerônimo de Sousa, também saiu em defesa do jornalista. "A ABI estará sempre na trincheira da defesa da liberdade de expressão. Nesse sentido, a ABI endossa a declaração do Greenwald de que o Bolsonaro ainda não é um ditador", afirmou Sousa.
O vice-presidente da ABI, Cid Benjamin, disse que as falas de Bolsonaro são uma tentativa de intimidação. "A ameaça de Bolsonaro a Glenn Greenwald nada mais é do que uma tentativa de intimidação ao jornalismo independente e à liberdade de expressão", disse Benjamin.