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É ELE O nome de Eduardo vem sendo articulado por Bolsonaro desde a visita a Donald Trump em março
Reprodução/Instagram/Bolsonarosp
É ELE O nome de Eduardo vem sendo articulado por Bolsonaro desde a visita a Donald Trump em março

Desde a carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei D. Manuel, por meio da qual ele teria pedido ao nobre um emprego para o genro, a indicação de parentes para a administração pública recheia a polêmica. Da epístola do escrivão derivou o termo pistolão, comumente usado dali em diante para designar favorecimento a familiares nos processos de nomeação a cargos públicos.

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Por isso, quando o presidente Jair Bolsonaro anunciou na quinta-feira 11 a intenção de indicar o filho e deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para comandar a embaixada do Brasil em Washington – o mais alto cargo da diplomacia brasileira –, irromperam manifestações contrárias à iniciativa. Dessa vez, no entanto, os repúdios não partiram apenas de integrantes da oposição, mas de expoentes do próprio bolsonarismo. Pudera. A moralização das indicações para postos estratégicos do governo foi uma das principais bandeiras de campanha do presidente. Como flertar, agora, com o nepotismo?, perguntou-se.

Mesmo que a 13ª súmula vinculante do STF abra brechas para nomeação de parentes a cargos políticos, o que se discute é o significado do gesto empreendido pelo mandatário do País. Ao longo da semana, os predicados necessários ao posto (ou a alegada ausência deles) do futuro “Mr. Eduardo” foram expostos ao escrutínio público. Se ele é fluente ou apenas arranha o inglês, se terá jogo de cintura político e conhecimento suficiente para circular pelos grandes salões da diplomacia norte-americana ou até mesmo se possui vivência o bastante para entender as nuances e particularidades daquele País – o que acabou degenerando para a comezinha discussão do “fritou ou não hambúrguer” quando de sua breve passagem pelos EUA. Tudo isso serviu de pano de fundo para embalar a questão principal: estaria Eduardo Bolsonaro capacitado para defender as cores do Brasil em solo americano?

Charles de Gaulle dizia que as nações não devem ter amigos, mas interesses. E são os nossos interesses comerciais e políticos que Eduardo Bolsonaro deve estar pronto para representar. Ao insistir na indicação do filho, o presidente alega mover-se de forma pragmática. Para Bolsonaro, o governo precisa ter em Washington uma pessoa que manifeste, primeiramente, fidelidade total ao presidente, e, em segundo lugar, boa interlocução com Donald Trump. “Ele é fantástico”, disse o presidente dos EUA sobre Eduardo durante visita àquele país em março. Assim, Bolsonaro está convencido de que não há um nome melhor do que o do próprio filho para representá-lo nos EUA.

O fato de Eduardo ser parlamentar e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados pode, na visão dos defensores da iniciativa, favorecer as relações com o Congresso Americano, onde sempre pululam contendas entre os dois países. De acordo com entusiastas da ideia, ainda pesaria a favor de Eduardo os ótimos contatos celebrados recentemente com o staff do governo americano, tornando melíflua a interlocução Brasil/Estados Unidos, que o presidente Bolsonaro elegeu como prioritária em suas relações internacionais. Para os empresários americanos, o filho do presidente no comando da embaixada será sinal inequívoco de que eles próprios terão mais acesso ao próprio Bolsonaro, o que facilitaria o ingresso de seus capitais em negócios no Brasil.

“Resolvido”

Por parte do governo brasileiro, esses seriam motivos mais do que suficientes para a indicação de Eduardo para o posto, que, no passado, já foi ocupado por brasileiros notáveis, como Joaquim Nabuco, Oswaldo Aranha, Marcílio Marques Moreira e Sergio Amaral, demitido do cargo no último dia 3 de junho. Na quarta-feira 17, em reunião do Mercosul em Santa Fé, na Argentina, Bolsonaro dissipou qualquer dúvida sobre a nomeação: “Se dependesse de mim, isso já estaria resolvido (Eduardo indicado para a embaixada americana). Há interesse dele. A gente fica preocupado, é uma tremenda responsabilidade. Acho que, se tiverem argumentos contrários, que não seja isso, chulo que se fala por aí. Não é nepotismo. Tem uma súmula do Supremo nesse sentido”.

Ao lado do presidente, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, confirmou: o governo brasileiro irá mesmo enviar a consulta de agrément ao governo Trump, dando início à indicação formal de Eduardo para o cargo. Com a aceitação dos EUA, que a esta altura parece irreversível, o presidente expressará o seu desejo no Diário Oficial da União.

O “03” de Jair Bolsonaro não chega a ser um neófito na área – embora possa não ter a estatura de seus antecessores. Apaixonado por surf, Eduardo Bolsonaro passou a mergulhar nos meandros da política externa nacional a partir do final do ano passado, durante a eleição do pai. Nesse período, contou com a assessoria técnica de nada menos do que Steve Bannon, estrategista eleitoral de Donald Trump, e de Filipe G. Martins, assessor internacional da Presidência da República. Os dois tocam de ouvido, segundo fontes palacianas.

Este ano, depois da posse de Jair Bolsonaro, Eduardo acompanhou o presidente na maioria das viagens internacionais, como na ida ao Fórum Econômico Mundial na Suíça em janeiro, na própria visita a Trump em março e na reunião do G-20 no Japão em junho. De acordo com auxiliares do presidente, a movimentação de Eduardo já foi parte integrante da estratégia de alçá-lo à vaga de embaixador nos Estados Unidos. Uma espécie de preparação de terreno para o que viria adiante. Outros dizem ter se tratado de um “teste” do presidente, ao qual o “03” teria sido aprovado com louvor.

A trincheira

Independentemente das circunstâncias que o levaram à iminente indicação, há ainda um importante obstáculo a ser removido: o aval do Senado. Pelo regimento, depois que a Comissão de Relações Exteriores receber o encaminhamento de Bolsonaro, haverá a avaliação do currículo do candidato e, na sequência, a sabatina, que deve ocorrer em agosto. Submetido Eduardo aos questionamentos de praxe, a Comissão realizará uma votação secreta para que os parlamentares decidam se apoiam ou não o seu nome. A última etapa é a apreciação em plenário, mas a principal arena é mesmo o colegiado. A margem hoje é muitíssimo apertada. De um total de 18 senadores, pelo menos nove estariam dispostos a derrubar a promoção do filho do presidente, cujos salário irá dobrar para R$ 68 mil.

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Por ora, até o vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores, senador Marcos do Val (Cidadania-ES), tem se manifestado contra, mesmo integrando a base do governo no Senado. “Peço que o presidente tenha a sua ação dentro daquilo que ele já vinha fazendo, ou seja, usando o critério técnico para escolhas, como aconteceu com seus ministros”, defende o senador. Não por acaso, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e seu pai já estariam trabalhando intensamente nos bastidores. Na quarta-feira 17, Bolsonaro conversou com o senador Fernando Bezerra Coelho, líder do governo no Senado. A ideia é que ele use seu prestígio político na Casa para vencer as resistências. Para cumprir a missão dada pelo presidente, Fernando Bezerra não deverá se restringir às funções de parlamentar. Terá de ser o embaixador do embaixador.

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