Um documento secreto liberado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos revela que o ex-presidente Ernesto Geisel aprovou a continuidade das “execuções sumárias” dos adversários do governo, referidos como “subversivos” e “terroristas”. Além de permitir os assassinatos, ele teria orientado a centralização das ações no Palácio do Planalto através do Serviço Nacional de Informações (SNI).
Segundo o documento assinado pelo então Diretor de Inteligência da CIA, William Egan Colbim, encaminhado ao Secretário de Estado Henry Kissinger, o então recém-empossado presidente Ernesto Geisel (1974-1979) decidiu “continuar as execuções sumárias de adversários” da ditadura militar no Brasil, e ainda teria orientado o então chefe do SNI, João Baptista Figueiredo, quem o substituiria no poder, em 1979, a autorizar pessoalmente os assassinatos, executados pelo Centro de Inteligência do Exército (CIE). Com isso, o militar assumiria as execuções, trazendo as ações para dentro da cúpula do Planalto.
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Também é possível encontrar, na mensagem assinada por Colbim, a afirmação de “cerca de 104 execuções no ano anterior”, quando Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) ainda estava no poder.
A decisão de Geisel
Liberado pelo governo dos Estados Unidos em 2015, o memorando só veio a público nesta quinta-feira (10), com a publicação do professor de Relações Internacional da Fundação Getúlio Vargas, Matias Spektor, no Twitter.
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“Este é o documento mais perturbador que já li em 20 anos de pesquisa. Geisel autoriza a continuação da política de assassinatos do regime, mas exige ao Centro de Informações do Exército a autorização prévia do próprio Palácio do Planalto”, escreveu.
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Segue a tradução do documento completo
Memorando do diretor da Agência Central de Inteligência Colby para o secretário de Estado Kissinger
Washington, 11 de abril de 1974.
Assunto: Decisão do presidente brasileiro Ernesto Geisel de continuar a execução sumária de subversivos perigosos sob certas condições
1. [1 parágrafo (7 linhas) não desclassificado]
2. Em 30 de março de 1974, reuniu-se presidente do Brasil, Ernesto Geisel, com o general Milton Tavares de Souza (chamado de general Milton) e o general Confúcio Danton de Paula Avelino, respectivamente o chefe que sai e o que entra do Centro de Informações do Exército (CIE). Também esteve presente o general João Baptista Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI).
3. O general Milton, que falou durante a maior parte do tempo, detalhou o trabalho da CIE contra os alvos subversivos internos durante a administração do ex-presidente Emilio Garrastazu Médici. Ele ressaltou que o Brasil não pode ignorar a ameaça subversiva e terrorista, e que os métodos extralegais devem continuar sendo usados contra subversivos perigosos. A este respeito, o general Milton disse que cerca de 104 pessoas nesta categoria foram sumariamente executadas pelo CIE durante o ano passado, ou pouco antes. Figueiredo apoiou essa política e insistiu em sua continuidade.
4. O presidente, que comentou sobre a seriedade e os aspectos potencialmente prejudiciais desta política, disse que queria refletir sobre o assunto durante o fim de semana antes de chegar a qualquer decisão sobre sua continuidade. Em 1º de abril, o presidente Geisel disse ao general Figueiredo que a política deveria continuar, mas que muito cuidado deveria ser tomado para assegurar que apenas subversivos perigosos fossem executados. O presidente e o general Figueiredo concordaram que quando o CIE prender uma pessoa que possa se enquadrar nessa categoria, o chefe do CIE consultará o general Figueiredo, cuja aprovação deve ser dada antes que a pessoa seja executada. O presidente e o general Figueiredo também concordaram que o CIE deve dedicar quase todo o seu esforço à subversão interna, e que o esforço geral do CIE será coordenado pelo General Figueiredo.
5. [1 parágrafo (12½ linhas) não desclassificado]
6. Uma cópia deste memorando será disponibilizada ao Secretário de Estado Adjunto para Assuntos Interamericanos. [1½ linha não desclassificada]. Nenhuma distribuição adicional está sendo feita.
Governo de Geisel
O general Ernesto Geisel ficou à frente do poder entre 1974 e 1979, e ainda é lembrado como sendo o ditador que "entrou para controlar os excessos da tigrada". Até hoje não havia documentos publicados que relacionavam os governos de Geisel e Figueiredo ao comando de execuções dos chamados "subversivos". Desse modo, o documento liberado pela CIA traz à tona bastidores sangrentos dos últimos anos da ditadura militar no Brasil.