Moïse Kabamgabe, congolês morto em quiosque na Barra da Tijuca
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Moïse Kabamgabe, congolês morto em quiosque na Barra da Tijuca

O Ministério Público do Trabalho do Rio (MPT-RJ) ingressou com uma ação na Justiça Trabalhista contra os quiosques Biruta e Tropicália, na orla da Barra da Tijuca, na Zona Oeste da capital. Trata-se dos estabelecimentos contíguos onde trabalhava e morreu, respectivamente, o congolês Moïse Kabamgabe, espancado na noite do dia 24 de janeiro. Para os procuradores, os dois locais submetiam o refugiado e outros prestadores de serviço a condições análogas a de escravidão.

De acordo com o MPT-RJ, a investigação do órgão apontou que os garçons de ambos os quiosques trabalhavam de 10 a 12 horas por dia sem fornecimento de água e alimentação, com restrição de acesso ao banheiro e sem equipamentos de proteção individuais básicos, como óculos de sol, protetor solar, boné e camiseta com proteção UV. Assim, os funcionários ficavam expostos a problemas de saúde como imunodepressão e câncer de pele.

Os procuradores também frisaram a falta de relação formal entre as partes. Nenhum dos funcionários possuía Carteira de Trabalho registrada, sendo paga somente uma diária de trabalho, conforme confirmaram os próprios donos dos quiosques. A remuneração era variável, podendo inclusive chegar a zero, conforme o movimento de praia e as vendas do dia.

A ação apresentada pelo MPT-RJ pede que seja reconhecido o vínculo empregatício de Moïse, na função de garçom, no período entre 1º de dezembro de 2018 e 22 de janeiro de 2022, dois dias antes da morte. Assim, uma indenização de R$ 254.643,80 teria de ser paga à família do congolês, referente às verbas trabalhistas do período, considerando o salário-mínimo previsto da categoria, além de férias, FGTS, 13º, horas extras, saldo salário e aviso prévio.

O órgão também solicita à Justiça do Trabalho que todos os réus paguem, até o encerramento do processo, um salário mínimo a Lotsove Lolo Lay Ivone, mãe de Moïse, a fim de garantir que os parentes do congolês possam ter renda mínima para as necessidades básicas, considerando que a morte do rapaz agravou a já extrema vulnerabilidade da família. Por fim, os promotores pleiteiam uma pensão de R$ 3,755 milhões para Lotsove, em valor único, equivalente a 2/3 do salário como garçom e tomando como parâmetro uma expectativa de vida de 76 anos.

Além dos dois quiosques, o MPT-RJ também busca a responsabilização da Orla Rio, concessionária responsável por administrar e fiscalizar os espaços do gênero na orla, e da Prefeitura do Rio. Para os promotores, as duas partes foram omissas ao monitorar a conduta dos estabelecimentos. O órgão cita que, durante fiscalização após a morte de Moïse, auditores-fiscais do Trabalho flagraram pelo menso 256 empregados atuando sem registro em quiosques situados do Leme ao Pontal, muitos deles imigrantes e refugiados, tal qual o congolês.

"Trata-se de caso clássico de trabalho em condições análogas às de escravo no meio urbano. Os quiosques-Réus, aproveitando-se das vulnerabilidades dos trabalhadores, principalmente dos imigrantes, e do desemprego que assola o país, os transporta da precariedade para a subumanidade ao submetê-los a condições degradantes de trabalho, a jornadas exaustivas, com ausência de intervalos intrajornadas, de descansos semanais, com baixa remuneração, sob calor excessivo, sem equipamentos de proteção e sem sanitário disponível e locais de repouso", enumera a procuradora Lys Sobral Cardoso, conforme o divulgado pelo MPT-RJ.

"Condições essas agravadas pelo fato de o Moïse ser um trabalhador negro e imigrante, cujas possibilidades de ser inserido no mercado de trabalho são mais difíceis. Não há, portanto, como negar a coação moral sofrida pela vítima para continuar nessa relação de trabalho de exploração subumana, a fim de garantir a sua subsistência e a de seus familiares no Brasil", complementa a procuradora Guadalupe Louro Couto, que assina a ação ao lado de Sobral Cardoso e dos procuradores Juliane Mombelli, João Batista Berthier e Italvar Medina.

Diante deste cenário, o órgão cobra ainda dano moral individual no valor de R$ 2 milhões e dano moral coletivo de R$ 11,5 milhões pelas condições laborais degradantes encontradas nos quiosques da orla do Rio. O primeiro montante deve ser destinado à família de Moïse, enquanto o último deve ser encaminhado à entidade social sem fins lucrativos, como forma de reparar os danos causados à coletividade. Assim, ao todo, somando todos os pedidos dos promotores, os parentes do congolês teriam quase R$ 6 milhões a receber.

Além dos valores a título de dano moral individual, coletivo e verbas trabalhistas devidas ao congolês Moïse Kabamgabe, a ação do MPT cobra o imediato cumprimento da legislação trabalhista pelos quiosques Tropicália e Biruta, com o devido registro na carteira de trabalho de todos os empregados, o respeito à jornada diária de no máximo 8 horas, a garantia de livre acesso aos sanitários e o fornecimento de EPIs, de alimentação e água, além do pagamento das demais verbas trabalhistas. A Prefeitura do Rio informou que ainda não foi notificada sobre a ação. Já a Orla Rio ainda não se manfiestou. O EXTRA não conseguiu contato com os responsáveis pelos dois quiosques.

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