
A devoção à Rosa Mística, associada a supostas aparições marianas ocorridas na pequena cidade de Montichiari, no norte da Itália, ganhou projeção internacional nas últimas décadas, especialmente após o Vaticano divulgar, em 2024, um parecer positivo sobre o valor espiritual das mensagens recebidas por Pierina Gilli, a vidente do caso.
A decisão reacendeu debates, ampliou a curiosidade dos fiéis e fortaleceu peregrinações a Fontanelle, local que se tornou o principal centro de devoção ligado ao fenômeno.
As aparições começaram em 1947, quando Pierina Gilli, então enfermeira, relatou ter visto a Virgem Maria durante um período de enfermidade. Segundo os relatos dela, Maria teria se apresentado sob o título de “Rosa Mística”, trazendo mensagens de oração, penitência e sacrifício voltadas especialmente para a conversão dos fiéis e a renovação espiritual da Igreja.

Os encontros teriam ocorrido inicialmente dentro do hospital onde Pierina trabalhava, estendendo-se depois para celebrações e encontros privados acompanhados por religiosos locais.
Já em 1966, o fenômeno teria se deslocado para Fontanelle, uma área rural próxima a Montichiari. Ali, segundo os registros devocionais, Pierina continuou a relatar novas aparições e pedidos marianos, incluindo momentos específicos de oração coletiva, atos de consagração ao Imaculado Coração de Maria e penitências voltadas à chamada “reparação espiritual” pelos pecados da humanidade.

O símbolo das três rosas
Uma das imagens mais difundidas da devoção da Rosa Mística mostra Maria com três rosas no peito, cada uma com significado simbólico específico:
- Rosa branca: pureza e espírito de oração;
- Rosa vermelha: sacrifício e amor unido ao sofrimento;
- Rosa dourada ou amarela: penitência, conversão e glória espiritual.
Esse simbolismo visual se tornou marca registrada da devoção e está presente em imagens, medalhas, terços e esculturas veneradas por fiéis em diversas partes do mundo.
As mensagens centralizam a espiritualidade em três pilares resumidos na fórmula frequentemente associada ao caso: “Oração, Sacrifício e Penitência”. Segundo os devotos, a Virgem teria pedido que esses elementos fossem retomados como prática cotidiana, com especial atenção à vida sacerdotal e religiosa, visando a purificação espiritual da Igreja.

A Hora da Graça
Outro ponto ligado à devoção é a chamada “Hora da Graça Universal”, celebrada tradicionalmente em 8 de dezembro, data da Solenidade da Imaculada Conceição. De acordo com a tradição dos seguidores da Rosa Mística, este horário específico de oração foi pedido nas aparições como momento privilegiado para intercessões e pedidos de graças especiais.
Embora fortemente difundida em grupos de oração e santuários ligados à devoção, a prática sempre foi observada com cautela pelas autoridades eclesiásticas, que ressaltam não se tratar de uma obrigação litúrgica oficial, mas de uma devoção privada.
Controvérsias e prudência da Igreja
Desde o início, as aparições da Rosa Mística provocaram divisão de opiniões dentro da Igreja Católica. Autoridades diocesanas demonstraram reserva em relação à autenticidade sobrenatural dos fenômenos, sobretudo nas décadas seguintes a 1947.
Avaliações pastorais iniciais apontavam para uma necessidade de cautela, tanto pelo número crescente de peregrinos quanto pela rápida disseminação de folhetos e práticas devocionais sem análise oficial aprofundada.
A própria história das aparições marianas mostra que raramente a Igreja emite reconhecimentos imediatos. Em geral, os processos de investigação envolvem décadas de observação, coleta de testemunhos, análise teológica das mensagens e estudo da vida do vidente.
Com a Rosa Mística, não foi diferente: o caso permaneceu por muitos anos em situação chamada de “não constatado”, ou seja, sem aprovação definitiva nem condenação formal.
O parecer do Vaticano em 2024
O cenário mudou em julho de 2024, quando a Congregação para a Doutrina da Fé, hoje chamada Dicastério para a Doutrina da Fé, divulgou carta oficial direcionada ao bispo de Brescia, diocese responsável por Montichiari e Fontanelle. No documento, o Vaticano reconheceu que os textos espirituais deixados por Pierina Gilli “contêm elementos positivos” e não apresentam conteúdo contrário à fé católica.
O parecer deixou claro que a decisão:
Não proclama certeza sobrenatural absoluta sobre as aparições, algo extremamente raro na história da Igreja.
Permite e reconhece a devoção como espiritualmente válida, desde que enquadrada nos ensinamentos oficiais do catolicismo.
Libera a promoção pastoral organizada do culto à Rosa Mística, incluindo celebrações públicas e peregrinações no local das aparições.
Na prática, isso significa que a devoção deixou de ser apenas tolerada e passou a ser formalmente acolhida no âmbito pastoral, com supervisão eclesiástica.
O Santuário de Fontanelle
Após o parecer da Santa Sé, o Santuário Rosa Mística, Mãe da Igreja, em Fontanelle, passou a receber um volume ainda maior de peregrinos provenientes de vários países, incluindo o Brasil. O local abriga capela, espaços para orações e áreas destinadas à meditação dos fiéis. Missas, terços e momentos especiais de devoção mariana são realizados rotineiramente, integrando a Rosa Mística ao calendário espiritual de muitos grupos católicos.
Comunidades religiosas e movimentos de oração difundiram a devoção por meio de transmissões online, materiais catequéticos e encontros presenciais, fortalecendo a presença da Rosa Mística fora da Itália.
Relatos de graças e curas
Assim como ocorre em outros santuários marianos, fiéis relatam graças recebidas, curas físicas e conversões espirituais atribuídas à intercessão da Rosa Mística. Estes testemunhos são registrados de forma espontânea por grupos e pelo próprio santuário, mas não passam por reconhecimento oficial de milagres, processo que exige rigorosa investigação médica, científica e teológica.
A Igreja, em sua postura prudente, enfatiza que relatos individuais não constituem comprovação definitiva de fenômenos sobrenaturais, mas podem ter valor espiritual e pastoral quando não entram em conflito com a fé e promovem vida cristã autêntica.
A devoção no Brasil
No Brasil, a Rosa Mística conquistou milhões de devotos desde a década de 1990. Grupos de oração, paróquias e comunidades marianas organizam encontros mensais, especialmente nos dias 8 de cada mês, data tradicionalmente dedicada à devoção.
Imagens da Rosa Mística tornaram-se comuns em igrejas e residências, e celebrações da “Hora da Graça” são amplamente difundidas pelas redes sociais.
Padres e leigos que divulgam a devoção ressaltam que o foco principal não está no fenômeno das aparições em si, mas no chamado espiritual aos valores centrais do cristianismo: oração constante, sacrifício pessoal e busca da conversão diária.
A posição final da Igreja
O Vaticano mantém posição equilibrada: as aparições não foram declaradas sobrenaturalmente comprovadas, mas a devoção está oficialmente aceita enquanto prática espiritual legítima. Isso coloca a Rosa Mística em categoria semelhante a outras devoções privadas amplamente difundidas e não obrigatórias dentro do catolicismo.
Para os fiéis, o reconhecimento pastoral representa um sinal de segurança espiritual para seguir a devoção. Para estudiosos e historiadores, o caso de Montichiari permanece como um exemplo de equilíbrio entre a prudência da Igreja e o acolhimento das expressões populares de fé.
Fé, tradição e atualidade
Mais de 75 anos após os primeiros relatos de Pierina Gilli, a devoção à Rosa Mística segue atual, alimentando romarias, grupos de oração e reflexões espirituais em diferentes países.
O parecer do Vaticano em 2024 consolidou sua presença oficial dentro da Igreja sem encerrar completamente os debates teológicos em torno das aparições.