O ex-presidente da Bolívia Evo Morales denunciou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que "agentes de elite do Estado boliviano atacaram" sua vida neste domingo (27).
"Denuncio de maneira urgente perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos [...] que agentes de elite do Estado boliviano atacaram hoje minha vida, enquanto o Governo reativa operações conjuntas entre forças policiais, militares e paramilitares para dirigir a repressão e atacar a vida de irmãs e irmãos nos pontos de bloqueio e protesto social", escreveu Morales em nova divulgada nas redes sociais.
"Solicito que o artigo 41 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos seja ativado devido ao risco ao direito à vida e que seja feita uma visita de trabalho urgente ao nosso país", continuou.
O atentado
Segundo Morales, "homens encapuzados" abriram fogo contra o seu veículo e feriram seu motorista em Cochabamba, na região central do país.
Morales acusa o governo de Luis Arce, com quem está em conflito, de estar por trás do ataque, enquanto o governo anunciou que investigará a possibilidade sido um "autoatentado".
"O carro em que cheguei tem 14 tiros. Me surpreenderam. Felizmente, hoje, salvamos nossas vidas (...). Os que atiraram estavam encapuzados (...). Isto foi planejado, era para matar Evo", disse Morales em uma entrevista à rádio Kawsachun Coca.
O vice-ministro de Segurança Cidadã, Roberto Ríos, disse que as autoridades investigarão a denúncia do ataque, embora também considerem a possibilidade de ter sido um "autoatentado".
"Como autoridades do Estado, somos obrigados a investigar qualquer denúncia, verdadeira ou mentirosa, sobre a existência de um autoatentado", disse Ríos à imprensa.
Segundo um comunicado do Movimento Ao Socialismo (MAS), partido fundado pelo ex-presidente, o ataque aconteceu na entrada de um quartel militar em Cochabamba, onde indivíduos com "armas longas, vestidos completamente com roupas pretas", atiraram contra os veículos que formavam a comitiva de Morales.
A denúncia do ataque ocorre um dia depois de Arce anunciar a mudança da cúpula militar do país, em meio a bloqueios de rodovias promovidos por simpatizantes de Morales em protesto contra uma investigação judicial.
Investigação contra Morales
O ex-presidente é investigado por suposto abuso de uma menor de idade com quem teve uma filha durante seu mandato. O Ministério Público anunciou há algumas semanas que emitiria um mandado de prisão contra ele, mas não se pronunciou desde então.
Os partidários de Morales, que exigem o "fim da perseguição judicial" contra seu líder, bloquearam várias rodovias do país desde 14 de outubro. Os cortes nas estradas provocam escassez de combustíveis e aumento dos preços de produtos básicos em várias cidades.
"Lucho (o presidente Luis Arce) destruiu a Bolívia e agora quer eliminar nosso processo acabando com a vida de Evo. Vamos ver como nos preparamos (...). Está em marcha um estado de sítio", disse Morales.
Em um vídeo divulgado pela rádio Kawsachun Coca, é possível observar três buracos, provavelmente provocados por tiros, no para-brisa da caminhonete em que Morales viajava. O motorista tem sangue na cabeça e uma mulher pede que ele "se apresse".
"Também temos imagens de que, depois do ocorrido, um helicóptero no aeroporto de Chimoré (em Cochabamba) transporta seis pessoas (...) Não temos certeza se eram militares ou policiais, mas a única coisa que realmente querem é assassinar Evo Morales", disse à AFP Anyelo Céspedes, deputado próximo do ex-presidente.
"Ontem, aconteceu uma mudança no alto comando militar e hoje tentam matar Evo Morales", acrescentou o deputado.
"Linha vermelha"
Arce e Morales, ex-aliados, estão em uma disputa pela candidatura presidencial governista nas eleições de agosto de 2025, embora apenas o ex-presidente tenha anunciado oficialmente que deseja disputar o pleito.
"Luis Arce, você cruzou a linha vermelha. Convocamos uma mobilização. Se possível, vamos tomar os aeroportos", disse Vicente Choque, líder da Central Sindical Única dos Trabalhadores Camponeses da Bolívia.
Na sexta-feira, mais de 1.700 policiais foram mobilizados para desativar os bloqueios. Nos confrontos, 14 policiais ficaram feridos e 44 pessoas foram detidas, segundo o governo.
O Ministério das Relações Exteriores denunciou no sábado em um comunicado que "está em curso "ações desestabilizadoras lideradas por Morales que pretendem interromper a ordem democrática", o que ameaça a estabilidade da Bolívia e da região.
"O Estado da Bolívia faz um apelo à comunidade internacional, aos Estados, aos organismos multilaterais e aos povos do mundo para que permaneçam atentos diante dos acontecimentos", afirmou o ministério.
Segundo a Administração Boliviana de Estradas, o país tem 16 pontos de bloqueio, a maioria no departamento de Cochabamba, reduto de Morales.
Os cortes acentuaram a escassez de combustíveis e provocaram a disparada dos preços dos produtos básicos.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Produtivo e Economia Plural, os bloqueios já provocaram perdas de quase 1,2 bilhão de dólares (6,85 bilhões de reais).